Um Drama em Três Atos
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No momento em que se decide pela adoção, questões complexas e delicadas surgem dentro e fora do seio familiar. Preparar-se adequadamente para enfrentá-las é fundamental para o bem-estar do novo relacionamento.
Seria um reducionismo acreditar que a adoção por si só seja a fonte exclusiva de todos os males. Muitos pais, por exemplo, temem pela evolução intelectual da criança adotada ou mesmo por seu desenvolvimento afetivo e psicossocial.
Alguns autores afirmam que o desenvolvimento intelectual depende da atitude dos pais adotivos, bem como das solicitações culturais e do clima familiar em que a criança cresce. Já o aspecto psicossocial e afetivo está ligado a vários fatores, entre os quais a atitude perfeccionista e ansiosa a respeito de seu futuro.
Ter um filho, seja natural ou adotivo, requer sempre uma preparação. Antes de mais nada, é importantíssimo criar entre o casal um ambiente interpessoal, no qual será inserida uma terceira pessoa, incompleta, portanto frágil, que exigirá muitos cuidados.
Se isso não acontecer, a rivalidade e o ciúme poderão surgir por parte de um dos pais, que sentirá a criança roubando seu espaço afetivo.
Faz parte ainda dessa preparação entender os desejos reais que motivam o casal a querer um filho:
– Ele vem para salvar o casamento?
– Para fazer companhia a um dos pais?
– Para substituir um filho morto?
– Para suprir a falta de afeto entre o casal?
– Ou para diminuir a tensão e, com isso, talvez, facilitar a ocorrência de uma gravidez?
Deve-se estar consciente ; dos riscos de se poder ter um filho saudável ou doente e da profunda responsabilidade que se terá pelo desenvolvimento de sua personalidade. É preciso ter em mente, sobretudo, que existe a vida de uma criança em jogo, a qual não poderá ser devolvida como algo com defeito de fabricação.
Família naturalmente constituída: equilíbrio que pode ser rompido diante dos problemas inevitáveis.
Os pais adotantes precisam também trabalhar suas feridas em relação à questão da infertilidade: o clima tenso em relação à culpa da impossibilidade de gerar um filho, a tortura das inúmeras tentativas e frustrações, a intensa corrida atrás de tratamentos, a sensação de humilhação, a cobrança da família e da sociedade por não poder ter filhos, etc.
E, se a adoção poderia viabilizar a paternidade do casal, ainda há que se lutar com a discordância familiar a respeito disso e mesmo contra os medos do estigma do filho adotado – visto muitas vezes, erroneamente, como uma criança revoltada, ingrata em relação a quem lhe deu um lar, incapaz de superar o trauma de seu abandono. Resta ainda o temor de que a origem genética da criança possa transformá-la em um marginal ou dependente químico.
A preparação deverá trazer ao casal tranqüilidade para lidar com os problemas que surgirem no âmbito familiar, os quais, com certeza, não faltam nem mesmo na família natural. É provável, por exemplo, que, ao entrar em um novo ambiente, a criança se mostre Insegura, pois, ao mesmo tempo em que está feliz por ter um lar, tem medo de perdê-lo, podendo mostrar-se agressiva até adquirir confiança.
Por outro lado, a criança mais velha pode ter maior dificuldade para formar vínculos, uma vez que perdeu laços afetivos anteriores, seu ambiente, seu modo de viver, isto é, suas referências. Por conta desses problemas e da concepção de que uma criança maior é mais difícil de ser reeducada, um número cada vez maior de casais prefere adotar bebês; isso, além de tudo, lhes garante o acompanhamento dos primeiros anos de vida da criança.
É importante que a família adotante seja paciente, carinhosa e tenha, principalmente, a compreensão de que aquela criança é alguém que viveu uma história de abandono e rejeição com os pais verdadeiros; ao mesmo tempo, terá de se conformar em conviver com pessoas diferentes dela.
Diferença na cor da pele: preconceito a ser superado.
A verdade sobre a adoção da criança, principalmente a que vai para a casa dos pais ainda bebê, nunca deve ser omitida ou negada. A história de sua origem deve ser clara. Muitos pais temem revelar a verdade para os filhos com medo de causar-lhes sofrimento.
Nesse caso, porém, a mentira realmente pode causar um duplo sofrimento: um necessário, que envolve sua verdadeira história – a qual ninguém tem direito de omitir –, o outro relativo à perda de confiança nos pais adotivos.
Deve-se ter em mente que os problemas nunca deixarão de ocorrer, seja numa família naturalmente constituída, seja numa família adotiva. O importante é que o novo lar possa ser um continente afetivo e adequado à criança para que ela possa trabalhar suas dores e perceber que é amada e desejada, senão não estaria nessa família.
Psicologicamente, adoção significa acolhimento, para que a criança possa erigir sua individualidade, pois se sabe que aquela que vive numa instituição desenvolve-se muito menos do que a que tem uma estrutura familiar adequada.
Ao mesmo tempo, significa dar aos adotantes a possibilidade do exercício da paternidade não apenas como um papel social a ser desenvolvido, mas como a necessidade humana de doação. As ligações humanas não são necessariamente condicionadas aos laços sanguíneos; na adoção, elas se desenvolverão, na verdade, através da afinidade dos corações de pais e filhos.
Recém-nascidos: adoção facilitada por não terem nenhum vínculo familiar anterior.
Juridicamente, adoção é o ato que cria o parentesco civil, gerando laços de paternidade e filiação independentemente de procriação. Ela garante ao filho adotivo, portanto, um status idêntico ao dos filhos consanguíneos.
Antigamente, a adoção era feita casualmente, isto é, ela acontecia a partir da morte de um parente, por exemplo; por conta disso, as crianças eram acolhidas por um vizinho ou um parente. Havia também famílias que criavam uma criança, dando-lhe tudo o que precisasse, mas ela assumia um papel específico dentro da casa, onde era encarregada dos afazeres domésticos.
Nas últimas décadas, porém, o problema do menor abandonado vem se tornando cada vez mais complicado e gritante, graças, sobretudo, ao baixo poder aquisitivo das classes mais populares e à rejeição, por suas próprias famílias, às mães solteiras, cuja idade varia entre 15 e 30 anos.
Na maioria dos casos, elas não têm uma profissão definida e a gravidez ocorreu ao acaso, como fruto de uma relação sem maiores compromissos. Em geral, seus filhos são entregues a um orfanato e a escolha das famílias para eles é feita pela própria instituição, através de entrevistas com os futuros pais, na qual se tenta encontrar semelhanças a fim de se adaptar fisicamente a criança. Observa-se ainda a maturidade do casal, regida por suas experiências de vida, cultura, saúde, etc.
Alguns critérios avaliam se ele teria condições para adotar uma criança de outra raça ou que tenha deficiência. Antigamente, no ato da adoção, levava-se em consideração apenas a condição material da família adotiva. Atualmente as coisas mudaram: tem-se como importante também a análise das qualidades afetivas e dos motivos de adoção dos futuros pais.
