Química do Vinho

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Química do Vinho
Vinho

Uma parreira, luz solar e água: eis a uva.

Agora some ao suco desta algumas leveduras, e… pronto: O VINHO.

Nenhuma outra bebida é tão amada, discutida, estudada, e atrai tantos aficionados quanto o vinho.

VINIFICAÇÃO

Matéria prima do Vinho, a “produção” da uva pelas videiras requer apenas água e sol. A luz solar transforma o dióxido de carbono da atmosfera em açucares, isto é feito nas folhas (a fotossíntese), que transferem este açúcar para o fruto; as raízes contribuem com a água para fazer o suco, minerais e outros elementos em pequenas quantidades.

Na sua forma mais básica, a fabricação do vinho é simples. Após as uvas terem sido espremidas, o levedo (pequeno organismo unicelular que existe naturalmente na vinha e, conseqüentemente, nas uvas) entra em contato com o açúcar do suco da uva e, gradualmente, converte esse açúcar em álcool. CO 2 também é produzido neste processo exotérmico. Quando o levedo conclui seu trabalho, o suco de uva vira vinho. Quanto mais maduras e doces forem as uvas, maior será o teor alcoólico no vinho. Todo este processo é chamado de fermentação. Após a fermentação, o vinho pode (ou não) ser deixado maturar.

AÇÚCAR (17g) -> ÁLCOOL (1oGL) + CALORIAS (1,5 Cal) + CO2 (4 lit ou 4 atm)

Como o teor alcoólico do vinho é de 11 a 13 o GL, temos:

187 – 221g de açúcar -> 11 a 13 o GL de álcool + 44 – 52 litros CO 2 + 16,5 – 19,5 Cal

16,5 a 19,5 Cal equivalem a 30 – 34 o C que são reduzidos para: 15 – 18 o C nos brancos e 20 – 30 o C nos tintos;

Nos espumantes a pressão é de 6 atm / litro, necessitando, portanto, de 25,5 g açúcar / litro e resultando em um acréscimo de 1,5 o GL ao vinho.

Esta é a etapa na qual o vinho “reúne suas forças”. A fermentação pode durar três dias ou três semanas, e o vinho pode maturar por dois meses, ou dois anos. O tempo dependerá da uva utilizada no processo e do vinho a ser obtido.

O vinho é definido pela O.I.V. (Office International de la Vigne et du Vin) como a bebida resultante da fermentação do mosto (suco) de uvas frescas. E portanto, qualquer outra bebida fermentada não obtida dessa forma não pode ser denominada vinho, como é o caso do assim denominado “vinho” de pêssego, ou de maça.

A fermentação é realizada por microorganismos do gênero Saccharomyces, destacando-se as espécies S. ellipsoideus (ou cerevisae ou vini), S. chevalieri e S. oviformis (ou bayanus). Neste processo bioquímico os microorganismos convertem moléculas de carbo-hidratos (açúcares) em álcool, gás carbônico e energia, conforme o esquema demonstrado ao lado.

Obviamente que o processo de vinificação dos vinhos de mesa: brancos, tintos, rosés, bem como vinhos de sobremesa e vinhos espumantes é diferenciado. O vinho branco, que é de fato amarelo, pode ser feito de uvas brancas ou, mais raramente, de uvas vermelhas. No segundo caso, o suco da uva deve ser previamente separado de suas cascas, pois lá estarão os pigmentos vermelhos. Vinhos tintos são feitos de uvas vermelhas ou azuladas, cujo suco (sempre incolor) é deixado em contato com as cascas destas uvas durante a fermentação. Assim, taninos são transferidos da casca para a uva. Estas espécies vão conferir cor acentuada ao vinho, bem como sabor. E o vinho rosé?

Na vinificação deste o suco também é deixado em contato com as cascas de uvas tintas, mas por um período bem mais curto: algumas horas ao invés de dias e semanas como no caso dos tintos.

Vinho do Porto

O vinho do Porto é um dos melhores Vinhos Fortificados do mundo. Sua “invenção” deve-se a uma das muitas guerras entre ingleses e franceses, e também a um conhecimento empírico de química. No final do século XVII, quando os ingleses não podiam obter vinhos franceses, eles se viram obrigados a importar vinhos de Portugal. A fim de garantir a estabilidade dos vinhos durante o transporte, conhaque foi adicionado ao vinho pronto. Já no século XIX, os produtores em Portugal passaram a fortificar seus vinhos durante a etapa de fermentação. Resultaram então vinhos de alto teor alcoólico e com açúcar residual. Naturalmente estavam utilizando o princípio de Le Chatelier, pois a adição de álcool, produto da fermentação, deslocava o equilíbrio para os reagentes, açúcares, interrompendo a fermentação.

Detalhe: atualmente os franceses bebem três vezes mais Porto do que os ingleses.

Os Vinhos de Sobremesa, também denominados de Vinhos Licorosos, são aqueles que tiverem um teor alcoólico maior que 14 oGL. Para obter este alto teor, álcool é adicionado durante ou após a fermentação, e talvez o termo mais correto para designar estes vinhos, já que eles são consumidos antes ou depois das refeições, seja Vinhos Fortificados.

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Um famoso vinho espumante de Bordeaux

A vinificação dos Vinhos Espumantes, tem como principal diferença o fato do enólogo deixar na garrafa parte do dióxido de carbono produzido durante a fermentação. É claro que para produzir uma garrafa de um Champagne não é assim tão simples.

