Marcos Pontes

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Nacionalidade: brasileiro.

Nascimento: 11 de Março de 1963 (45 anos) Bauru, Brasil

Ocupação anterior: piloto de caça.

Tempo no espaço: 9d 21h 17m.

Seleção: 1998.

Missões: Soyuz TMA-8 Soyuz TMA-7.

Marcos Pontes – Vida

Marcos Pontes
Marcos Pontes

Nascido 11 de março de 1963, em Bauru, São Paulo, Brasil.

Casado com o ex Francisca de Fátima Cavalcanti de Angicos, Rio Grande do Norte, Brasil.

Eles têm dois filhos.

Interesses recreativas incluem levantamento de peso, futebol, violão e piano, esboço, pintura em aquarela.

EDUCAÇÃO

Formado pelo Liceu Noroeste da Escola Secundária, Bauru, São Paulo, em 1980; recebeu o diploma de bacharel em tecnologia aeronáutica da Academia Brasil Força Aérea, Pirassununga, São Paulo, em 1984, o diploma de bacharel em engenharia aeronáutica, do Instituto Tecnológico de Aeronáutica, São José dos Campos, São Paulo, em 1993, e um mestre do grau da ciência em Engenharia de Sistemas pela Naval Postgraduate School, Monterey, Califórnia, em 1998.

PREMIAÇÃO

Medalha de serviço digna da Força Aérea, e Medalha Santos Dumont.

Honras especiais

Formou-se com distinção Instituto Technologico de Aeronáutica; recebeu o Prêmio Espaço e Instituto de Aeronáutica e EMBRAER (Empresa Brasileira de Aeronáutica) Award em 1994 para Test Pilot Training. Prémio Universidade da Força Aérea em 1995.

Graduou-se com distinção Naval Postgraduate School.

EXPERIÊNCIA

Pontes se formou como piloto militar da Academia Brasil Força Aérea, Pirassununga, São Paulo, em 1984.

Após um ano de formação avançada de jato no Grupo de Aviação 2/5 Instrução, Natal, Rio Grande do Norte, ele foi designado para 3/10 Strike Group Aviation, Santa Maria, Rio Grande do Sul.

Como piloto militar, ele foi qualificado como um instrutor para missões de ataque ao solo e ataques avançados Air Controlling.

Como um Flight Safety Officer, sua experiência de trabalho incluiu 14 anos de investigação de acidentes aeronáuticos.

De 1989 a 1993 ele participou de Aeronáutica curso de Engenharia, seguidos de um ano de um curso piloto de teste.

Como piloto de testes, ele trabalhou no desenvolvimento de armas, testes de mísseis e avaliação das aeronaves.

Ele tem registrado mais de 1.900 horas de vôo em mais de 20 diferentes aeronaves, incluindo F-15, F-16, F18 e MIG-29.

Em 1996, ele foi designado para a Naval Postgraduate School. Pontes se formou na Naval Postgraduate School, quando ele foi selecionado para o programa de astronauta.

EXPERIÊNCIA NA NASA

Selecionado como um especialista de missão, ele relatou ao Centro Espacial Johnson em agosto de 1998 para participar de Treino de Astronautas que incluiu briefings de orientação e passeios, inúmeros briefings científicos e técnicos, instrução intensiva em sistemas Shuttle e da Estação Espacial Internacional, treinamento fisiológico e terra escola para se preparar para o treinamento de vôo T-38, bem como aprender técnicas de água e sobrevivência na selva.

Pontes foi inicialmente atribuído funções técnicas na Estação Espacial Operações Ramo Astronaut Office.

Pontes é o primeiro astronauta profissional brasileiro a ir para o espaço.

Ele lançado com a Expedição-13 tripulantes do Cosmódromo de Baikonur, no Cazaquistão, em 29 de março de 2006 a bordo de uma nave espacial Soyuz TMA, acoplagem com a estação em 31 de março de 2006, onde viveu e trabalhou para os próximos 8 dias.

Pontes retornou à Terra com o desembarque tripulação da Expedição-12 nas estepes do Cazaquistão em sua nave espacial Soyuz em 08 de abril de 2006.

Marcos Pontes – Biografia

Marcos Pontes
Primeiro Astronauta Brasileiro

Nascido em 11 de março de 1963 na cidade de Bauru, SP.

Começou sua carreira profissional aos 14 anos como aluno do SENAI e eletricista aprendiz da Rede Ferroviária Federal – RFFSA, para pagar pelos seus estudos e ajudar no orçamento de casa.

Ingressou na Academia da Força Aérea – AFA, em 1981, onde formou-se oficial aviador. Após a AFA, especializou-se em aviação de caça, tornando-se instrutor, líder de esquadrilha, controlador aéreo avançado, e piloto de testes de aeronaves. Conta com mais de 2000 horas de vôo de caça e de teste em mais de 25 diferentes tipos de aeronaves, incluindo F-15 Eagle, F-16 Falcon, F-18 Hornet e MIG-29 Fulcrum. Como piloto, participou de momentos históricos da aviação nacional, como o primeiro lançamento do míssil nacional ar-ar MAA-1.

Trabalha há mais de 20 anos na área de segurança de vôo, prevenção e investigação de acidentes aéreos. Engenheiro Aeronáutico formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Pontes é Mestre em Engenharia de Sistemas pela Escola de Pós-graduação da Marinha Americana em Monterey, Califórnia. Como pesquisador, o trabalho de Pontes foi direcionado para a área de sensores, para a qual desenvolveu aperfeiçoamentos para sistemas embarcados de detecção de mísseis utilizando lentes polarizadoras.

Em junho de 1998 deixou de exercer as funções específicas de militar da ativa devido a ter sido designado, após seleção por concurso de âmbito nacional, para servir o Brasil na função civil de astronauta, passando a integrar a turma 17 de astronautas da NASA.

Após dois anos de curso, em dezembro de 2000, Pontes foi declarado astronauta pela NASA, tornando-se oficialmente o 1º astronauta profissional brasileiro.