Graças ao crescente número de separações e de novos casamentos, o próprio conceito de família mudou. Hoje temos a família nuclear intacta – quando pais e filhos vivem juntos; a família binuclear – o pai e a mãe estão separados, mas seus filhos transitam nas duas casas; famílias de recasamento – novas com filhos de um e/ou de outro, com ou sem filhos em comum; famílias monoparentais – pai/mãe solteiros ou viúvos.
Filhos adotivos e biológicos podem ir e vir no decorrer de suas vidas entre esses diferentes tipos de organizações; ao reconhecer essa realidade, o atual Estatuto da Criança e do Adolescente vigente no Brasil ampliou a possibilidade de adoção. Hoje, a lei brasileira não faz distinção de estado civil, nacionalidade ou sexo do adotante, desde que a pessoa seja maior de 21 anos e possa preencher os requisitos exigidos pela lei.
A afetividade do novo lar ajuda a criança a superar suas dores.
É preciso ficar claro que registrar uma criança abandonada como filho legítimo, sem submetê-la a um processo legal, constitui crime de falsidade ideológica, previsto no Código Penal. Mesmo que a criança seja encontrada numa cestinha na porta da frente, ela deve ser submetida aos requisitos legais, o que proporcionará segurança futura a quem deseja adotar.
Haverá certeza, por exemplo, de que os pais biológicos não reclamarão futuramente o filho doado. Se as nossas leis fossem mais ágeis, porém, se evitaria que a adoção fosse feita de maneira ilegal, como ocorre com freqüência no Sul do Brasil.
Menor abandonado: problema social que pode ser resolvido com a adoção.
A adoção é gratuita e as despesas com documentos quase inexistentes. As crianças são colocadas à disposição para serem adotadas por instituições especializadas junto ao Juizado de Menores, com equipes qualificadas que atendem cuidadosamente aos direitos da criança, fazendo diagnósticos, selecionando famílias, apoiando e orientando dentro das necessidades existentes.
O processo, porém, acaba sendo muito moroso, uma vez que, na tentativa de atender a criança da melhor maneira possível, os profissionais tornam-se excessivamente exigentes. Muitas vezes, chegam até mesmo a vetar famílias por considerar seus motivos impróprios para a adoção.
Talvez eles devessem levar em consideração que é preferível ter uma criança em casa do que numa instituição e, em vez de simplesmente recusar os pais adotivos, pudessem prepará-los e orientá-los na superação de suas dificuldades. Segundo Maria Tereza Maldonado, em seu livro Caminhos do Coração, “(…) as equipes de profissionais poderiam (…) conhecer melhor as pessoas em questão, esclarecer sobre as dificuldades mais comumentemente encontradas, organizar reuniões de pessoas que desejem adotar para que se converse sobre sentimentos, apreensões e expectativas comuns a todos que estão em processo de gestar uma maternidade e uma paternidade na adoção”.
Com a enorme escalada da violência no Brasil, é de profunda importância que a comunidade repense o problema do menor abandonado. Não podemos simplesmente cruzar os braços e esperar que o governo resolva a situação. É importante que sociedade e governo reflitam e busquem, juntos, soluções para o problema.
De fato, torna-se mister, entre outras coisas, reorientar e conscientizar a população mais carente – camada em que se observa a maior incidência de nascimentos e abandonos – sobre a necessidade de se controlar os índices de natalidade. Todas essas, não há dúvida, são medidas necessárias e urgentes para resgatarmos a paz social.
Mas por que não pensar na adoção de crianças carentes como um passo importante na transformação do mundo à nossa volta? Afinal, quando resolvem desempenhar o papel de protagonistas da história, pais amorosos, com certeza, podem dar um final feliz a qualquer drama.
Chance para a alegria
O preconceito e a burocracia da adoção ainda existem, mas iniciativas do governo e da sociedade abrem caminho para facilitar o processo no Brasil
Com seus passos miúdos, Marina (nome fictício) brinca, absorta, em cima de um banco de madeira. De repente, chora exigindo atenção da monitora do abrigo público onde mora. A moça se empenha no atendimento da menina e de outras cinco crianças.
Abandonada pelos pais, a garotinha está à espera de uma família, mas corre o risco de passar a infância sem esse prazer. A pequena e saudável Marina, 2 anos, já é “velha” para a adoção. Se fosse negra, doente ou menino, seria pior. Neste país, quando se pensa em adoção, imagina-se um bebê branco, do sexo feminino, recém-nascido e sem problemas físicos ou mentais.
Restrições como essas revelam apenas parte da galeria de mitos, preconceitos e medos que recheiam o tema no Brasil, incluído aí a morosidade da Justiça. A pesquisadora e psicóloga Lídia Weber, da Universidade Federal do Paraná, estuda o tema há dez anos e define assim o sentimento nacional em relação à adoção: “É como se fosse uma filiação de segunda categoria.”
Uma pesquisa coordenada por Lídia em Curitiba, divulgada no livro Aspectos psicológicos da adoção, indica que os preconceitos a serem combatidos não são poucos. Em primeiro lugar, a adoção ainda é vista como forma de resolver um problema pessoal dos adultos, e não o da criança. Das 410 pessoas entrevistadas, 82% acham que a adoção deve servir aos casais sem filhos.
A hereditariedade e a história pregressa da criança são fatores desestimulantes: 53% têm medo de doenças hereditárias e 25% acreditam que a marginalidade, a prostituição ou qualquer atitude inadequada podem ser transmitidas geneticamente. “A taxa dos que pensam que a marginalidade passa pelo sangue é pequena, mas surpreende, pois estamos falando de comportamento. Isso mostra a necessidade de esclarecer o público”, analisa Lídia.
A preferência por meninas também atenderia a esse temor do desconhecido. Para o psicoterapeuta Luís Schettini Filho, autor de vários livros sobre o assunto, há o pressuposto de que garota dá menos trabalho e é mais dócil. “Essa idéia persiste mesmo com a mudança de costumes”, diz Schettini, pai adotivo de um casal, hoje adulto.
Outro dado apontado pela pesquisa é a imagem negativa do Sistema Judiciário. Para 70% dos entrevistados, é melhor recorrer direto à mãe biológica, já que o juizado demora muito para tomar decisões.
Tão comum é essa ideia que a rapidez de certos processos chega a assustar. O engenheiro agrônomo Tadeu Viana de Pontes, 40 anos, e a nutricionista Tereza, 44, do Recife, entraram na lista de espera para a adoção e foram logo chamados para ver Leonardo, hoje com 4 anos. Eles não tinham nenhuma peça de enxoval. “Foi uma correria. Pedimos um dia para poder comprar o básico”, conta Tereza.
É um caso à parte. A morosidade da Justiça explica parcialmente por que 55% das adoções ainda são feitas ilegalmente. É a perpetuação da “adoção à brasileira”, termo utilizado até lá fora para casos em que os pais adotivos passam por cima da lei registrando como filho biológico uma criança recém-nascida.
Acabar com essa prática é um dos objetivos do sistema Infoadote. Hoje, é comum crianças permanecerem muito tempo dentro dos abrigos sem uma situação definida. São as “crianças institucionalizadas”. Órfãos de pais vivos, os pequenos foram parar nesses lugares por negligência, falta de condições para sustentá-los ou maus-tratos.