O método denominado de Champenoise consiste na elaboração de um vinho base, ao qual é adicionado uma certa quantidade de açúcar refinado (24 g/L de vinho). Realiza-se assim uma segunda etapa de fermentação, desta vez na garrafa, onde estão presentes ainda leveduras e clarificante (geralmente bentonita).

Durante o período (cerca de 3 meses) em que o vinho ficará na garrafa, esta será rotacionada periodicamente e sujeita a inclinações progressivas com o gargalo para baixo. Durante a fermentação na garrafa se formarão resíduos sólidos que se acumularão no gargalo. Para a retirada destes é realizado um congelamento do gargalo em solução refrigerante, e a abertura da tampa provoca a expulsão do cilindro de sedimentos pela pressão interna.

Finalmente é adicionado o licor de expedição: vinho velho ou conhaque + açúcar e fechada a garrafa com rolha de cortiça.

PROCESSOS NA FABRICAÇÃO DO VINHO

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Chateau em St. Emilion (FR)

1. Colheita

A colheita ja é, na verdade, uma etapa posterior a várias outras etapas iniciais, como o preparo do solo, o controle de pragas nas videiras, a irrigação artificial, entre outras.

Na França, ao contrário do Brasil, as videiras nao sao plantadas em parrerais, com suportes: as videiras são como pequenos arbustros, que crescem livremente.

Muitas delas, dependendo do chateau, sao centenárias. Algumas tem mais de 500 anos!

Existe uma relação entre a idade da planta e a qualidade do vinho: quanto mais velha, mais enraizada está a videira, e mais chance de sugar nutrientes do solo ela possui. Por consequência, melhor será a qualidade da uva.

Como a uva têm enorme influência sobre o sabor e qualidade do vinho, a colheita precisa ser feita no tempo certo. Uma colheita prematura resulta em um vinho aguado, com baixa concentração de álcool. Ja uma colheita tardia, produz um vinho rico em álcool, mas com pouca acidez.

Tão logo a uva é colhida, passa-se à etapa seguinte: o esmagamento.

2. Esmagamento

Outrora feito com os pés dos vinicultores, hoje é um processo mecanizado. Geralmente, as uvas são dispostas em um cilindro metálico perfurado, onde pás giram a mais de 1.200 rpm. No final, as cascas estao separadas das uvas, e se obtem uma grande “sopa” de suco, cascas e sementes. Dependendo do tipo desejado do vinho, opta-se por um diferente processo.

Para a produçao do vinho tinto, esta sopa é prensada por vários dias, e todo o conjunto é fermentado. Apos alguns dias, o suco é entao separado. A parte solida que resta é chamada de pomace, e pode ser utilizada para o preparo de certos licores.

3. Fermentaçao

Esta é a etapa mais importante e mais complicada de todo o processo. Aqui, os químicos sao vitais. Entre outros, é necessario um rígido controle da temperatura, supressão de microorganismos indesejados, presença adequada de bactérias de fermentação, nutrição adequada para estas bactérias, prevenção da oxidação, etc..

A escolha da bactéria adequada para o tipo da uva é fundamental, e motivo de discordia entre varios enólogos. A mais comum é a Saccharomyces cerevisae, mas outras espécies deste mesmo gênero tambem tem sido vastamente utilizadas. Para cada ml do suco, utiliza-se uma população de cerca de 1 milhao de células de bactérias!

O controle da temperatura durante a fermentação alcóolica é necessário para (1) facilitar o crescimento das bactérias, (2) extrair os componentes de sabor e cor das cascas, (3) permitir o acúmulo de produtos laterais desejados, e (4) prevenir o exterminio das bactérias.

A temperatura ideal para a maior parte dos vinhos é de cerca de 25 o C. Mas esta etapa raramente é iniciada nesta temperatura, pois a fermentação naturalmente eleva a temperatura do suco, e os vinicultores devem evitar que esta ultrapasse a marca dos 30 o C, onde as bactérias morreriam. Hoje este controle é automatizado, sendo que as pipas metalicas contém sistemas de troca de calor, e todo o processo é termostatizado.

O contato com o ar deve ser evitado, do contrário ocorreria a oxidação do vinho. Isto é feito pelo lacramento dos recipientes onde a fermentação é realizada e, algumas vezes, pela introduçao de CO 2 . Apos a fermentação, adiciona-se pequenas quantidades de SO 2 ou ácido ascórbico, como anti-oxidantes.

Apos a fermentaçao, o vinho é decantado e o líquido sobrenadante é então separado. O vinho esta pronto, entao, para o segundo processo de fermentação.

4. Fermentação malolática

Esta etapa é bastante executada na europa, sobretudo na França. No Brasil, entretanto, os vinicultores nao dão, ainda, muito valor para esta fermentação.

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O ácido malônico é transformado em ácido lático. O processo provoca a liberação de gás carbônico .

Há muito tempo se sabe que, mesmo finda a fermentação alcóolica, observa-se a evolução de dióxido de carbono do vinho. Há poucos anos, quimicos descobriram que esta segunda fermentação se devia a ação de enzimas sobre o ácido malônico, presente no vinho, e a sua transformação em ácido lático. Neste processo, vários agentes de sabor, muitos ainda nao estudados, são formados. Este processo produz um sabor diferenciado ao vinho; por isso, também, os vinhos franceses são tão diferentes dos demais.

Esta etapa é extremamente caprichosa: se a fermentação for excessiva, os vinhos ficarão aguados, baixos em acidez, e ricos em diacetilas, que podem até mesmo ser tóxicas, quando em excesso. Um grande controle é feito, através de leituras da composição por cromatografia. Quando o ácido malônico atinge um certo patamar; adiciona-se SO 2 para inibir esta fermentação.