Nos anos seguintes permaneceu em treinamento na NASA, em Houston, na função civil de astronauta.

O primeiro vôo espacial do astronauta Pontes ocorreu em 29 de março de 2006, a bordo da espaçonave russa Soyuz TMA-8, como tripulante da Missão Centenário, definida e criada pela Agência Espacial Brasileira – AEB. Durante a missão, Pontes foi acompanhado pelo Cosmonauta Pavel Vinogradov, comandante da missão e pelo Astronauta Jeffrey Williams, 1º oficial. Seu backup era o Cosmonauta Sergei Volkov, que realizaria a missão espacial brasileira caso houvesse algum problema de saúde ou qualificação do astronauta Pontes.

Em 9 de abril de 2006, depois de 10 dias no espaço, sendo oito deles a bordo da Estação Espacial Internacional – ISS, Pontes, regressou à Terra, pousando no deserto do Cazaquistão. A missão cumpriu todos os objetivos estabelecidos pela AEB. Realizou oito experimentos, prestou a maior homenagem internacional ao centenário do vôo de Santos Dumont no 14-bis, incentivou milhares de jovens para as carreiras de ciência e tecnologia, dando início a uma nova fase da ciência da microgravidade no país.

Dos 32 elementos da classe 17 de astronautas, Pontes foi o segundo a chegar ao espaço.

Além das funções operacionais como astronauta, Pontes trabalhou na NASA como engenheiro nas áreas de software da ISS, integração e testes de módulos e sistemas, desenvolvimento e testes do Laboratório Japonês (JEM) e Projeto do Módulo da Centrífuga, desenvolvido pela Mitsubishi Heavy Industries – MHI, no Japão.

Na seqüência de sua carreira no setor aeroespacial, depois da missão espacial, a exemplo do que é feito em todos os países desenvolvidos, o COmando da Aeronáutica transferiu Pontes para a reserva militar, visando a continuidade e utilização plena de suas qualificações em prol do País na função civil de astronauta .

Atualmente, o engenheiro Marcos Pontes trabalha em Houston e no Brasil, continuando à disposição do Programa Espacial Brasileiro como astronauta para possíveis futuras missões espaciais tripuladas brasileiras. No setor privado trabalha como consultor técnico, palestrante motivacional, engenheiro e colunista. No terceiro setor, Pontes é defensor ativo das causas da educação, paz mundial e consciência ambiental.

Sua contribuição profissional e importância histórica para o País, são reconhecidos através de inúmeras condecorações, entre elas: Medalha Santos Dumont, Medalha Yuri Gagarin, Medalha Tiradentes, Comendador da Paz dos Reservistas da ONU, Boina Azul Honoris Causa, Medalha Militar de Prata, Soberana Ordem do Mérito Empreendedor, Ordem do Mérito Nacional, Ordem do Mérito Aeronáutico, Comenda da Ordem do Rio Branco no Grau Oficial (Palácio do Itamaraty), Medalha de Ouro da Sociedade Acadêmica Francesa de Artes, Ciências e Letras, asteróide em seu nome (38245 Marcospontes)…

A passagem de vinda

Era uma noite como qualquer outra, dia 11 de março de 1963. O cheiro da noite e o barulho das crianças brincando na calçada atestavam a tranqüilidade que Bauru possuía entre tantas cidades do interior de São Paulo.

A calma da casa na Rua Comendador Leite 1-23 de repente se transforma em alguma preocupação nas palavras de minha mãe: “Vergílio, acho que está na hora. Vá e chame a parteira.” Sem demora lá foi meu pai a procura daquela senhora que tantos já havia trazido para este mundo sem problema algum. “Certo, boa estatística, mas, Senhor, por favor, nos ajude nesse parto também”, pensava meu pai enquanto caminhava apressadamente pelas ruas do Jardim Bela Vista. Não era longe por certo, mas aquela distância nunca pareceu tão grande. Uma hora depois lá estavam eles. Esquenta bastante água, tire as crianças daqui, prepare alguns panos…reze bastante. Longos momentos depois, nasci, finalmente! Meus irmãos espiavam pela fresta da parede de madeira. “Olha o pezinho dele!”, dizia minha irmã disputando espaço com meu irmão pelo melhor ângulo. Eu estava feliz…com certeza após a passagem de vinda! Afinal…eu estava aqui!

A janela do quarto

Difícil recordar detalhes de nossa primeira infância. Talvez alguns sons, imagens confusas numa cabecinha ainda tentando reconhecer e se organizar. Minha irmã cuidava de mim enquanto meus pais trabalhavam fora. Acho que cuida até hoje de certa forma. Fecho os olhos tentando recordar alguma coisa. Lembro das madeiras do chão da sala. Sempre enceradas e brilhando. Será aliás que se acumulava entre as pranchas e que me ajudavam a fixar alguns animais de papel que eu cuidadosamente recortava. Elefantes, cavalos, coelhos, do papel criavam vida própria na minha imaginação. Um momento…lembro de um outro lugar, um chão coberto de palha de arroz e muita gente, muitas mesas…Pego o telefone e ligo para minha irmã.

Ela me diz que sim, houve uma festa de casamento da nossa vizinha do outro lado da rua. Havia muita gente, muitas mesas e palha de arroz no chão. Então é possível lembrar! “E cheiro de madeira, porque me recordo disso?” eu pergunto a ela.

Ela responde: “Certamente vindo da serraria que havia no prédio logo atrás da nossa casa. Você devia ter uns 5 anos apenas” OK! Eu agora acredito que é possível lembrar. Tento me concentrar mais…mais para o passado. A memória é azul…parte de baixo não. Parece uma construção.

Ela para por uns instantes e diz…”A janela!…Você está lembrando da janela do seu quarto quando você era bebê. Seu berço ficava de frente para a janela e você podia ver o céu e um pedaço do muro!…Você passava horas, tranqüilo, apenas olhando para aquela janela…olhando para o céu.” Senti uma sensação estranha ao ouvir aquilo. Será que conseguimos “voltar no tempo” e lembrar até do tempo anterior ao nascimento? Tentei um pouco mais, mas nada parecia fazer sentido. Talvez necessitasse maior concentração…ou autorização.