Mas há também outras razões. “Muitas mulheres sozinhas são denunciadas porque saem para trabalhar e deixam seus filhos trancados em casa. Sem creches, elas não têm alternativa”, lembra Lídia.
Falta ajuda – Se houvesse maior assistência do governo a essas famílias, talvez o quadro fosse outro. Foi justamente para preencher essa lacuna que surgiram os grupos de apoio, na maioria formados por pais adotivos ou por adotados.
Essas associações fazem campanhas de esclarecimentos, firmam convênios para dar atendimento psicológico e jurídico a pais e filhos. “No ano passado, promovemos 122 reintegrações de crianças às suas famílias e 20 adoções. Este ano nos uniremos à Fundação para a Infância e Adolescência para atender crianças de rua”, relata Cláudia Cabral, 43 anos, diretora-presidente da Associação Terra dos Homens, do Rio.
No Recife, toda a diretoria do Grupo de Estudo e Apoio à Adoção (Gead) é formada por pais orgulhosos de seus “rebentos” adotivos. O grupo é coordenado pela psicóloga Eneri de Albuquerque, 44 anos, casada com o advogado Paulo José. Há seis anos, adotaram a falante Maria Luíza. A menina foi quem abriu caminho para Luana, de 1 ano e 6 meses. “Ela chegava nos encontros do Gead e pedia uma irmã a todo mundo”, conta Eneri.
O marido pensa em adotar mais uma criança e o entusiasmo parece contagiante. “Depois da nossa experiência, um primo meu também decidiu adotar”, diverte-se Eneri. O efeito cascata atingiu ainda a engenheira Maria de Pompéia Pessoa, 45 anos, que adotou dois irmãos gêmeos, Hermes e Vitor, 11 anos. Ao todo, são 14 crianças adotivas na família.
Prioridade à criança – Não se pode negar que a grande alavanca dessa mudança foi o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), promulgado em 1990, que estabeleceu como prioridade os interesses de crianças e adolescentes. Atenuou-se, com isso, o conceito clássico da adoção, centrado no adulto. Agora há mais simplicidade e os processos se tornaram gratuitos – antes os pais pagavam os custos. O ECA também mudou o perfil dos candidatos.
Hoje podem ser pais adotivos homem ou mulher em qualquer estado civil, maior de 21 anos, desde que pelo menos 16 anos mais velho do que a criança. O juiz observa se os pais têm situação financeira viável, se são saudáveis, não idosos nem dependentes de álcool e drogas. “Isso tem facilitado a adoção de crianças maiores e de raças diferentes”, afirma o juiz Siro Darlan, da lª Vara da Infância e da Juventude do Rio.
Sem restrições – Foi essa abertura que possibilitou à comissária de bordo Izamar Chamorro, 38 anos, realizar um sonho que trazia desde menina. “Queria ter filhos da barriga e adotados”, lembra. Izamar foi intercalando filhos biológicos com adotivos, sem restrições de raça ou sexo. Ela teve Nataly, 11 anos, adotou Sara, 9. Depois teve mais dois filhos biológicos: Bruna, 6 anos, e Marco, 4.
Já separada, adotou mais três: as irmãs Amanda, 8 anos, e Fabiana, 6, e Lucas, 6, que chegou há três meses. Outro caso semelhante é o da jornalista inglesa Diana Kinch, que vive no Rio. Solteira, ela mora num casarão com cinco crianças brasileiras – uma delas, Beatrice, 2 anos, tem uma doença congênita no coração. Os primeiros a chegar, Raul, 10, e Daniel, 9, foram os maiores incentivadores do aumento da família. No final do ano passado veio Beatrice e, há dois meses, os irmãos Joe, 4, e Simon, 2. “Beatrice está para ser operada e estamos confiantes ”, diz a jornalista.
Muita gente, entretanto, não tem a coragem de Izamar e Diana. Além do medo da carga genética, há centenas de dúvidas sobre a criação de um filho adotivo. Como abordar a situação, enfrentar o preconceito na escola e até na própria família? Especialistas afirmam que falar abertamente sobre o assunto é o caminho.
A medida evita o que aconteceu com a secretária Márcia Bertato Vieira, de Itapetininga, interior de São Paulo. Ela descobriu aos 16 anos que tinha sido adotada. “Minha história era uma farsa. Mas a segurança da minha mãe adotiva me acalmou”, conta.
Hoje, Márcia integra o Grupo de Apoio à Adoção de Itapetininga (Gaadi) e usa sua experiência para alertar sobre os riscos de se construir uma vida sobre uma mentira. Cláudia Leitão, 35 anos, e Paulo Roberto da Silva, 46, encontraram uma boa forma para não esconder do filho adotivo a verdade. “À noite, contamos histórias.
Entre elas, está a de Renato, o menino que faltava em nossa família”, explica Cláudia, também mãe de Carol. No caso dessa família outro aspecto interessante é que a iniciativa de adotar partiu de Paulo. A desenvoltura dele indica que alguns homens estão mais à vontade com a paternidade.
O professor universitário Newton Gabriel, 40 anos, é outro exemplo. Divorciado há 14 anos, ele está às voltas com mamadeiras, depois de oito anos de hesitação. “Foi uma longa gestação”, brinca o orgulhoso pai de Isaac, de um ano. “Não sentia falta do casamento, e sim de ser pai”, diz.
A dedicação da família produz efeitos dos mais inesperados. Adriano, 3 anos, paralisado por uma microcefalia, não movimentava nem os olhos. Mas tirou a sorte grande quando a advogada Michelle, 22 anos, visitou o abrigo onde ele estava.
Ao vê-lo, sensibilizou-se. Convenceu a família a conhecer a criança. O pai de Michelle, o médico anestesista Ajalmar Amorim, 53 anos, avisou à sua mulher, Diana: “Se você quer a criança, estou com você. Mas não espere nada dela.” Diana, 49 anos, aceitou o desafio. “Matheus já ri e balbucia algumas palavras”, conta.
Aceitar não só a criança, mas também a sua história é um ponto crucial para o sucesso da adoção. O fato de a criança ser portadora de uma herança genética e psicológica desconhecida é apavorante para alguns. O peso das lembranças vai depender das relações estabelecidas com os novos pais.
Grande parte dessas crianças requer atendimento psicológico para fortalecer a auto-estima e lidar com seus conflitos. Ainda mais na adolescência, quando todos, adotivos ou não, mergulham na reorganização da personalidade. É aí que cresce o desejo de saber sobre os pais biológicos e até de encontrá-los. “Os filhos devem sentir que podem contar com os pais em qualquer situação.
Ao sentir segurança, aquietam-se”, explica Schettini Filho. Não se pode esquecer que nenhuma criança vem com garantias de bom comportamento. A psicanalista Maria Luiza Ghirardi, de São Paulo, ressalta que mesmo com os filhos biológicos os pais têm uma história a construir. “Esse é o grande desafio.”
Ordem na casa
No final deste mês, 27 corregedores gerais de Justiça formarão o Conselho de Autoridades Centrais sob o comando do secretário-geral de Direitos Humanos, Gilberto Sabóia. Esse conselho terá a função de reformular a política de adoção no País e coordenar o Infoadote, um banco de dados que reunirá informações de todos os Estados.
