Joaquim Manuel de Macedo
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Sou um pobre cego,
Que ando sozinho,
Pedindo uma esmola
Sem errar o caminho.
Aqui está um cego,
Pedindo uma esmola,
Devotos de Deus
E de Nossa Senhora.
“Minha mãe acorde
Do seu bom dormir,
Que aqui está um cego
A cantar e a pedir.
—”Se ele canta e pede,
Dá-lhe pão e vinho,
Para o pobre cego
Seguir seu caminho.
—Não quero seu pão,
Nem também seu vinho;
Só quero que Aninha…
Me ensine o caminho.
—”Ana, larga a roca,
E também o linho;
Vai com o pobre cego,
Lh’ensina o caminho.
“Já larguei a roca
E também o linho;
Já me vou com o cego
Ensinar o caminho.
O caminho aí vai
Mui bem direitinho,
Se fique aí,
Vou fiar meu linho.
—Caminha, menina,
Mais um bocadinho;
Sou cego da vista,
Não vejo o caminho.
“Caminhe, senhor cego,
Que isto é bem tardar;
Quero ir-me embora,
Quero ir-me deitar.
—Aperta as passadas
Mais um bocadinho,
Sou cego da vista,
Não vejo o caminho.
“Adeus, minha casa,
Adeus, minha terra,
Adeus, minha mãe,
Que tão falsa me era.
—Adeus, minha pátria,
Adeus, gente boa;
Adeus, minha mãe,
Que me vou à toa.
“Valha-me Deus
E Santa Maria,
Qu’eu nunca vi cego
De cavalaria.
—Se eu me fiz cego
Foi porque queria;
Sou filho de conde,
Tenho bizarria.
Cala-te, menina,
Deixa de chorar;
Tu inda não sabes
O que vais gozar.
—”Deus lhe dê bons dias,
Senhora vizinha,
Esta meia noite
Me fugiu Aninha.
—”Deus lhe dê os mesmos!
De cara mui feia,
Três filhas que tenho
Vou po-las na peia.
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