Meus pais e meus irmãos

Bom lembrar das coisas da infância, dos lugares, dos eventos…mas nada seria igual sem as pessoas…a família. Meu pai, seu Vergílio era servente do Instituto Brasileiro do Café. Minha mãe Dona Zuleika, era escrituraria da Rede Ferroviária Federal. Meus pais.. meus mestres! Gosto sempre de dizer que, apesar de ter estudado praticamente toda a minha vida para atingir os “graus” de formação acadêmica, todas as coisas mais importantes que aprendi até hoje foram ensinadas por eles…aos quais devo simplesmente tudo o que sou como pessoa. Ambos já se foram dessa dimensão. Mas tenho certeza que, seja lá em qual dimensão estiverem, os dois ainda olham por mim e sabem muito bem do orgulho que eu sempre tive e tenho por eles…por poder chamá-los de meus pais.

As vezes ainda ouço suas vozes me acalmando no meio da tempestade, aquele sussurro tênue, mas que fala alto ao coração, e que me deseja tudo de bom, e me diz para ter paciência e nunca desistir de amar e ajudar as pessoas, todas elas, as que me querem bem e também aquelas que só querem me prejudicar, pois a minha atitude tem de refletir os meus princípios e não a maldade de outras pessoas.

Um dia nos veremos novamente…sem as preocupações e as dificuldades desse mundo.

Meu irmão Luiz Carlos e minha irmã Rosa Maria ainda vivem em Bauru. Longe daqui…mas perto do coração e com uma grande influência em minha vida. É bom esse sentido de família…ligação forte…de carinho e compreensão mútua. A família sempre foi para mim algo de extrema importância. Acredito ser a estabilidade familiar o primeiro passo fundamental para o crescimento do indivíduo em todos os aspectos. Agradeço muito a Deus pela oportunidade de conviver com pessoas tão maravilhosas. Sinto pena daqueles que vivem nesse mundo carregando um pesado fardo de sentimentos ruins contra os próprios pais, os próprios irmãos…e em muitos casos, tão orgulhosos para dar uma chance para si mesmos.

Criando asas

Vivi o início de minha vida ali na Rua Comendador Leite. Mais tarde mudamos para a rua Beiruth, também no Jardim Bela Vista, onde passei grande parte de minha infância… bastante feliz, diga-se de passagem. Fácil lembrar…Aliás, sou repleto de boas lembranças da vida de cidade de interior, como “jogar bola” na chuva, nadar no “rio Batalha”, comer frutas “do pé”, etc.

Alguns momentos daquela época ficaram marcados com todos seus detalhes registrados pela percepção de um garoto, por exemplo: a morte do meu avô Francisco que morava conosco, a chegada do homem a Lua e o Brasil vencendo a copa no México. Como tudo na vida..uma mistura de fatos bons e ruins…crescemos assim…aprendemos assim.

Outras grandes lembranças foram por conta das visitas ao Aeroclube de Bauru para ver a Esquadrilha da Fumaça voando em elegantes North American T6.

Lembro também das visitas à Academia da Força Aérea, em Pirassununga, onde meu tio, na época o Sargento Oswaldo Canova, servia como membro da equipe de manutenção de aeronaves.

Decolava ali, entre a poeira levantada pelos motores dos T/6 no estacionamento do aeroclube e o cheiro de combustível de aviação nos hangares da AFA, o sonho de voar que me sustenta nessa jornada até hoje.

O ideal estava começando a criar asas!

A início da educação

Meus primeiros anos de escola foram no “EEPG Lourenço Filho” e no “EEPG Francisco Antunes” onde cursei o primário. Uma peculiaridade daquela época era o fato de eu ter pertencido a duas turmas ao mesmo tempo (manhã e tarde) durante um ano. Esta foi “a solução” encontrada para a falta de creches que pudéssemos pagar no horário de trabalho de minha mãe.

Minha professora Zilai, no Lourenço Filho, costumava ser dura e exigente conosco. Dizia que “apenas a educação poderia pavimentar nosso caminho para uma vida digna”.

Ela estava certa, em todos os sentidos: nos objetivos, na filosofia e nos métodos! Assim como estão os milhares de professores por todo esse nosso país.

Profissionais dedicados que são tão importantes para a nossa vida. E ao mesmo tempo tão esquecidos pelas autoridades. Quem não se lembra de um professor?

Eles estão a maior parte do tempo conosco. Torcem para o nosso sucesso. Nos levam pela mão. Acreditam em nós quando todos não conseguem ver além de uma criança assustada. Eles vêem o nosso potencial. Não existiriam presidentes, engenheiros, empresários, astronautas, médicos, etc, eficientes sem o trabalho de professores eficientes!

O ginásio cursei no “SESI 358 – Bauru”. Era uma escola completa, oferecendo além das aulas tradicionais, várias outras atividades como práticas desportivas em várias modalidades, artes, música, etc. Quantas recordações! A primeira namorada, Luciane, os amigos, as reuniões que conduzia com todos os alunos na escadaria da escola. Eu era o presidente do Grêmio Estudantil.

Naquela época, costumavam dar até o material escolar. Um dia, no começo do ano, chegávamos na sala e lá estavam os cadernos e os livros, novinhos. Fecho os olhos e lembro perfeitamente, até hoje, do cheiro de tinta entre as folhas dos livros. Você consegue imaginar o quanto aquilo significava para mim? Você consegue imaginar o que isto significa para uma criança que não tem condições de comprar seu material para estudar?