O cadastro nacional trará a lista de crianças passíveis de adoção divididas por cidade, com fichas pessoais detalhadas. Os dados, cruzados com os dos pais interessados, trarão maior rapidez e transparência aos processos. “O Infoadote será um instrumento contra o comércio de crianças, as adoções irregulares e a morosidade da Justiça”, afirma o idealizador do sistema, o juiz Luís Carlos Figueiredo, da 2ª Vara da Infância e da Juventude do Recife.
O Infoadote integra um projeto mais amplo do Ministério da Justiça, o Sistema de Informação para a Infância e a Adolescência (Sipia), para o qual já foi destinado R$ 1,5 milhão. O Sipia se divide em quatro frentes, com um registro de violações de direitos de crianças e adolescentes; um cadastro de crianças infratoras; outro de adoção; e a criação de Conselhos Tutelares e Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente em pelo menos 50% dos municípios. “Esse conjunto de controles provará que muitas das crianças que crescem nos abrigos fogem, praticam delitos e vão parar nos presídios, se não morrerem antes pelo meio do caminho. Ou seja, nascem, crescem, vivem e morrem subcidadãos”, observa Figueiredo.
O Infoadote já foi apresentado a 17 Estados, mas, segundo o juiz, ainda não funciona plenamente pelas necessidades de ajuste ou implantação de sistemas informatizados. Nem mesmo em Pernambuco os municípios estão equipados para fazer os cadastros e enviar as informações para o Recife. Os Estados mais preparados são Santa Catarina – onde o Judiciário já funciona em rede – e Mato Grosso.
Os órfãos de pátria
té os 8 anos, uma favela era o único cenário que João enxergava do orfanato paulista onde vivia. Era seu futuro provável. A salvação veio com o casal Jim e Nancy, de Ohio (EUA). Em 1987, eles adotaram o garoto, que virou John Herbert.
Tornou-se um dos melhores jogadores de sua escola. Em 1997, ele cometeu o grande erro de sua vida: vendeu 7,1 gramas de maconha para um informante da polícia. Seu mundo caiu. John virou João brasileiro e as autoridades americanas querem devolvê-lo com base na determinação legal de expulsão de estrangeiros infratores.
Para completar, os Estados Unidos são um dos poucos países que não ratificaram a Convenção Internacional de Adoção de Haia, de 1993, que exige cidadania automática para adotados.
A história de John é igual a de outros órfãos estrangeiros adotados por americanos. Entre eles, alguns brasileiros, como Djavan da Silva, 22 anos, que vive numa prisão em Boston, apesar de já ter cumprido pena de quatro anos por furto e tráfico de droga.
A embaixada brasileira se recusa a dar os papéis necessários para que ele volte ao País. Alega que a sua condição de adotado por pais americanos é irrevogável. Por isso, John e Djavan ainda não foram deportados. Outros dois brasileiros tiveram sorte diferente. Reinaldo Silva foi enviado de Michigan para o Recife sem falar português nem ter família na terra.
O menor J.C.O., vive traumatizado num orfanato no interior paulista. Os dois foram “devolvidos” por apresentarem problemas psicológicos. Mas um projeto de lei americano prevê a cidadania automática para adotados. Se aprovado, terá caráter retroativo. “Gente criada aqui de repente vira estrangeira”, diz Nancy Morawetz, diretora da Clínica de Direitos de Imigrantes da Universidade de Nova York.
Questões referentes ao abandono e a adoção de crianças e adolescentes deveriam fazer parte, indissociavelmente, das reflexões e proposições acerca da política social brasileira. É fato que desde que o Brasil foi descoberto, e ainda durante o período de colonização portuguesa, ações referentes à prática do abandono e da adoção começaram a dar sinais de vida.
Contudo, as ações do Estado em relação a tais práticas, sobretudo em relação à adoção e/ou colocação de crianças e adolescentes em famílias substitutas, sempre atenderam aos interesses daqueles que não poderiam gerar biologicamente seus próprios filhos em detrimento dos interesses das crianças e adolescentes disponibilizadas para adoção.
A roda dos expostos, instrumento utilizado para facilitar a entrega das crianças por suas mães, e ao mesmo tempo para ocultar tal gesto através da não identificação da progenitora, oficializou e institucionalizou o abandono no Brasil.
A fundação de instituições-abrigo de níveis federal e estadual, como por exemplo a FUNABEM e a FEBEM, tornaram ainda mais degradante a situação das crianças e adolescentes abandonados que, uma vez institucionalizados, passaram por processos de subjetivação extremamente comprometedores.
As primeiras legislações acerca da adoção pregavam a diferença entre os filhos adotivos e os filhos biológicos quando garantiam a estes o direito de herdar os bens conquistados pelos pais, e quando, por outro lado, desobrigavam essa mesma família a tornar herdeiros também os filhos adotivos.
Desta forma, ao longo dos 500 anos de consolidação da nação brasileira, foi sendo também construída uma cultura de adoção que, carregada de mitos, falsas impressões, medos e distorções do real sentido e significado desta prática, contribui para a recusa de muitas famílias potencialmente capazes de concretizá-la.
Repensar a questão do abandono e da adoção de crianças e adolescentes hoje, significa dar passos no sentido de re-significar valores, desmistificar crenças limitantes e reconsiderar, acima de tudo, o interesse da criança e do adolescente que, conforme prescreve o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente (Cap. III, Art. 19), “[…] tem o direito de ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta […].”
Postulamos que uma mudança na atual cultura de adoção tornará possível a realização de inúmeros ideais, presentes tanto no imaginário das crianças e adolescentes como no dos adultos candidatos à adoção: a oportunidade de conciliação dos interesses de ambas as partes; o direito incontestável de revelar a verdade quanto à origem da criança e quanto ao tipo de vínculo que mantém constituída a família (ou seja, se trata-se de uma adoção ou não, etc.), visto que antes tal fato deveria ser ocultado; a possibilidade de poder exercer a paternidade ou a maternidade por parte dos adultos e de poder exercer a filiação por parte da criança ou adolescente.
Introdução
A temática da adoção faz-se presente na história da humanidade desde os mais primórdios tempos. Uma investigação acerca da história das civilizações e, de modo específico, acerca da história da instituição familiar, ou mesmo analisando o legado da mitologia e da tragédia greco-romana e as tradições religiosas de diferentes culturas, é possível perceber que o gesto de adotar e/ou de colocar crianças e adolescentes em famílias, que não a sua de origem biológica, define um traço típico nos paradigmas de paternidade, maternidade e filiação, pois representa a possibilidade da construção do vínculo afetivo que, enquanto tal, assemelha-se à qualidade do vínculo biológico e suas ressonâncias (apego, afeto, sentido de pertença à família, etc.).
Em trabalho com o Grupo de Apoio aos Pais Adotivos, foi possível detectar uma série de mitos, medos e expectativas, atuando de modo negativo no processo de preparação dos casais e famílias, tanto para a adoção como para o momento da revelação da verdade ao filho já adotado.