Um excelente artigo sobre o tema foi publicado em 1999 por pesquisadores da Faculté d’Oenologie, da Université Bordeaux 2. Gilles de Revel (veja, adiante, entrevista com este enólogo) e seus colegas observaram que, além de influenciar decisivamente no sabor do vinho per si, a fermentaçao malônica também auxilia a extração de componentes flavorizantes dos barris de carvalho. O artigo descreve as principais mudanças organolépticas ocorridas com o vinho que sofre a fermentação malônica. (Contribution to the Knowledge of Malolactic Fermentation Influence on Wine Aroma, J. Agric. Food. Chem., 1999, 47, 4003)

5. Afinamento

Uma prática muito antiga, hoje é feita com requintes científicos. Envolve processos como filtraçao, centrifugaçao, refrigeraçao, troca iônica e aquecimento. Nesta etapa, o vinho é clarificado, grande parte dos produtos precipitáveis é extraida, e muitos íons metálicos, que tornam o vinho turvo, são retirados.

O vinho que tomamos é, geralmente, transparente à luz. Mas nao é desta forma que ele sai dos barris de fermentação. Muitas proteínas e complexos metálicos o deixam turvo, opaco. Entre as formas atuais de clarificação, encontram-se o uso de colunas de sílica, PVP ou caseína. Nos EUA, utiliza-se cufex, um produto que contém ferrocianato de potássio, para a extração de íons como o cobre e ferro. O uso de bentonita ajuda a remoção de proteínas.

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É aconselhável deixar o vinho ambientar por algum tempo antes do consumo

Outro problema é o excesso de tartaratos, que podem precipitar, no vinho. O tartarato pouco solúvel é o de sódio; por isso, modernas vinícolas utilizam um processo familiar aos químicos, o de troca ionica, onde os íons sódio sao substituídos por potássio, gerando um tartarato mais solúvel.

Finalmente, o vinho passa por uma pasteurização, onde é aquecido subitamente até cerca de 80 o C e então resfriado. Alem de acabar com as bactérias restantes, o método auxilia na precipitação das proteínas que por ventura estiverem no vinho.

6. Envelhecimento

Muitos vinhos tem o sabor melhorado se armazenados por alguns anos. Durante este tempo, a acidez diminui, varias substâncias pouco solúveis acabam precipitando e varios componentes formam complexos afetando o sabor e odor. Uma das formas de envelhecimento mais clássica é a feita em barris de carvalho.

Estes barris são porosos, e permitem a entrada de oxigênio e a saída de água e álcool. O vinho tambem extrai componentes da madeira, que influenciam no aroma final. A cada nova safra, os barris devem ser totalmente renovados, do contrário ocorreria a proliferação de fungos ou outros microorganismos indesejáveis.

Vários artigos recentes descrevem o efeito do envelhecimento sobre a composição química do vinho, mas pouco se sabia até alguns anos atrás. O vinho é um excelente meio reacional e, durante o envelhecimento, várias reações químicas podem ocorrer. Entretanto, mais de 90% de todo o vinho consumido no mundo sofre apenas 2 anos de envelhecimento. No Brasil, esta prática nao é comum, e os vinhos sao engarrafados pouco tempo após a fermentação.

7. Engarrafamento

Antes de ser engarrafado, o vinho ainda passa por algumas etapas, que visam corrigir o pH, a cor ou concentração de O 2 dissolvido. Muitas vezes, as garrafas são saturadas com CO 2 antes de receberem o vinho. Na França, as garrafas sempre sao novas e nunca reutilizadas, para evitar a contaminação do vinho por microorganismos estranhos. A garrafa é, em geral, escura, para evitar a fotoindução da oxidação do vinho.

A rolha é muito importante: precisa ser de boa qualidade, senão pode alterar drásticamente o sabor do vinho. Mesmo se utilizando uma excelente rolha, muitos componentes desta acabam sendo extraídos pelo vinho; o mais comum e mais estudado é o 2,4,6-tricloroanisol. J.M Amon e colegas relataram, em um trabalho recentemente publicado, que cerca de 65% dos vinhos contém este composto. Um método para a quantificação desta substância, via cromatografia e espectrometria de massa, foi desenvolvido por Thomas Evans e colegas do Departament of Viticulture and Enology, da University of California (Journal of Chromatography A, 786 (1997), 293).

ENOLOGIA

Antes do século 19, pouco se sabia sobre o processo de fermentação da uva ou do processo de deterioramento do vinho. Tantos os gregos como os romanos bebiam todo o seus vinhos logo no primeiro ano apos o preparo, pois nao haviam técnicas para a conservação eficaz. Eles costumavam adicionar flavorizantes, como ervas, mel, queijo ou até mesmo sal, para disfarçar o gosto do vinagre.

Com os vinhos descritos no velho testamento, acontecia a mesma coisa: o consumo deveria ser mais rápido do que a sua deterioração.

No século 17, com a invenção do saca-rolhas e com a produção em massa de garrafas de vidro, os vinhos começaram a ser armazenados por vários anos.

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Louis Pasteur

Louis Pasteur nasceu no dia 27/12/1822 em Dole (Jura/FR). Entre várias descobertas, destaca-se a teoria de que as doenças são causadas por germes – uma das mais importantes em toda a história médica. Esta descoberta foi o pedra fundamental da microbiologia.

“Existe mais filosofia em uma garrafa de vinho que em todos os livros.” PASTEUR (1822-1895)

Mas foi somente na metade do século 19 que a produçao do vinho ganhou requintes científicos: o químico francês Louis Pasteur explicou a origem química da fermentação e identificou os agentes responsáveis por este processo. Ele tambem inventou um método para matar a bactéria responsavel pelo deterioramento do vinho, que hoje é chamado de pasteurização.