Dos “trilhos de ferro” dos trens para as “trilhas de condensação”

Aos 14 anos senti necessidade de começar a me preparar para alguma profissão e auxiliar no orçamento de casa, pelo menos com o pagamento de minhas despesas da minha própria educação. Queria aprender, mas aprender custa dinheiro…que eu, como muitos jovens, não tinha. Descobri que havia um curso de formação profissional da Rede Ferroviária Federal em parceria com o SENAI. Fiz a inscrição para o concurso, estudei, fiz os exames e iniciei o curso de eletricista no “Centro de Formação Profissional Aurélio Ibiapina”. Eu era um aprendiz de eletricista! Era um bom começo! Ganhava cerca de meio salário mínimo e tinha carteira assinada.

Com o dinheiro que ganhava, eu podia pagar o curso noturno: “segundo grau profissionalizante – técnico em eletrônica”!

Meu pai me acordava as 06:30 da manhã, tomávamos café juntos (ele sempre fazia um ótimo café) e seguíamos a pé conversando sobre “qualquer coisa” até o viaduto da Rua Azarias Leite. Recordo o cheiro do mato molhado pelo orvalho daquelas manhãs. A voz calma do meu pai. As coisas que ele me ensinava.

Algo tão difícil hoje em dia: um pai ter tempo para conversar com o filho.

Do viaduto, nos despedíamos. Eu descia para atravessar os trilhos e seguir para as oficinas na RFFSA enquanto ele prosseguia pelo viaduto para pegar o trenzinho para o IBC (Instituto Brasileiro do Café).

Eu trabalhava e aprendia a profissão na RFFSA durante o dia (das 8h às 17h). Saia dali correndo (literalmente) para o treinamento de Judô no SESI. Treinava por uma hora e corria (literalmente algumas vezes) para o colégio profissionalizante no “Liceu Noroeste” (das 19h às 23h).

Esta foi a minha rotina por 3 anos. Uma fase muito significativa em minha vida, especialmente por ter representado o início “das ações” na direção dos meus objetivos.

Em 1980 me inscrevi para os exames de seleção da AFA. Meu salário como eletricista em treinamento era suficiente para pagar os custos do colégio, porém a participação em um curso preparatório para as provas da AFA estava fora de alcance do orçamento. A solução veio na forma de ajuda dos meus professores do colégio, principalmente o Prof. Izzo, que além de oferecer orientação nas suas matérias relativas aos exames, também me emprestou todos os livros necessários.

Sou extremamente grato a todos eles não só por isso, mas principalmente pelas constantes palavras de incentivo.

O tempo para estudar, entretanto, era um tanto restrito devido aos cursos normais do colégio e as atividades de trabalho nas oficinas da RFFSA. Dessa forma, estudar dentro de uma locomotiva durante teste de motor era uma freqüente (e ruidosa) opção.

Os exames da Academia foram como eu esperava…difíceis. Contudo dei a sorte de ter estudado o assunto correto e acabei tendo um bom resultado, sendo classificado como o segundo colocado no País.

Iniciei o curso da AFA em Fevereiro de 1981. Eu era então o “Cadete 81/194 Pontes”, e em breve (no ano seguinte) teria meu primeiro contato com a instrução de vôo.

Durante o intervalo das aulas na Divisão de Ensino – DE a visão dos aviões pousando e decolando eram realmente motivadoras. Os anos se passaram na rotina coberta-e-alinhada do cadete. Dificuldades, sorrisos, espadim, vôos, estudo, muito estudo, viagens para Bauru nos finais de semana, cabelo curto, amigos antigos, despedidas e encontros.

Um belo dia de dezembro em 1984 o meu instrutor, o Cap. Reis, literalmente cravou o brevê de oficial aviador da Força Aérea em meu peito. O sangue selou uma paixão pelo vôo que perdura por toda a minha vida. Eu estava formado! Eu podia voar!

Piloto de caça!… E papai

Após a conclusão do curso na AFA fui designado para o curso de caça no 2/5 Grupo de Aviação no Centro de Aplicações Táticas e Recompletamento de Equipagens – CATRE (como era conhecido na época) em Natal-RN . O curso foi intenso com duração de um ano. Aulas, briefings, vôos, simuladores, reuniões na sala dos pilotos… Longos dias, porém extremamente felizes, não apenas por estar em uma das mais fascinantes atividades do mundo, mas também pelo ambiente agradável e de cenário magnífico da cidade de Natal.

Foi durante aquele ano que conheci minha esposa Fátima. Sem dúvida nenhuma uma das pessoas mais importantes e influentes em minha vida. Iniciamos a vida juntos bem jovens. Um pequeno apartamento alugado…praticamente vazio. Os móveis foram comprados pouco a pouco…com o pouco que sobrava. Passamos muitas situações difíceis ao longo de todos esses anos. Muitas boas também! Mas, independente dos meus erros e das minhas fraquezas como pessoa, ou da minha ausência, devido a minha missão para com o País, ela sempre esteve aqui, bem do meu lado, não na frente, não atrás, mas sempre do meu lado, apoiando da maneira como era possível para ela. Algumas vezes mesmo sem concordar inteiramente com o que eu fazia, mas valia o “trabalho de equipe”, e assim chegamos até aqui, juntos! Um tentando completar as falhas do outro, para o sucesso comum, com carinho, paz e compreensão.

Nunca sabemos do futuro e não levamos nada material dessa vida. Contudo, tenho certeza que as idéias, o carinho, os momentos bons devem ficar na memória, talvez possamos até levá-los conosco! Por isso, não importa o que aconteça, ela estará sempre aqui dentro, comigo, como algo de bom, para sempre!

Em 1986, fui transferido para o 3/10 Grupo de Aviação “Esquadrão Centauro” em Santa Maria-RS. Permaneci naquele esquadrão durante três anos e alguns meses. Eu sou o “Centauro 77”. O trabalho em um esquadrão de caça, onde a vida de cada um depende literalmente da performance do outro, é uma experiência realmente enriquecedora no sentido de trabalho “em equipe” (essência da vida em sociedade).

