Lima Barreto
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Noticiam os jornais que a polícia prendeu dois vadios e, de acordo com as leis e o código; processou-os por vadiagem
Até ai a coisa não tem grande importância. Em toda a sociedade, há de haver por força vadios.
Uns, por doença nativa; outros, por vício.
Tem havido até vadios bem notáveis.
Dante foi um pouco vagabundo; Camões, idem; Bocage também; e muitos outros que figuram nos dicionários biográficos e têm estátua na praça pública.
Não vem, tudo isto ao caso; mas uma idéia puxa outra…
O que há de curioso no caso de polícia de que vos falei, é que os tais vadios logo se prontificaram a prestar fiança de quinhentos-réis, cada um, para se defenderem soltos. Como é isto? Vagabundos possuidores de tão importante quantia? Há muito homem morigerado e trabalhador, por aí, que nunca viu tal dinheiro.
Deve haver engano, por força.
De resto, se não o há, sou de parecer que a tal lei está mal feita.
O legislador nunca devia admiti que vadios, homens que nada fazem, portanto, não ganham, pudessem dispor de dinheiro, e dinheiro grosso, para se afiançarem.
Ou eles o têm e obtiveram-no por meios e, portanto, não são vadios; ou, tendo-o e não trabalhando, são coisas muito diferentes de simples vadios.
Quem cabras não tem e cabritos vende…
Não sou, pois, bacharel, jurista, nem rábula e fico aqui.
Marginália, s.d.
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