Com o passar dos anos, mais a ciência se adentrou na viticultura: houve avanços na fisiologia das plantas, nos conhecimentos de patologias das videiras, e mais controle do processo de fermentaçao. Logo, vieram os tanques de aço inoxidável, que além de poder serem limpos facilmente tambem permitem controlar a temperatura do vinho sem dificuldade.

Hoje, a química esta presente em todas as etapas: diariamente, alíquotas do líquido fermentado são colhidas e analisadas em cromatógrafos; o solo onde as videiras são plantadas é minunciosamente preparado com aditivos químicos; sabe-se exatamente que tipo de substâncias podem se despreender do barril ou das rolhas e influenciarem no sabor do vinho; sabe-se quando o vinho está pronto pela sua assinatura química em um GPC.

FENÓIS E SEUS BENEFÍCIOS À SAÚDE

A presença de antioxidantes em nossa dieta reduz a incidência de doenças do coração e câncer. É sobre este tema que se baseiam muitos dos estudos sobre a estreita relação entre vinho e saúde.

Os estudos relacionados aos benefícios do consumo moderado do vinho à saúde parecem ser unânimes em afirmar que o vinho é a bebida alcoólica mais eficaz na redução dos riscos de mortalidade por doenças do coração. As substâncias fenólicas (polifenóis e flavonóides) que contribuem nas propriedades sensoriais do vinho são as responsáveis pelos benefícios. Ao polifenol chamado de transresveratrol são atribuídos os maiores benefícios, especialmente no que diz respeito à formação do colesterol HDL. O resveratrol é estrogênico, e por isso poderia substituir o estradiol ao manter a proliferação de certas células do câncer de mama que necessitam estrogênio para crescer. O resveratrol é um potente antiinflamatório e por isso seu efeito anticancerígeno, permitindo ao organismo bloquear a produção de certas substâncias químicas, conhecidas como prosta-glandinas, que têm sido relacionadas a transformações de lesões pré-cancerosas em lesões malignas.

Um artigo na revista Science, publicado em 1997, descreveu os mecanismos pelos quais o resveratrol pode ser considerado anticancerígeno (M. Jang et al., Science 275 (1997), 218). O resveratrol inibe eventos celulares associados com a iniciação, promoção e progressão de tumores cancerígenos. O composto também atua como um antimutágeno e tem propriedades fugicidas. Este composto já foi encontrado em 72 espécies vegetais, sendo que muitas delas fazem parte da dieta humana. No caso das variedades vinifera, a síntese do resveratrol ocorre na casca da fruta – uma arma da planta, talvez, contra o ataque de fungos.

Ácidos Graxos

Os ácidos graxos no vinho têm origem nos firmes tecidos das uvas. Entrentanto, a maior parte é formada durante a fermentação alcóolica, uma vez que ácidos graxos podem ser liberados pelos fermentos, como descreve o artigo de E. Pueyo et al., publicado em 1989 no American Journal of Enologie and Viticulture (Am. J. Enol. Vitic. 40 (1989) 175).

Estes compostos ocorrem, no vinho, de duas formas: livres (Cn, onde n é o número de carbono da cadeia alquílica do ácido) ou ligados, principalmente sobre a forma de etil ésteres, uma vez que etanol é o álcool mais abundante neste ambiente (CnE: éster etílico de um ácido graxo).

Os ácidos graxos contribuem muito para o sabor do vinho: os ésteres diretamente, pois possuem fortes aromas e odores característicos; os ácidos livres, indiretamente, como precursores de aldeídos e álcools de seis carbonos, que possuem sabor herbáceo. Não obstante, os ácidos graxos contribuem para a estabilização e formação da espuma em vinhos espumantes.

Amino-ácidos + compostos carbonílicos

Os amino-ácidos representam a mais importante forma de compostos nitrogenados nos vinhos. Devido ao seu caráter polifuncional, os amino-ácidos possuem uma grande reatividade química com respeito a compostos carbonilados – particularmente com açúcares, de acordo com a reação de Maillard. Este reação leva a compostos alfa-dicarbonílicos, que são frequentemente encontrados no vinhos após as fermentações alcóolica e malonática. Nos vinhos, estes compostos estão em equilíbrio de oxiredução, isto é, com suas formas alfa-hidróxi-cetonas e alfa-dióis.

Odores provenientes de amino-ácidos + compostos alfa-dicarbonílicos 

Substratos Produtos da reação Odor no vinho
cisteína +
glioxal, diacetil ou 2,3-pentanodiona
H2S, dissulfeto de carbono, pirazina, metanotiol,
trimetiozazole, 2-metil-tiazole
ovos podres, enxofre, defumado, torrado, nozes, pipoca
metionina +
glioxal, diacetil ou 2,3-pentanodiona
metanotiol, dissulfeto de dimetila, metional batata e repolho
valina +
glioxal, diacetil ou 2,3-pentanodiona
2-metil-propanal queijo
leucina +
glioxal, diacetil ou 2,3-pentanodiona
3-metil-butanal amílico
iso-leucina +
glioxal, diacetil ou 2,3-pentanodiona
2-metil-butanal frutas
fenilalanina +
glioxal, diacetil ou 2,3-pentanodiona
benzaldeído, fenilacetaldeído floral

(Gilles de Revel et. al., J. of Agric. Food Chem. 48 (2000) 3761)

Os amino-ácidos têm grande importância no sabor do vinho, além de atuarem como precursores de diversos outros compostos também flavorizantes. A formação destes produtos depende muito de diversas variáveis as quais o vinho pode ser submetido, como pH, temperatura, concentração de dióxido de carbono, exposição ao oxigênio e tempo de envelhecimento.