Daqueles anos de Centauro, inúmeros momentos ficaram marcados para sempre em minha memória. Momentos muito felizes como os churrascos do esquadrão no “quero-quero”, as competições anuais em Santa Cruz/RJ e, logicamente, o nascimento de meu primeiro filho Fábio. Eu acompanhei o parto normal e o segurei ainda com o cordão umbilical preso ao corpo. Poucos pais tiveram essa experiência. Difícil descrever a felicidade de um momento como esse! Por outro lado, também alguns tristes momentos os quais, embora inevitáveis nesse tipo de atividade, sempre gostaríamos de ter a chance de evitar. Assim foi a decolagem para “o grande vôo” do meu grande amigo Geraldo Brezinski, em Nov/87.

Decolagens, Pousos e Cálculos

Estava tudo tranqüilo em minha vida. Eu era um piloto de caça, era instrutor, a família estava bem, a vida tinha sua rotina, e eu gostava muito do que eu fazia. Contudo, lembro bem da minha mãe falando sobre esse tipo de “calma” há muito tempo atrás.

Ela dizia: “Fique atento para quando a calma da situação tentar convencê-lo a não fazer nada. A maioria das pessoas deixam-se levar por esse erro. Lembre-se que o seu progresso na vida é como remar contra a correnteza. No momento que você para pára de remar para apreciar a natureza, você está voltando rio abaixo. Assim, descanse quando necessário, mas saiba que isso tem um preço”

E dentro de mim havia aquele fogo pelo conhecimento! Havia ainda muita coisa a fazer!

Em Dezembro de 1989 fiz o vestibular e fui aprovado no Instituto Tecnológico de Aeronáutica – ITA. Todos diziam que eu era louco de tentar uma coisa daquelas casado e com filho. Fui transferido para o Centro Tecnológico de Aeronáutica – CTA (como era conhecido na época). Mudamos para São José dos Campos em Fevereiro de 1989. Iniciava ali mais um desafio. Não era apenas estudar e passar. Havia um time (uma família) a voar em equipe naquela missão.

O curso de engenharia no ITA é reconhecidamente um dos melhores do País (e também um dos mais exigentes!). A importância da participação, compreensão e apoio da família durante os cinco anos de curso era essencial.

Foram anos de bastante concentração. Novos conhecimentos, novas amizades, muitas felicidades, planos e esperanças.

Logo após o Natal, no ano novo de 1990, recebemos um adorável presente: o nascimento de nossa filha Ana Carolina. A loirinha não esperou que mudássemos para uma casa, ou apartamento, na base. Depois de dois anos morando em um quarto do hotel da base enquanto esperávamos na fila das casas, ela nasceu ali mesmo! Pagar aluguel fora da base era fora do orçamento de Tenente. Finalmente, em fevereiro de 1991 conseguimos um apartamento no então recém construído prédio H-9A!

O vôo durante aqueles anos ficou restrito aos vôos administrativos de Bandeirante, T-25 e Regente na Divisão de Operações – DOP do CTA.

Piloto de Provas

Mas a junção da experiência operacional com o conhecimento de engenharia pedia algo mais. No último ano do curso de engenharia, realizei provas de seleção para o curso de ensaios em vôo da Divisão de Ensaios em Vôo – AEV, do Instituto de Aeronáutica e Espaço, IAE-CTA. O curso teve duração de um ano. Foi o casamento perfeito entre a teoria de engenharia aeronáutica e a prática de vôo. Eu era então um Piloto de Provas! Para quem não sabe, piloto de provas é um piloto que testa aviões novos e equipamentos instalados em aviões já em operação. Certamente envolve muitos riscos, mas também uma carga enorme de estudo, conhecimento, preparação, e responsabilidade. Afinal, a maioria dos protótipos custam dezenas de milhões de dólares!

Algo interessante também aconteceu naquela época: eu fui o primeiro piloto de provas formado no Brasil que também era engenheiro formado no ITA.

Na época havia apenas dois grupos “separados”: engenheiros de prova e pilotos de prova. Durante algum tempo, eu era o único “híbrido” a disposição da Força Aérea. Embora eu não soubesse disso antes de começar o curso, esse fato facilitou missões futuras e abriu perspectivas para outros pilotos seguirem o mesmo caminho (cursarem o ITA e depois seguirem para serem pilotos de prova). Hoje em dia isso é um fato comum, e muito bom para a qualidade dos recursos humanos na Força Aérea.

Embora não seja muito divulgado, é importante ressaltar que existem apenas cinco escolas de n?l em ensaios em vôo no mundo. Uma delas e exatamente aqui no nosso Brasil! Isso sempre foi uma razão de orgulho para mim (e gostaria que fosse para todo Brasileiro), pois, apesar de todas as dificuldades e limitações orçamentárias, somos capazes de manter uma instituição do calibre da Divisão de Ensaios em Vôo em padrão internacional graças principalmente à dedicação e profissionalismo de seus integrantes.

Em minha passagem pela AEV, tive a oportunidade de voar vários tipos de aeronaves de última geração da década de 90, como os caças americanos F-15 Eagle, F-16 Falcon e F-18 Hornet. Também voei o MIG-29 Fulcrum, na Rússia. Além disso, também tive a oportunidade de participar de vários projetos nacionais de grande interesse como o primeiro míssil ar-ar MAA-1, cujo primeiro lançamento, realizado pelo então Maj. Márcio Jordão, eu tive o prazer de acompanhar como “chase” (aeronave que voa próximo ao lançador para filmar e garantir a segurança em caso de qualquer problema, como explosão, colisão, apagamento do motor, etc). Minha chance de lançá-lo veio no dia seguinte. Era o segundo lançamento daquele equipamento nacional. Fizemos na área da Barreira do Inferno, em Natal, RN. Aquele seria o segundo de uma série de lançamentos com sucesso, provando, entre outras coisas, a capacidade da indústria nacional. Eu sou o “Prova 37”! Código de chamada rádio que trago comigo com muito carinho, assim como a lembrança de cada um dos amigos da AEV.

Esposa, 2 filhos, cinco malas …e um cachorro. Welcome to US!