Neste sentido, muito pouco do que ouviram dizer, do que souberam ter acontecido com outros casais e famílias, ou do que tinham lido acerca da adoção, os encaminhava para uma perspectiva de adoção positiva e propensa ao êxito.
Com os mitos instalados e os medos atuando, sobretudo no que diz respeito à verdade sobre a origem da criança, seu passado e seu futuro após a revelação, muitos casais e famílias com potencial para adoção deixam de concretizá-la.
Postulamos que tal fato se deva à ação do paradigma biologista que privilegia o chamado “laço de sangue” como componente indispensável à constituição familiar em detrimento da prática da adoção: uma outra via de acesso à família.
Associada a tal paradigma encontra-se também, e em pleno funcionamento, uma “cultura da adoção” que, dentre os muitos obstáculos que impõe à difusão da prática da adoção, favorece a integração de crianças recém-nascidas ao seio de famílias e desabona o acolhimento de crianças mais velhas e adolescentes, o que aqui discutiremos prioritariamente sob o título de “adoção tardia”.
Certos de que esta cultura da adoção carece de atenção especial no sentido de ser primeiramente conhecida para que, posteriormente, possa ser transformada e então permitir a gênese de novas práticas de cuidado com as crianças e adolescentes no Brasil, é que nos propomos a discutir tal temática, desejando socializar conhecimentos que, assim cremos, poderão fomentar o início de um processo de desconstrução dos preconceitos, mitos e medos em torno da adoção tardia.
Contextualizando a prática da adoção
No Brasil, assim como em grande parte do mundo ocidental, o destino das crianças rejeitadas e abandonadas por seus pais biológicos segue uma ordem cruel: boa parte cresce e se “educa” nos limites da instituição, quase sempre mantida e dirigida pelo Estado ou por associações não governamentais e religiosas.
Algumas crianças, e porque não dizer, umas poucas privilegiadas, são adotadas por casais e famílias. Contudo, grande parte delas, os de fato excluídos social e economicamente pelo sistema, habitam as ruas.
Atualmente a adoção tem sido o tema-alvo das preocupações de muitos que, por razão de sua exigência profissional (juízes, promotores de justiça, advogados, assistentes sociais, psicólogos e educadores) ou por gesto de solidariedade, voltam-se para a causa das crianças e dos adolescentes brasileiros em situação de abandono, conflito com a lei e/ou de institucionalização.
Tais preocupações conectam-se a um contexto tridimensional:
1) o compromisso assumido com todas as crianças e adolescentes do Brasil e oficializado com a promulgação da Lei 8.069, em 13 de julho de 1990, que dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em especial os que se encontram em situação de abandono e, portanto, fora do convívio familiar;
2) a necessidade de se construir uma nova cultura da adoção, liberta dos entraves paradigmáticos que historicamente se opõem a uma postura de maior flexibilidade e aceitação da adoção na família brasileira, dificultando a práxis legal e contribuindo para a solidificação de uma tendência nacional, ou seja, a de que criança abandonada no Brasil tem um destino traçado: a instituição ou a rua;
3) refere-se à possibilidade de fortes, necessárias e urgentes contribuições da ciência psicológica em relação à adoção, uma vez que por meio da pesquisa e da produção científica fomenta-se a construção e instalação de uma outra cultura.
Analisando o disposto pela Lei 8.069 e considerando os apontamentos de Vargas (1998, p. 25) é possível perceber que
as mudanças introduzidas pelo ECA colocam a sociedade brasileira diante de um novo paradigma em relação à ótica e aos modos de ação quando se trata de Infância e Juventude. A Carta Constitucional, tanto como o Estatuto, traz avanços fundamentais quando passa a considerar a criança e o adolescente:
1) sujeitos de direito;
2) pessoas em condições peculiares de desenvolvimento; e
3) de prioridade absoluta.
Assim, temos vigorando concomitantemente no Brasil, de um lado, uma legislação que “teoricamente” se coloca a serviço da criança e do adolescente e, de outro lado, uma cultura que os marginaliza e exclui. Dados capazes de dar forma e materialidade a essa cultura são apresentados a seguir.
Uma pesquisa feita por Weber (1996) sobre a cultura da adoção atuante na sociedade brasileira nos revela um perfil dos pais adotivos: 91% dos que adotam são casados, encontram-se dentro de uma faixa etária nominal de 40 anos e 55 % não possuem filhos naturais; a maior parte dos casais pertence a classes sociais de melhores condições econômicas e realizam a adoção seguindo criteriosamente os trâmites legais, ou seja, por meio dos Juizados da Infância e da Juventude, enquanto que a minoria dos adotantes, portanto, os de classes menos privilegiadas, realizam as adoções dentro do modelo intitulado adoção à brasileira.
A mesma pesquisa (WEBER, 1996) categoriza as crianças como adotáveis e não-adotáveis. O perfil das crianças que mais interessam aos casais correspondem àquelas (76%) cujo estado de saúde é avaliado como saudável, sendo que a preferência aponta para as recém-nascidas, ou seja, 69% dos bebês que têm até 3 meses de idade, 60% são do sexo feminino e 64% são de pele clara (crianças brancas).
Do outro lado desta estatística estão as crianças que despertam menos interesse nos postulantes à adoção; são, portanto, as que configuram o quadro das não-adotáveis: 16,66% são adotadas com a idade média de 2 anos; 36% das crianças são de cor negra ou parda e 23,15% são adotadas mediante a presença de alguma deficiência ou problema de saúde.
Na pesquisa de Casellato (1998), outra face da cultura da adoção se revela, agora em relação às expectativas e motivações dos pais para a adoção: 29% dos pesquisados apontam como motivação para a adoção a impossibilidade de ter os próprios filhos; 16,34% afirmam que a decisão pela adoção se liga ao desejo de ajudar uma criança; 9,80% já manifestavam o desejo de adoção; 6,54% adotaram porque “a criança apareceu”; 5,88% adotaram por se tratar de filhos de parentes; 9,71% apontam como motivação os sentimentos de solidão, compaixão e afeição pela criança; 3,27% somente adotaram depois da morte de um filho natural (biológico); e 2,61% optaram pela adoção porque assim puderam escolher o sexo da criança.
Observando os resultados da pesquisa é possível concluir que por detrás das expectativas e motivações dos adotantes está o desejo de satisfação de interesses próprios, ou seja, para a maioria dos adotantes, a adoção resolve um problema, preenche uma lacuna e contribui para a resolução de um luto: o desejo de aumentar o número de filhos, de fazer caridade, de solucionar problemas conjugais, de encontrar companhia, possibilidade de realização procriativa (no caso da esterilidade/infertilidade de alguns casais), complementar a identidade pessoal, evitar discriminação social (por não ter tido filhos naturais), substituir um filho que se perdeu, etc.
Todos estes números nos remetem a reflexões importantes acerca da adoção, tornando mister, portanto, uma atenção mais efetiva por parte do Estado, das Instituições e dos profissionais envolvidos, em especial os psicólogos. Contudo, os números supra citados referem-se às crianças que foram já adotadas, é por isso que eles podem ser expressos: são concretos.