A cisteína – um dos amino-ácidos sulfonados, leva à formação de heterocíclos como pirazinas, metil-tiazoles, acetil-tiazolidina, entre outros, que contribuem largamente para o sabor final do vinho: estes compostos agregam aromas como o de pipoca, nozes, defumado e enxofre. Por isso o controle rigoroso da quantidade de amino-ácidos e os caminhos metabólicos sofridos por estes no processo da fabricação do vinho é extremamente importante, pois um descontrole levaria a perda de qualidade olftativa da bebida.

Carbo-hidratos

É natural de se esperar encontrar, no vinho, muitos carbo-hidratos, afinal ele é feito a partir de um vegetal.

E, de fato, existem muitas substâncias desta classe na bebida: tanto sacarídeos como poli-sacarídeos, tal como a celulose, hemicelulose e xiloglucana.

Existem, ainda, glucosídeos ou poli-sacarídeos peptídicos, como a homogalacturonana.

Hewitt et al. publicaram um artigo, ainda em 1956 (Food Tech. Oct. (1956) 487), descrevendo os glucosídeos como uma fonte potencial para compostos flavorizantes: embora não tenham odor, podem vir a liberar, mediante ação enzimática, álcoois e açúcares que contém odor e aroma característicos.

Química do Vinho
(K.M. Hemingway et al., Carbohydrate Polymers 38 (1999) 283-286)

Um exemplo é a hidrólise de um dos glucosídeos encontrados na uva – o neril-b-D-glucopiranosídeo, que leva à formação de uma molécula com um odor muito intenso, o nerol.

A hidrólise dos glucosídeos podem ocorrer em várias etapas do processo: na maturação da uva, durante a fermentação, no envelhecimento do vinho ou, ainda, durante o consumo: uma grande quantidade de glucosidases foram encontrados na saliva, derivadas da microflora da boca (Nakamura et al., J. Periodontal Res. 18 (1983) 559).

Mono-terpenos

Vários estudos sugerem que boa parte da expressão sensorial do bouquet do vinho se deve à presença de compostos terpenóides. Além disso, a relação entre as quantidades de cada terpeno em um vinho pode servir como pista para se descobrir a variedade da uva utilizada. Hoje, conhecem-se cerca de 50 monoterpenos que, comumente, aparecem nos vinhos. Os mais abundantes (principalmente para vinhos feitos com uvas Muscat) são o linalol, geraniol, nerol alfa-terpineol e citronelol. Os terpenos pertencem ao constituintes secundários das plantas, e sua bio-síntese começa com a acetil-coenzima A (CoA).

Estes compostos não sofrem alterações durante as fermentações no vinho: portanto eles são, de fato, uma assinatura de sabor ao vinho que vem da variedade de uva escolhida.

Alguns dos mais abundantes mono-terpenos no vinho

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Na uva, os terpenos estão principalmente nas cascas e, na maioria das vezes, ligados covalentemente a açúcares – como o caso do nerol, anteriormente visto.

Muitos terpenos, mesmo após findo todos os processos da fabricação do vinho, permanecem, ainda, ligados a estes açúcares. Nesta forma, os terpenos são inodoros e insípidos. Atualmente, vários pesquisadores do mundo inteiro estão estudando as etapas das hidrólises destes glucosídeos para passarem a controlar a liberação destes terpenos, no vinho, ao seu bel prazer.

Detalhes… importantes!

Nem só a qualidade da uva ou o controle no processo de fermentação pode ter influência sobre o sabor do vinho. Muitos outros detalhes são também extremamente importantes. Entre eles, a qualidade do barril onde ele é envelhecido e da rolha que tampa a garrafa.

A Rolha

Alguns vinhos perdem sua qualidade pela influência de uma rolha de má qualidade que pode estar contaminada por fungo, ou ressecada. Por este motivo, ainda que a rolha de cortiça (de boa qualidade) seja considera a parceira ideal das garrafas da nobre bebida, isolando completamente o líquido do oxigênio externo, sua substituição já é aceita por muitos. Várias são os estudos para o desenvolvimento de novos isolantes (materiais poliméricos são os mais empregados) para os vinhos.

Um em especial chama a atenção: o emprego de rolhas de cortiça tratadas com enzimas. Estes estudos foram desenvolvidos pela mega empresa no ramo de enzimas, a Novozymes, em colaboração com uma empresa alemã. Rolhas são impregnadas com Subarase, uma fenol-oxidase, evitando assim a oxidação dos compostos fenólicos presentes no vinho.

Cerca de U$ 10 bilhões são perdidos, anualmente, devido a contaminação do vinho com substâncias provindas da rolha. Até 5% das garrafas sofrem este mal.

Dentre os compostos mais frequentementes associados ao “mal da rolha”, encontra-se o 2,4,6-tricloroanisol (TCA). Em um artigo publicado em 1989, Amon e seus colegas da Nova Zelândia analisaram centenas de amostras diferentes de vinhos e encontraram pequenas quantidades de TCA em 62% das garrafas (J.M.Amon et al. New Zealand Wine Indust. J. 4 (1989) 62). O TCA é introduzido nos vinhos por defeitos no fechamento da rolha. Os humanos são capazes de detectar a presença de TCA mesmo em concentrações da faixa de 2 ng/ml! Algumas empresas já estudam a substituição da famosa rolha de cortiça por protótipos de polímero – tal como o teflon. Porém, enófilos tradicionais discordam deste artifício.