Em 1996 fui enviado para Mestrado (Master’s Degree em Systems Engineering) na Naval Postgraduate School – NPS em Monterey na Califórnia. Outro curso, outra língua, outro País.. Para nós, eu e minha família, um outro desafio. Lembro bem da sensação quando estávamos chegando a Los Angeles. Olhava a cidade de cima, lembrava que ainda teria que pegar uma conexão para Monterey. O avião está atrasado….será que dará tempo? Olho para o lado, vejo as crianças dormindo…penso…”Meus Deus, me ajude!… Permita que eles sejam felizes nessa nova vida…”

Interessante pensar que o que eu tinha de mais precioso estava ali…dentro daquele avião. Na verdade, estava ali tudo o que eu tinha literalmente….Esposa, 2 filhos, cinco malas…e um cachorro!

Pousamos, fizemos a conexão, quase sem problemas, e finalmente chegamos em Monterey. Conforme minhas expectativas, Fátima, Fábio e Carol superaram todos os problemas iniciais de adaptação e língua com bastante facilidade, permitindo que eu novamente me dedicasse com bastante afinco às atividades de pesquisa.

Como resultado, fui convidado a permanecer nos Estados Unidos e continuar minhas pesquisas em nível de Doutorado (PhD). A experiência de vida adquirida pela convivência em Monterey foi excelente para todos nós.

Tivemos a oportunidade de conhecer muitos lugares e pessoas maravilhosas com as quais mantemos excelente contato até hoje, mais de dez anos depois!

A seleção de astronautas

O Brasil havia entrado no programa da Estação Espacial Internacional (ISS) em 1997, como participante, através da NASA. Eu não fazia idéia de nada disso!

Pelo acordo, o Brasil teria que produzir no país, pagando à indústria nacional, seis componentes da espaçonave (ISS) e entregá-las ao consórcio dos 16 paises participantes. Em troca, o Brasil teria direito a executar experimentos no ambiente de microgravidade (o melhor já conseguido pelo homem), a bordo da ISS, ter intercâmbio de pesquisadores e um vôo espacial. Para tanto, o Brasil precisava treinar um astronauta.

Veio então divulgação da seleção do primeiro astronauta brasileiro. Foi feita pela Agência Espacial Brasileira através de edital de seleção pública no jornal, a nível nacional. Isso foi em Maio de 1998. Eu estava concentrado em minhas atividades de pesquisa em Monterey, na Califórnia. Soube da notícia através de um e-mail enviado pelo meu irmão Luiz Carlos. A princípio achei um tanto difícil que eu pudesse ser selecionado entre tantos excelentes candidatos disponíveis. Porém, estava ali um caminho para tornar realidade algo que até então era apenas um “sonho distante”. Portanto, tentar, com todo coração e alma, era absolutamente necessário! Por que não?!

Preenchi a papelada. Enviei cheio de esperanças e dúvidas. Esperei…esperei…esperei.

Um dia veio a resposta. Veio por fax. Testes preliminares, exames médicos, físicos, psiquiátricos e a entrevista se seguiram. Como disse no final da entrevista de seleção… “Imagine como está se sentindo aquele garoto aprendiz de eletricista só pelo fato de estar participando dessa seleção!!”

O anúncio da minha escolha está entre os momentos de minha vida que sou capaz de descrever em todos os detalhes…mas isso fica para uma ocasião mais propícia!

Era o início de um novo “capítulo” em minha vida.

Mais um desafio, mais uma missão: levar a bandeira do Brasil ao espaço pela primeira vez, mesmo com o sacrifício da própria vida, se for necessário. Recebi a mensagem “para levar a Garcia” (se você não conhece essa expressão, pesquise!) e assim o fiz.

O treinamento de astronautas

Instalados em Houston, em agosto de 1998, deixei as funções de militar da ativa para me dedicar exclusivamente às funções civis de astronauta, a serviço do Brasil. Minha carreira militar tinha terminado, sacrificada pela nova missão. Começaram os treinamentos para a nova etapa. Muitos treinamentos, duros, intensos, distantes da família, distantes de todos, distante dos limites fisiológicos e psicológicos que eu achava que tinha. Os dois primeiros anos foram de curso.

Procedimentos, sistemas do ônibus espacial, sistemas da Estação Espacial, emergências, mais emergências. Ainda não está bom. Mais treinamento, mais treinamento.

Em dezembro de 2000, finalmente, recebi o meu “brevê” de astronauta na NASA. Eu era então, oficialmente, o primeiro Astronauta Profissional Brasileiro.

Mas ainda faltava muita coisa. Enquanto eu me dedicava completamente ao treinamento, na minha função operacional de astronauta, no Brasil a parte técnica do acordo da ISS ia de mal a pior.

A administração não conseguia coordenar a fabricação das peças necessárias ao acordo.

Como astronauta, eu mantinha meu treinamento, estando pronto para atender à escalação para vôo no momento que o país determinasse. Também trabalhava com a parte técnica do projeto do laboratório Japonês KIBO entre Houston (NASA) e Tsukuba (JAXA – Agencia Espacial Japonesa). Todos os astronautas têm funções técnicas, além das funções normais operacionais.

Em 2002 a Agência Espacial Brasileira oficialmente desistiu de fabricar as peças nacionais que dariam um certificado de qualidade extremamente importante para a indústria brasileira para exportações de alta tecnologia.

Novela da participação brasileira na ISS

Resolvi que era hora de entrar no circuito técnico para tentar ajudar a manter o país no programa e evitar a vergonha de sermos o único país, entre os 16 participantes, a não ser capaz de cumprir sua parte no acordo (algo que, além da vergonha, seria um péssimo cartão de visitas internacional para nossas indústrias e centros de pesquisa). Deixei boa parte do trabalho técnico que havia sido designado, entre NASA e Japão, e solicitei à NASA que me designasse para acompanhar a situação de hardware da participação brasileira (tanto as negociações, quanto os procedimentos de engenharia).

