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FEROZ é um velho cão de guarda. A gente,
Que o vê de longe, teme-lhe os olhares,
E examina a grossura da corrente
Férrea, que o liga ao muro dos seus lares.
Ninguém lhe amima o dorso largo e forte;
Ninguém procura o seu olhar profundo;
Do seu caminho fogem, de tal sorte
Que ele se vê sozinho neste mundo.
O próprio dono evita-lhe os afagos,
Olha-o receoso, e se aproxima a custo.
Do velho cão nos grandes olhos vagos,
Paira a tristeza de um castigo injusto.
Não compreende o terror por ele aceso;
Quer mostrar-se bondoso, e a cauda agita,
Mas o rumor dos ferros, que o têm preso,
Mais pavor nos corações excita.
E ele, sentindo assomos de revolta,
Tenta quebrar os elos da cadeia…
Mas, pouco a pouco, a placidez lhe volta,
E o louco instinto, devagar, sopeia.
Inclina o corpo e estende-se por terra,
Preso ao terror, que a própria força inspira;
E, silencioso, úmidos olhos cerra,
Sem mais vislumbre de despeito ou ira.
Velando à porta do casebre, sonha…
O campo é todo verde; o céu fulgura,
E erra no espaço, trêfega e risonha,
A azado vento a derramar frescura.
Nova agonia o coração lhe aperta,
Nostálgico, aspirando o fim de tudo…
Nisto, um ligeiro frêmito o desperta,
E ele abre os olhos, cauteloso e mudo.
São passaritos. Ei-los! Não têm medo
Vêm partilhar com ele o magro almoço.
E, compassivo, espera imóvel, quedo,
Que eles se vão, para roer um osso.
E o velho cão de pavoroso aspecto,
Que nunca teve a graça de uns carinhos,
Sentindo o peito a transbordar de afeto,
Trêmulo escuta a voz dos passarinhos.
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