O Barril

Todos sabem que os melhores vinhos são aqueles envelhecidos em barris de carvalho. Esta é uma evidência empírica – o vinho torna-se, de fato, mais “saboroso”.
Mas qual é, de fato, a contribuição do barril para o sabor do vinho?

Química do Vinho

Esta dúvida também atingiu alguns químicos, que encontraram a resposta. Vários componentes do carvalho são extraídos, pelo vinho, durante o envelhecimento. Entre eles, os isômeros cis- das “oak lactonas”, tal como o 4S,5S-5-butil-4-metil-4,5-di-hidro-2(3H)-furanona. Estes compostos conferem ao vinho um incremento nas tonalidades “coco”, “baunilha” e “chocolate” de seu sabor. O interessante é que a adição, proposital, de isômeros trans- destes compostos diminui a qualidade palatativa do vinho.

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castalagina: R1=H R2=OH
vescalagina: R1=OH R2=H

Entretanto, o barril também pode influenciar negativamente no sabor do vinho. Muitas vezes, a madeira com a qual o barril é feito, foi previamente tratada com compostos como ésteres de hexa-hidroxidifenoilas (HHDP), na intenção de protegê-la contra o ataque de fungos ou bactérias. Estes compostos conferem um sabor adstringente ao vinho, diminuindo a sua qualidade. Os dois HHDP mais abundantes são a vescalagina e a castalagina. Ambos são encontrados em muitos vinhos envelhecidos em barris de madeira. Por isso, muitas vinícolas preferem não arriscar e utilizam tanques de aço inoxidável.

“Agora que a velhice começa preciso aprender com o vinho a melhorar envelhecendo, e sobretudo, escapar do perigo terrível de envelhecendo virar vinagre.” DOM HELDER CÂMARA

VINHO BEBIDA SAGRADA

A palavra “vinho” aparece centenas de vezes no livro sagrado.

Os grandes reis, os grandes profetas e até mesmo o filho de Deus eram consumidores de vinho: mesmo em sua última refeição, Jesus não deixou o vinho faltar.

Dois episódios podem servir como exemplo: a primeira menção do vinho na Bíblia e o primeiro milagre de Jesus:

Noé bebum (a primeira aparição da palavra vinho) Gênesis, 9 20-21

“Sendo Noé lavrador, passou a plantar uma vinha. Bebendo do vinho, embriagou-se e pôs-se nu dentro de sua tenda”

Água em vinho (primeiro milagre) João, 2 1-12

“(…)houve um casamento em Caná e ali estava a mãe de Jesus. Jesus também foi convidado, com seus discípulos. Tendo acabado o vinho, a mãe de Jesus lhe disse;’Eles não têm mais vinho!’. (…)Jesus lhes disse: ‘Enchei de água os seis jarros’, e os seventes as encheram. Então, Jesus determinou: ‘Tirai agora e levai ao mestre-sala’. Tendo o mestre-sala tomado a água transformada em vinho, chamou o noivo e lhe disse: ‘Todos costumam pôr primeiro o bom vinho e, quando já beberam fartamente, servem o inferior; tu, porém, guardaste o bom vinho até agora”

Sábios provérbios

Provérbios

20,1 “O vinho é escarnecedor, é a bebida forte, alvoroçadora”

23,29 “E para quem as feridas sem causas, os olhos vermelhos? Para os que se demoram em beber vinho, para os que andam buscando bebida misturada” 

Datar cronologicamente a história desta paixão entre homem e vinho não é fácil. Alguns historiadores supõem que o homem conheceu o vinho antes de aprender a cultivar as uvas, possivelmente desde que o gênero Vitis, que compreende todas as vinhas domésticas fez seu aparecimento na era Terciária. Entre as formações da era Terciária, encontram-se quarenta variedades de Vitis, e uma cepa fóssil de mais de cinqüenta milhões de anos. Arqueologistas aceitam acúmulo de sementes de uva como evidência de elaboração de vinhos. Escavações em Catal Hüyük na Turquia, em Damasco na Síria, Byblos no Líbano e na Jordânia revelaram sementes de uvas da Idade da Pedra (Período Neolítico B), cerca de 8000 a.C. As mais antigas sementes de uvas cultivadas foram descobertas na Georgia (Rússia) e datam de 7000 – 5000 a.C. (datadas por marcação de carbono).

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Entre fatos históricos e cientificamente comprovados, também não faltam lendas sobre o vinho. A mais citada de todas as lendas sobre a descoberta do vinho é uma versão persa que fala sobre Jamshid , um rei persa semi-mitológico que parece estar relacionado a Noé, pois teria construído um grande muro para salvar os animais do dilúvio. Na corte de Jamshid, as uvas eram mantidas em jarras para serem comidas fora da estação. Certa vez, uma das jarras estava cheia de suco e as uvas espumavam e exalavam um cheiro estranho sendo deixadas de lado por serem inapropriadas para comer. Eram consideradas possível veneno. Uma donzela do harém tentou se matar ingerindo o possível veneno. Ao invés da morte ela encontrou alegria e um repousante sono. Ela narrou o ocorrido ao rei que ordenou, então, que uma grande quantidade de vinho fosse feita e Jamshid e sua corte beberam da nova bebida.

“Por mais raro que seja, ou mais antigo,
Só um vinho é deveras excelente
Aquele que tu bebes, docemente,
Com teu mais velho e silencioso amigo.”