Conseguimos recuperar a participação mudando o escopo da responsabilidade brasileira no acordo: de seis peças com investimento estimado na indústria brasileira de 120 milhões de dólares em cinco anos, para 43 pequenas placas adaptadoras com investimento total de apenas 10 milhões do Programa Espacial Brasileiro na indústria nacional. Essa redução de custos foi necessária, segundo a administração para adequar o orçamento. Grande parcela do orçamento do programa espacial é destinado para manter o programa Chinês-Brasileiro de satélites de Observação da Terra (CBERS), que envolve centenas de milhões de dólares de investimento necessário.

Mesmo assim, o programa da ISS passou várias vezes por ser cortado do orçamento. A administração não conseguiu produzir nenhuma peça.

Em 2004, praticamente sem esperanças de que o Brasil pudesse cumprir a sua parte, sem mas desculpas viáveis para apresentar nas reuniões internacionais na NASA com os outros 15 parceiros, mais ainda sem esperanças de um vôo espacial ser escalado, resolvi pelo menos tentar salvar a parte do nome do Brasil e pedir ajuda ao SENAI-SP/FIESP.

Numa reunião de pouco mais de 15 minutos, eles disseram: “Esse programa é muito importante para o Brasil e para as nossas indústrias. É uma vergonha essa situação de vexame em que nos encontramos. Nós iremos construir os protótipos e, se for necessário, todas as peças, sem nenhum custo para a AEB!

Fazemos isso pelo Brasil! E ficamos muitos felizes de poder trabalhar com você, um ex-aluno do SESI e do SENAI-SP!”

Aquilo deu novo ânimo. Agora seria uma questão apenas da AEB gerenciar um acordo com o SENAI-SP e interligá-los com a NASA e com o IFI-CTA para que tudo funcionasse (o INPE já havia descartado o programa do seu elenco de projetos).

O Embaixador Pimentel, do Consulado Brasileiro em Houston, nos auxiliou nos tratos diplomáticos com a administração da NASA.

Eu já não tinha tanta vergonha de andar pelos corredores do prédio 1 (administração técnica da ISS) da NASA em Houston.

A AEB determinou que a sua gerência do projeto da ISS coordenasse todo o processo. O tempo passou. Reuniões técnicas e mais reuniões técnicas. Acidente do Columbia e acidente em Alcântara. Atrasos operacionais. Tristeza. Trabalhei na investigação do Columbia. Perdi sete amigos próximos em Houston e mais 21 no Brasil.

Perdi também um pouco mais da esperança de conseguir cumprir minha missão, não só com a demora do retorno ao vôo dos ônibus espaciais, mas também somado à restrição do número de vôos, e à inacreditável demora do Brasil produzir partes simples, mesmo com a disponibilidade do SENAI-SP em construí-las quando a administração assim determinasse.

A Primeira Missão Espacial Tripulada Brasileira

Em 2005 a AEB tomou uma decisão surpreendente, que me deixou extremamente feliz. Realizar a Missão Centenário em 2006 com os objetivos de realizar experimentos nacionais em microgravidade, fomentar essa área da ciência no Brasil, promover o programa espacial (marcado negativamente pelo acidente de Alcântara), motivar milhões de jovens estudantes em todo o Brasil para as carreiras de C&T, e criar a maior homenagem internacional ao Centenário do vôo histórico de Santos Dumont.

A missão seria possível utilizando a participação brasileira na ISS, mas teria de ser feita através do outro parceiro majoritário, a Rússia, visto a impossibilidade operacional dos ônibus espaciais americanos. Eu seria o tripulante da Missão. Caso eu tivesse qualquer problema, a Missão seria realizada normalmente pelo Cosmonauta Russo Sergei Volkov.

Segui para a Rússia em outubro de 2005.

Na frente outro grande desafio: aprender todos os sistemas do Soyuz (espaçonave russa) e dos módulos russos da ISS em menos de seis meses. Seria um record inclusive para o setor de treinamento dos Russos. Além disso, em paralelo nos primeiros três meses, eu teria que aprender a língua russa o suficiente para passar nos exames orais e operar com segurança todos os sistemas das espaçonaves. Se eu não fosse capaz de passar nos testes, o meu backup, Sergei Volkov, assumiria a missão brasileira, e eu teria falhado na minha.

A pressão era enorme. A família ficaria em Houston. Eu os veria novamente apenas por meia hora no dia anterior à decolagem da Missão, no Cazaquistão.

Venci. Vencemos juntos. Todos os brasileiros venceram! Cumpri a minha missão, levei a “mensagem a Garcia”, e a bandeira brasileira chegou ao espaço pela primeira vez nas mãos de um brasileiro no dia 29 de Março de 2006 às 23:30 (horário no Brasil)!

O retorno da missão

A missão cumpriu todos os seus objetivos com louvor. Muito além das expectativas da AEB.

A parte operacional, minha parte, foi cumprida sem qualquer falha de procedimento.

Após a missão, o Comando da Aeronáutica oficializou a minha transferência do serviço ativo militar para a reserva, de forma que eu continuasse normalmente com as minhas atividades da função civil de astronauta que tenho tido pelos últimos dez anos. O Comando simplesmente fez o que é fato simples e normal em todos os países desenvolvidos. Por exemplo, todos os astronautas e cosmonautas que voaram comigo no espaço e que eram militares, também foram transferidos para a reserva. Isso é apenas a seqüência normal da carreira civil de astronauta.

Porém, quando no retorno ao Brasil, fui surpreendido ao observar uma tremenda ignorância e despreparo do País para os procedimentos normais dentro da área de vôos tripulados. Visto o fato de eu ter sido o primeiro astronauta do país, era de se esperar alguma dificuldade das instituições e mesmo a população em acompanhar os acontecimentos e os trabalhos normais do setor. Porém, o que se viu foi um absurdo estardalhaço de críticas e acusações à missão, à AEB e a mim, sem qualquer sentido lógico causados por uma parte inferior da imprensa e um punhado de críticos do programa, que manipularam e enganaram o povo para aumentarem as vendas de jornais e se auto-promoverem às custas da popularidade do evento histórico que testemunharam. Foi uma vergonha. Fiquei extremamente triste com o que vi.