Nossa preocupação reside na diferença matemática (estatística) existente entre estes números e o total das crianças e adolescentes brasileiros em situação de abandono e/ou institucionalizados: onde e como eles estão? que futuro os espera? e quanto às crianças consideradas não-adotáveis, as mais velhas e/ou portadoras de deficiência e problemas de saúde? se os números apontam para uma diminuta expressão em relação às adoções clássicas, para onde apontam em relação às adoções tardias, ou seja, aquelas em que as crianças têm mais de dois anos de idade ou já são consideradas adolescentes?
No Brasil, como atestam vários autores, entre eles Justo (1997, p. 71),
as instituições asilares comumente denominadas “Orfanatos”, “Lar” ou “Casa da Criança” persistem ainda hoje, embora com menor expressão do que em outros tempos, como um dos lugares da infância, a saber, da infância daquelas crianças que, por diversos motivos, foram desalojadas da guarda e do amparo familiar.
Mas estes abrigos não são novos e Justo (1997) aponta para isso. As instituições asilares estão ainda presentes na sociedade porque se tornaram mecanismos de uma pseudo-ação de cuidado do Estado para com a infância brasileira.
Elas cumprem um papel que a família deveria cumprir se não fossem os muitos absurdos políticos, econômicos e sociais que assolam nosso país e afetam a família de modo direto: a desigualdade social, os anos de política neoliberal, principal promotora do desemprego e da exclusão social; a fome; a miséria; a falta de assistência à saúde da mulher e de programas de informação quanto às possibilidades de planejamento familiar e contracepção; a violência sexual, etc.
Obviamente, a lista de motivos que resultam no abandono de crianças se desdobra e assume outras dimensões que adiante serão abordadas; não podemos culpabilizar o Estado e a política, embora sejam responsáveis e passíveis de questionamentos muito sérios. Igualmente, não podemos culpabilizar as famílias, muitas vezes vitimadas pelo contexto em que se encontram inseridas e integradas.
O que não podemos deixar de fazer em hipótese alguma durante as considerações, investigações e práticas transformadoras da atual cultura da adoção no Brasil, é considerar o fato de que adoções devem ser incentivadas, mas que por detrás de tal feito está a prática do abandono: uma prática sustenta a outra.
Na verdade, é desde o período do Brasil Colônia que conhecemos as primeiras legislações relacionadas ao cuidado com as crianças e adolescentes, como podemos ver em Ferreira e Carvalho (2002, p. 138):
[…] a primeira medida oficial sobre cuidados à infância carente no Brasil data de 1553, quando o Rei D. João II determinou que as crianças órfãs tivessem alimentação garantida pelos administradores da colônia. […]Com a criação das Santas Casas de Misericórdia, o Brasil Colônia importa um outro costume de Portugal: a roda dos expostos, ou roda dos enjeitados. Consistia de uma porta giratória, acoplada ao muro da instituição, com uma gaveta onde as crianças enjeitadas eram depositadas em sigilo, ficando as mães no anonimato. Geralmente, o motivo de tal gesto era uma gravidez indesejada, mas a pobreza também podia levar as mães a se desfazerem do filho desta forma.
As rodas foram instituídas para evitar a prática do aborto e do infanticídio e também para tornar um pouco menos cruel o próprio abandono. Antes delas, os recém-nascidos eram deixados em portas de igrejas ou na frente de casas abastadas e muitas acabaram morrendo antes de serem encontradas.
Somente na década de 30 é que começaram a funcionar os conhecidos e ainda sobreviventes internatos, orfanatos, lares, casas transitórias, etc., legalizados a partir do primeiro Código de Menores, de 1927, e que cumprem com a dupla tarefa de, por meio da reclusão, proteger as crianças e adolescentes das hostilidades e riscos presentes na sociedade, ao passo que protegiam também essa mesma sociedade da incômoda convivência com a figura do menor abandonado.
Com a inauguração dos orfanatos, por volta de 1950 as rodas dos enjeitados foram extintas, mas devido aos incontáveis casos de maus tratos denunciados pela sociedade civil, o Estado inaugura, sob a égide de um novo paradigma de cuidado com a infância, a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (Funabem) e, em diversos estados do território nacional, a Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem).
Também na década de 50 é promulgada a Carta dos Direitos Universais da Criança e do Adolescente, pela ONU – Organização das Nações Unidas, e, como afirma Ferreira e Carvalho (2002), seus princípios contagiam e inspiram os constituintes de 1988, que após significativas alterações na Constituição Federal, possibilitam a formulação do ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990.
Esta lei, de número 8.069/90, traz um significativo avanço na concepção de assistência à infância brasileira e, de modo especial, em relação à adoção, tornando-se um importante marco na história e na cultura da adoção do Brasil, representando a transição entre o período da chamada “adoção clássica”, cujo objetivo maior fixava-se na satisfação das necessidades dos casais impossibilitados de gerar filhos biologicamente, para a chamada “adoção moderna”, que privilegia a criança no sentido de garantir-lhe o direito de crescer e ser educada no seio de uma família (WEBER, 2001).
Este modelo de adoção clássica é o que ainda se vê atuante na cultura da adoção do Brasil. Os motivos que levam casais a adotar, na maioria das vezes, estão vinculados à sua satisfação e não à satisfação da criança prioritariamente, ou seja, nesses casos não são as crianças que precisam de uma família, mas são famílias que precisam de uma criança.
Adotam crianças casais que, como já mencionamos, não podem gerar seus próprios filhos por motivos de infertilidade ou esterilidade (LADVOCAT, 2002); famílias que perderam um filho e buscam através da adoção preencher o espaço vazio que a perda fez existir; casais que construíram, durante boa parte de sua vida em comum, um conjunto de bens que ficará sem quem dele desfrute ou continue após sua morte, portanto, por razões de sobrevivência e continuidade patrimonial; casais que projetam na existência de um filho (biológico ou adotivo) o motivo de manutenção da união conjugal, a resolução de conflitos e a realização do projeto de vida a dois (casar e ter filhos); homens e mulheres solteiros que buscam realizar a experiência da paternidade e da maternidade; homens e mulheres viúvos que não tiveram filhos a tempo e querem evitar a solidão; casais que desejam poder escolher o sexo do bebê, etc.
Em casos como estes a criança é a solução para os problemas, anseios e expectativas dos adotantes. O ECA vem dar a este paradigma um novo formato, invertendo radicalmente os pólos desta configuração, tirando a criança da periferia da família adotante e colocando-a no centro.
Contudo, e paradoxalmente, a lei que dá direito à criança e ao adolescente não lhes garante um lar, uma família. A adoção não é, e jamais poderá ser, obrigatória. Ainda há muitas crianças e adolescentes nas ruas e muitas crianças e adolescentes institucionalizados. Ali ou acolá, excluídas do convívio familiar, embora alguns abrigos o tentem imitar, muitas crianças e adolescentes crescem alijados de figuras importantes para a estruturação de sua identidade e personalidade e, conforme afirma Justo (1997, p. 72-73),
o drama central da vida da criança institucionalizada incide, justamente, sobre os referenciais em relação aos quais possa criar sua própria identidade pessoal e ancorar as diferenciações básicas enumeradas de sua singularidade e de sua localização no mundo.