Mário Quintana

Poderia-se discorrer longamente sobre os fatos históricos que demarcam a estreita relação entre a cronologia humana e a elaboração de vinhos.

Mas de certo, é que e vinho não teve que esperar para ser inventado: ele estava lá, onde quer que uvas fossem colhidas e armazenadas em um recipiente que pudesse reter seu suco.

“O Vinho é suco de uva fermentado”, mas não se engane com a simplicidade que esta afirmação pode transferir para uma garrafa de vinho. Fosse somente isto e não se justificaria a paixão por tantos declarados a este líquido. O Vinho é único porque assim como as pessoas, não existem dois iguais.

Da mesma forma como eram declarados os quatro recursos da ciência e da natureza (fogo, água, ar e terra), o vinho também é produto de quatro elementos fundamentais:

O Terroir (pronuncia-se terruar) – ou o local, solo, relevo onde a uva é cultivada
A Safra – ou o conjunto de condições climáticas enfrentadas pela videira
A Cepa – ou a herança genética, a variedade de uva

E enfim, o Homem – que cultivou e colheu as uvas, supervisionou a fermentação e demais etapas até o engarrafamento do vinho.

A pessoa responsável pelo processo de “fabricação do vinho”, vinificação, é denominada de enólogo, e este é um profissional da química (está lá no rótulo o CRQ do enólogo responsável). A Química, como se vê, também está no Vinho.

Fonte: www.qmc.ufsc.br

Química do Vinho

A QUÍMICA DOCE” DO VINHO

A definição enológica e legal designa o vinho como um produto natural obtido exclusivamente pela fermentação alcoólica, total ou parcial, de uvas frescas ou do mosto de uvas frescas.

O vinho é, desde tempos longínquos, um elemento fundamental da cultura gastronómica. Era já um hábito alimentar entre os sicilianos, no ano 2000 a.C., assim como dos Egípcios.

Na Ilíada e na Odisseia, Homero cita sempre o vinho nos banquetes dos seus heróis. Os Romanos iriam transportar consigo a técnica da cultura da vinha durante a expansão do seu império. No século III d.C. as zonas vinícolas da Europa (Vitis Vinífera) eram sensivelmente as mesmas de hoje.

O vinho existe, portanto, há muito mais tempo do que a Química considerada como ciência moderna.

A Química do vinho é extremamente complexa e ainda hoje não é totalmente conhecida. Os avanços tecnológicos desta ciência permitiram progressos gigantescos na compreensão dos processos naturais que se produzem no interior do vinho.

No início do século XX apenas eram conhecidos pouco mais de meia dúzia de compostos químicos constituintes do vinho, nos anos 40 cerca de 50 e, atualmente, já foram identificados mais de 600. A presença de tão grande quantidade de compostos químicos no vinho aliada à sua grande diversidade ilustra, sem margem para dúvidas, o seu elevado grau de complexidade.

Os constituintes do vinho podem ser agrupados segundo a perspectiva da sua contribuição para os fatores organolépticos (sabor). Em muitos casos verifica-se uma correspondência direta entre as características sensoriais do vinho e os compostos químicos que lhe dão origem. Outras vezes, um mesmo composto ou família de compostos influi sobre aspectos diversos e totalmente distintos do ponto de vista da análise sensorial.

Assim podem ser considerados seis grupos principais de compostos, nomeadamente, do paladar doce, do paladar ácido, do paladar salgado, da cor, da nutrição e do aroma.

O paladar doce está cargo de compostos como açúcares, álcoois e poliois. Os açúcares são produtos da fotossíntese nas folhas da videira e existem naturalmente nos mostos e nos vinhos.

Dividem-se em dois grupos:

Açúcares simples ou açúcares redutores: Hexoses e Pentoses.

Açúcares complexos: Sacarose e Amido.

Qualitativamente as hexoses são os constituintes mais importantes pois são estes açúcares que se transformam em álcool (etanol), por ação fermentativa das leveduras durante o processo de vinificação, determinando decisivamente o teor alcoólico dos vinhos obtidos. As pentoses não são fermentáveis pelas leveduras daí os vinhos conterem sempre quantidades apreciáveis destes açúcares.

Os açúcares complexos como a sacarose e amido são substâncias de reserva glúcida e não abundam na uva. A presença de sacarose num vinho evidencia que este sofreu uma Chaptalizalçãosou aumento do grau alcoólico, por adição do referido açúcar. Refira-se que, em Portugal, este procedimento não é autorizado e que a detecção deste açúcar num vinho revela de forma segura um enriquecimento fraudulento.

Os principais objetivos do doseamento dos açúcares redutores nas uvas, nos mostos e nos vinhos são:

Avaliar o tempo óptimo de vindima: O doseamento dos açúcares nas uvas permite acompanhar a sua maturação e estabelecer a data provável para a sua colheita.

Determinar o potencial grau alcoólico do vinho: O doseamento dos açúcares do mosto permite determinar o grau alcoólico latente e prever o seu enriquecimento, caso seja necessário e legal.

Seguir e detectar o terminus da fermentação alcoólica: Considera-se que esta se completa quando o conteúdo em açúcares redutores é inferior a 2 gramas por litro.

Controlar o açúcar residual no vinho visando a eliminação do fenómeno de refermentação e, consequentemente, problemas de turvação.