Mais frustração ainda! Exatamente no mesmo período (entre maio e agosto de 2006) em que esses irresponsáveis iludiam o povo no Brasil com notícias falsas de “minha aposentadoria”, eu estava em Houston trabalhando para tentar salvar novamente a participação brasileira da expulsão do programa, visto que todo o atraso não podia mais ser tolerado no cronograma dos vôos e as peças que seriam de fabricação nacional seriam passadas para a indústria americana. Foi um período terrível de negociações internacionais. Dificultada também pelo tempo que eu perdia para escrever notas para a imprensa para tentar corrigir a besteira que tinham feito sobre a questão da reserva (que a maioria ignorava). Em todo caso, finalmente, depois de muita conversa com os representantes da NASA, conseguimos retomar os procedimentos técnicos. Infelizmente, no final de 2006, frustrados com a administração do programa no Brasil, a NASA colocou a participação brasileira em um estado “congelado”, que aguarda definições desde então a partir das negociações da administração AEB e Ministério das Relações Exteriores, do lado do Brasil, com a NASA em Washington-DC e o Departamento de Estado, do lado americano.

Nós, da parte técnica….aguardamos.

Tendo sido reconhecido profissionalmente em tantos outros países, e conhecedor da história dos seus programas espaciais e seus personagens, eu esperava mais da nossa cultura em muitos dos aspectos que testemunhei nos fatos dessa “reentrada” que assisti no meu retorno (em todos os pontos citados).

Contudo, lembrando do que aprendi com meus pais, “o erro por ignorância é apenas um sinal da necessidade de mais educação e uma chance para melhorar alguma coisa”.

Decidi que era exatamente assim que eu deveria trabalhar. Tudo aquilo seria apenas motivação a mais para mim. Aliás, todas as palavras maldosas eram ditas apenas por uma minoria desprezível como profissionais e como pessoas. A esmagadora maioria dos Brasileiros tem grande orgulho da sua bandeira e do evento histórico da primeira missão espacial brasileira. Assim, para que dar atenção ao pequeno grupo negativo? Quem realmente merece minha consideração são os milhões de pessoas que constantemente expressam sua satisfação e apreço pelas nossas atividades e princípios.

Assim, eu simplesmente continuei a fazer o meu trabalho normalmente, assessorando o Programa Espacial Brasileiro em Houston, conforme necessário, estando pronto para ser escalado para outro vôo espacial pelo país, como o único brasileiro qualificado para essa função, e também dedicando-me às causas sociais, à preservação ambiental e às atividades para o desenvolvimento da educação, da motivação e qualificação profissional, da tecnologia e da ciência nos setores público e privado.

Isso é importante: ajudar com o meu trabalho para o desenvolvimento do treinamento, para termos profissionais qualificados, e para o fortalecimento das nossas empresas e organizações, para termos mais empregos para nós brasileiros.

Atualmente

Hoje em dia participo ativamente de vários setores no Brasil e no mundo. Trabalho junto às instituições nacionais e internacionais para o desenvolvimento do setor aeroespacial. Aguardo, como astronauta, a escalação para um próximo vôo espacial brasileiro. Quem sabe? Trabalho como voluntário para causas sociais e ambientais. Acho isso extremamente gratificante e um alimento para a alma. Oriento centenas de jovens estudantes e profissionais, por internet e pessoalmente, a encontrarem sua melhor habilidade para buscar seus objetivos. Fotografo a vida. Pinto e desenho minhas idéias. Trabalho como engenheiro em projetos e consultorias técnicas a empresas no Brasil e no exterior. Escrevo artigos e outros textos com a finalidade de conscientizar e motivar pessoas para descobrirem o seu potencial. Trabalho como educador em Palestras, Aulas e Cursos. Trabalho com dezenas de empresas privadas e públicas, usando minha experiência e conhecimentos para a motivação e treinamento de seus recursos humanos.

Eu vivo e trabalho com motivação, honestidade, ética, afinco e persistência em todas essas atividades, exatamente como meus pais me ensinaram…há muito tempo atrás. Faço o que gosto, e gosto do que faço.

Meus objetivos são simples: ser útil para o maior número de pessoas possível, trazer otimismo e bem estar, espalhar coisas boas e felicidade, ser feliz…até o dia de, finalmente, poder abraçar Aquele que nunca me abandonou.

Sentir que cumpri bem as missões que recebi na vida. Só isso!

Não sei sobre o futuro, mas sei sobre meus objetivos e a minha vontade. Na verdade continuo simplesmente seguindo meu coração, meus sonhos, meus princípios de menino do interior. Eles não são novos, começaram há muito tempo atrás nas caminhadas longas das manhãs frias com o meu pai, na poeira levantada pelos motores dos NA T-6 da Esquadrilha da Fumaça, no cheiro de combustível dos hangares, no cenário maravilhoso do tapete branco das nuvens acima das tempestades, na serenidade da visão do nosso Planeta azul, no carinho e no conselho das pessoas que amei na vida.

Seguem-se a força, a esperança, e a possibilidade:

A força infinita através daquele que nunca nos abandona: Deus;
A esperança pura de a cada dia fazer uma pessoa mais feliz, e, de certa forma, retribuir com amor a tudo o que recebi das pessoas, todas elas – as que me sempre me ajudaram, pois acreditaram em mim, e também as que tentaram me prejudicar, pois me ensinaram a acreditar mais em mim; e
A possibilidade quase mágica de poder ajudar com o meu trabalho no sucesso dos milhões de “garotos aprendizes”, brasileiros que lutam, profissionais, pessoas de bem, que têm, como eu, a “coragem de sonhar”.

Fonte: www.jsc.nasa.gov/www.marcospontes.net

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