Como é sabido, a identidade pessoal é criada a partir de diferenciações progressivas entre o “Eu” e o “não Eu”, centradas nas experiências com o próprio corpo, com os objetos do mundo físico e com as pessoas constitutivas do círculo de relações psicossociais do sujeito. […]
A condição de vida da criança institucionalizada – expulsa do eldorado familiar e recolhida caridosamente no lugar dos enjeitados, desvalidos, degenerados e desgraçados – traz como marca principal a perda das referências de sua origem (a filiação paternal), e das fundações de sua pessoa, preenchidas por uma inserção no universo simbólico que a codifica com traços extremamente pejorativos.
A criança e o adolescente brasileiro, primeiramente vitimados por questões sócio-econômicas advindas de uma política nacional que, historicamente, vem sendo responsável pelo crescimento de desigualdades de toda ordem, são também vitimados por um processo de estigmatização, marginalização e exclusão quando são alijados do direito à família por conseqüência de uma cultura da adoção que privilegia crianças recém-nascidas em detrimento de crianças mais velhas e/ou adolescentes. Assim, urge-nos questionar e buscar respostas: que cultura é essa? que mitos, medos e expectativas povoam o imaginário da família brasileira, impedindo-as ou dificultando os processos de adoção?
Adoção tardia: parte do problema ou da solução?
A adoção tardia é apenas uma das múltiplas faces da temática a que nos propomos investigar. Autoras como Vargas (1998) e Weber (1998) consideram tardias as adoções de crianças com idade superior a dois anos. Mas este está longe de ser o único aspecto definidor desta modalidade de adoção.
As crianças consideradas “idosas” para adoção, segundo Vargas (1998, p. 35)
ou foram abandonadas tardiamente pelas mães, que por circunstâncias pessoais ou socioeconômicas, não puderam continuar se encarregando delas ou foram retiradas dos pais pelo poder judiciário, que os julgou incapazes de mantê-las em seu pátrio poder, ou, ainda, foram ‘esquecidas’ pelo Estado desde muito pequenas em ‘orfanatos’ que, na realidade, abrigam uma minoria de órfãos […].
Dentre as diferentes modalidades de adoção, a tardia é a que recebe de modo direto o impacto da atual cultura. Uma recente pesquisa, realizada por Almeida (2003) em cidades do interior paulista consideradas de porte médio (Bauru e Marília) aponta para uma seqüência de dados que nos interessam.
No ano de 2001, dos 133 casais e famílias cadastrados como postulantes à adoção nas duas comarcas, 118 deles colocaram como condição para a realização da adoção o fato da criança ser branca, ou seja, 82,72% do total; somente 9 casais e famílias, o que equivale a 6,72% do total, aceitaram adotar crianças pardas ou negras; 5 casais e famílias cadastradas manifestaram-se indiferentes em relação à cor e etnia das crianças (3,76% do total cadastrado); e apenas 1, entre os 133 cadastrados, manifestou explícito interesse em adotar uma criança negra (0,75% entre os cadastrados) – vale dizer que este casal ou família candidato à adoção, conforme afirmação do pesquisador, também são negros.
Como já havíamos exposto, os números da pesquisa de Almeida (2003) apontam para uma incontestável preferência dos postulantes à adoção por crianças brancas. O que isso significa? Significa que o número de crianças pardas, mas especificamente o número das crianças negras, em instituições asilares (orfanatos, casas transitórias, etc.) é muito maior do que o de crianças brancas, logo, têm menos chances de serem adotadas e usufruírem do constitucional direito à família.
Em conseqüência disso, permanecem por muito mais tempo nas referidas instituições e quando são adotadas – quando o são – configuram outro quadro estatístico, o das adoções tardias.
Em novo procedimento investigativo, agora no ano de 2002, Almeida (2003) levantou informações referentes à comarca de Bauru e cruzou dados que vão além da cor da pele (ou etnia) das crianças em função dos interesses dos postulantes à adoção, considerando também a idade, sexo e estado de saúde das crianças.
Em termos gerais, sua conclusão corrobora com as estatísticas nacionais. 76,19% dos postulantes à adoção interessam-se por crianças brancas e os demais se distribuem entre as categorias: “branca até morena clara” (12,70%), “branca até parda clara” (3,17%), “parda” (1,59%), “parda até negra” (3,17%) e “indiferente” (3,17%). Com relação à idade – e tais dados nos são preciosos porque definem a faixa etária das crianças consideradas idosas para adoção – temos um grande número de postulantes interessados por crianças recém nascidas e/ou com idade inferior a 18 meses (72,36%) em detrimento ao diminuto número de postulantes interessados em crianças com mais de 2 anos (26,99%).
Quanto ao sexo, a preferência é por meninas, na proporção de 50,79% contra 46,03% de interesse por crianças do sexo masculino. Ao serem cadastrados no programa de adoção, os postulantes respondem se aceitam ou não adotar crianças com HIV negativado e o levantamento de Almeida (2003) aponta para o seguinte resultado: 61,90% não aceitam adotar tais crianças, enquanto que 38,10% aceitam: elas também engrossam as estatísticas das adoções tardias ou as estatísticas de crianças institucionalizadas no Brasil.
As contribuições de Almeida (2003) com todos estes dados estatísticos relacionados à adoção dão sentido àquilo que podemos verificar por meio da literatura nacional. Estes números auxiliam na caracterização ou definição do perfil das crianças consideradas “não adotáveis” no contexto social brasileiro.
Não seria exagero, nem tampouco um risco relacionado à repetição, mencionar neste momento de nosso texto que essas crianças – negras, com mais de dois anos de idade, portadoras de alguma deficiência ou possuidoras de um histórico de problemas médico-biológicos – são aquelas destinadas a um período muito extenso de institucionalização e vitimadas por múltiplos abandonos: o “abandono da família biológica” que, por motivos sócio-econômicos ou ético-morais, são impedidas de manter os seus filhos; o “abandono do Estado” que, por meio das limitadas legislações e deficitárias políticas públicas, tem os braços engessados para o acolhimento de seus órfãos; o “abandono da sociedade” que ainda não entendeu o sentido do termo inclusão, uma vez que se vê ocupada com a invenção de novas, refinadas e eficientes técnicas de exclusão do diferente e das minorias.
Os mitos que constituem a atual cultura da adoção no Brasil, apresentam-se como fortes obstáculos à realização de adoções de crianças “idosas” e adolescentes (adoções tardias), uma vez que potencializam crenças e expectativas negativas ligadas à prática da adoção enquanto forma de colocação de crianças e adolescentes em famílias substitutas.
A criança recém nascida, e como nos apontam os números, é mais procurada pelas famílias postulantes à adoção. Tal fato se justifica pelo encontro de “possibilidades” e “expectativas” que nas mesmas se materializam, porque representam (segundo o imaginário dos adotantes):
A possibilidade de uma adaptação tranquila da criança em relação aos pais e dos pais em relação à criança e, conseqüentemente, uma saudável relação entre os pais e filho adotivo, imitando assim a “possível” ou “almejada” relação destes numa situação onde se faz presente o vínculo biológico-sanguíneo;
A oportunidade de construção de um vínculo afetivo mais profundo entre mãe-pai-filho, a tal ponto de apagar as marcas da rejeição e abandono promovidos pela mãe e pai biológicos;
Tempo hábil para a construção do aqui denominado pacto sócio-familiar, caso seja opção da família adotiva manter segredo quanto as origens da criança adotada;
O acompanhamento integral de seu desenvolvimento físico e psicossocial que se manifestam desde as mais primitivas expressões faciais como o sorriso e movimento dos olhos acompanhando objetos e demonstrando o reconhecimento das figuras parentais até as primeiras falas e primeiros passos;
A realização do desejo materno e paterno de poder trocar as fraldas de um bebê a quem chamará de filho, seguido dos desejos complementares à consolidação da figura materna e paterna, tais como, dar-lhe colo, amamentar, ninar, dar banho, trocar-lhe as roupas, etc.;
Protagonizar o papel de pai e mãe no processo de educação do filho, incluindo a possibilidade de acompanhar o desenvolvimento escolar que se desdobra em situações menores em proporção ao todo do processo, mas que são extremamente significativas aos pais, como por exemplo, ver seus primeiros rabiscos no papel se transformarem em garatujas e depois em figuras humanas cada vez mais complexas e representativas, acompanhar os primeiros passos do filho em direção à alfabetização, fazer-se presente nas reuniões da escola e nas comemorações cívicas e culturais, participar com o filho de eventos esportivos, etc.;
Construir uma história familiar e registrá-la, desde os primeiros dias de vida do filho, por meio de fotografias que comporão o álbum de família.
Se, por um lado, essas expectativas presentes no imaginário dos postulantes à adoção, encontram na “criança recém-nascida” a possibilidade de realização, tornando-as alvos de seus interesses e por assim ser, as mais procuradas para adoção, tais expectativas são também os motivos que colocam as chamadas “crianças idosas” e adolescentes no final da fila de espera por uma família. À lista de motivos que tem levado casais e famílias considerados aptos à concretização de adoções, tardias ou não, a desistirem, somam-se questões de toda ordem:
O medo manifestado por muitos casais e famílias postulantes à adoção de que a criança adotada, principalmente a que tem idade igual ou superior a dois anos, por ter permanecido um longo período de seu processo desenvolvimento na instituição ou transitando entre diferentes famílias, não se adapte à realidade de uma família em definitivo, por crer (equivocadamente) que a mesma já terá formado sua personalidade, caráter e por ter se lhe incorporado “vícios”, “má educação”, “falta de limites” e “dificuldade de convivência”;
A negativa expectativa quanto à possibilidade do estabelecimento de vínculos afetivos entre os adotantes e a criança tendo em vista seu histórico de rejeição e abandono associado à consciência de sua não pertença (biológica) à família adotiva;
O mito de que ao longo do processo de desenvolvimento da criança, seus desejos por conhecer a família biológica serão intensificados de modo a comprometer a relação com a família adotiva, sendo este o motivo de constantes conflitos que, quase sempre, culminam com a revolta e/ou fuga do filho adotivo;
O tempo de espera nas filas pela adoção de crianças, coordenadas pelos juizados da infância e juventude, tende a ser longo e o processo burocrático se apresenta como obstáculo dos mais difíceis de serem superados tendo em vista as exigências a serem cumpridas (aliás, todas em função do bem-estar das crianças);
A legislação brasileira, que por cautela e prudência, não dá de imediato a certidão de adoção plena da criança à família adotiva, gerando uma ansiedade na mesma que, para evitar desgastes emocionais em ambas as partes, opta pela desistência da adoção em vez de aceitar a guarda provisória da criança.
Vale dizer que em situações como essa, a família adotiva permanece por um período que varia de um a dois anos com a guarda provisória da criança que, por sua vez, ainda está judicialmente ligada à família biológica.
Como o poder judiciário prima preferencialmente pela permanência das crianças em suas famílias de origem e somente na falta ou impossibilidade desta, disponibiliza a criança para colocação em família substituta, muitas famílias temem – e por isso recusam a guarda provisória – que depois de um tempo de convívio, que certamente resultará na construção de vínculos afetivos com a criança, esta tenha que ser devolvida a sua mãe, pai ou família biológica.
Este é o contexto de inserção de nossa preocupação central: a adoção tardia. Acabamos de apresentar, apoiados na literatura, aspectos que se apresentam como barreiras para a realização das adoções tardias. Contudo, não esgotamos a exploração deste contexto que é, segundo nosso ponto de vista, fiel reflexo da atual cultura da adoção e seus “pré-conceitos”.
Considerações finais: por uma nova cultura da adoção
Vimos que a atuação da atual cultura da adoção tem dificultado os processos de adoção em seus mais diferentes estágios, ou seja, desde o processo de discernimento e decisão do casal/família postulante à adoção até o processo de construção dos vínculos que produzirão os tão almejados laços de família.
Assim, identificamos a atual cultura da adoção como um nó, metaforicamente falando. Postulamos como tarefa dos chamados profissionais da adoção (psicólogos, assistentes sociais, advogados, promotores de justiça, juízes, etc.) o urgente exercício ético de “cuidado” com a temática, de modo a não reproduzirmos os mitos e medos existentes, mas que, pelo contrário, trabalhemos em função de suas desconstruções.
Urge, pois, desbiologizar o paradigma de constituição familiar, promover políticas públicas em favor das crianças e adolescentes em situação de risco (abandono ou conflito com a lei) ao passo que urge também o inaugurar de políticas públicas voltadas para as famílias sem filhos, de modo que estas, devidamente acompanhadas, orientadas e informadas, encontrem na legislação brasileira e nas instituições que a defendem, lugares em que possam vislumbrar a possibilidade de tornarem real o desejado exercício da maternidade e da paternidade, por via da adoção.
Os adolescentes estigmatizados pelo abandono e pela institucionalização não deixarão de existir ou de representar uma ameaça ao bem-estar social – porque bem sabemos que assim é que são hoje vistos pelo senso comum e por alguns de nossos representantes políticos – se não atuarmos em função de uma diminuição do abandono; a outra face da moeda em que se encontra o tema da adoção.
Portanto, já tarda um novo olhar para as políticas de atenção à mulher e de atenção à família. Se não olharmos para as instituições de acolhimento à criança ainda em vigor e se não olharmos para a atual cultura da adoção, e se estes nossos olhares não forem críticos e construtivos, afim de remeter-nos a um engajamento científico, político e social, para que o cuidado com as crianças e adolescentes brasileiros torne-se mais humano do que estigmatizador, mais ético e estético do que maqueador de uma realidade que nos custa caro aos olhos internacionais, então amargaremos, por décadas e séculos, a incômoda consciência de que não fizemos o que poderíamos ter feito.
A construção de uma nova cultura da adoção é, segundo nosso modo de ver, um dos desafios e um dos caminhos que podemos decidir enfrentar e percorrer para que o contingente de crianças e adolescentes sem famílias comece a diminuir no Brasil. Este é um direito inalienável da criança e do adolescente e um dever ético de todos.
Fonte: www.terra.com.br/www.proceedings.scielo.br
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