Classificar os vinhos e os vinhos espumantes de acordo com a correspondência apresentada na tabela seguinte:

CLASSIFICAÇÃO QUANTIDADE DE AÇÚCARES REDUTORES (gramas/litro)
VINHO
SECO

= 4

SEMI SECO

= 12

SEMI DOCE

12 – 45

DOCE

= 45

VINHO ESPUMANTE
EXTRA BRUT

0 – 6

BRUT

= 15

EXTRA SECO

12 – 20

SECO

17 – 35

SEMI SECO

33 – 50

DOCE

> 50

O doseamento dos açúcares redutores do vinho é efetuado por recurso a uma técnica de análise química, relativamente simples, designada por titulação redox.

É de salientar que os alunos da licenciatura em Química da Universidade de Évora têm a possibilidade determinar o teor de açúcares redutores em amostras de vinho caseiro e comercial.

GLOSSÁRIO DE TERMOS VINÍCOLAS

Enologia – Conjunto das ciências e técnicas ligadas à produção, análise e melhoramento do vinho. Estuda todos os processos de transformação das uvas em vinho.

Fermentação Alcoólica – Processo microbiológico através do qual as leveduras (seres vivos unicelulares) obtêm a sua energia vital, por transformação do açúcar disponível em álcool, nomeadamente, etanol.

A transformação dos açúcares em etanol faz-se através de uma série complexa de mais de 30 reações químicas sucessivas, cada uma das quais é catalisada por um enzima específico fazendo parte da ferramenta biológica das leveduras. Cada uma destas reações também produz outros produtos secundários cuja concentração é extremamente baixa quando comparada com a do etanol.

Mosto – Sumo da uva que se obtém por esmagamento das uvas. Após a fermentação alcoólica o mosto transforma-se em vinho.

Vitis Vinifera – Nome genérico da vide Europeia (independentemente da casta). Os outros tipos de vide que não pertencem à Vitis Vinifera são híbridos e designam-se por americano.

Vinificação – Conjunto de operações necessárias para transformar as uvas em vinho.

Chaptalização – Processo de adição de açúcar ao mosto para aumentar o grau alcoólico do vinho. Este processo é autorizado por lei em alguns países, mas é proibido em Portugal.

Maturação – Período de amadurecimento das uvas, dura cerca de 45 dias. Durante este período a acidez vai baixando à medida que aumentam os teores de açúcar das uvas.

Teor alcoólico em volume ou grau alcoólico volumétrico, % vol – Volume de etanol (álcool etílico), em litros, contido em 100 litros desse vinho. Estes dois volumes são medidos à temperatura de 20ºC.

Cristina Galacho

BIBLIOGRAFIA

C. Galacho, “Doseamento dos açucares redutores no vinho por titulação redox – Iodometria” Provas de aptidão pedagógica apresentadas na Universidade de Évora, Évora, 1998
A. S. Curvelo-Garcia, “Controlo de Qualidade dos Vinhos: Química Enológica e Métodos Analíticos”, Instituto da Vinha e do Vinho, 1988
Norma Portuguesa, NP 2223/1988
Regulamentos da CEE 997/81 e 2333/92
J. P. Alpuim, “Aprendendo a Química do Vinho”, Boletim da Sociedade Portuguesa de Química, 65 (1997) 13-27
C. Navarre, “Enologia – Técnicas de Produção de Vinho”, Publicações Europa América, Lda., Lisboa, Abril 1997.
D. Delanoe, C. Maillard e D. Maisondieu, ” O Vinho – Da Análise à Elaboração”, Publicações Europa América, Lda., Lisboa.
Emile Peynaud, “Conhecer e Trabalhar o Vinho”, LTC Editora Portuguesa de Livros Técnicos e Científicos, Lisboa, 1982

Fonte: home.uevora.pt

Química do Vinho

A COMPOSIÇÃO DO VINHO

De acordo com Ough (1992), a sua composição depende de muitos fatores, sendo os mais importantes, a composição da uva, pelo cuidado nos processos de fermentação, condições de armazenamento e transporte, e estes ainda vão além das funções do elaborador.

Peynaud (1982), diz que a composição e evolução estão diretamente ligadas a fenômenos bioquímicos, esta definição permite compreender a extrema complexidade da sua composição e também o interesse pelo seu estudo, devido à grande diversidade de matérias abordadas.

Define também o valor alimentar do vinho: proveniente de células vivas, embora em estado diluído, contém tudo o que é necessário à vida.

De acordo com Peynaud (1982), um dos papéis da enologia é o estudo da composição do vinho de uma forma tão completa quanto possível. O profissional deve conhecer bem esta composição, se quiser compreender os fenômenos que intervêm no decurso da maturação das uvas, da elaboração dos vinhos, da sua conservação, e dos seus tratamentos.

Lona (1997), conceitua degustação como “um conjunto de mecanismos de estímulos, e que interessando os estímulos do homem dá como origem a diferentes sensações. Os seus reconhecimentos e interpretações dão origem à percepção”.

Para se alcançar de forma satisfatória a degustação de um vinho, alguns sentidos devem ser alcançados pelo pessoal responsável pela degustação, utilizando os órgãos dos sentidos, que através dos receptores neurosensoriais se tornam responsáveis.

Estímulo: será induzido pelas substãncias com cor, aroma e sabor

Sensações: estas são subjetivas, e resultantes do estímulo dos receptores

Percepção: é objetiva e consiste na tomada de consciência sensorial. É a interpretação e o reconhecimento das sensações visuais, odoríferas ou de sabor.

Segundo Lona (1997), o conjunto destes três sentidos, para serem bem utilizados, devem possuir uma consciência, experiência e memória, pois de vinhopara vinho, as diferenças podem ser muito grandes ou mínimas. Portanto necessitando de pessoas aptas e treinadas para tal situação.

Segundo Aquarone (1983), as principais substâncias que constituem o vinho são: açúcares, álcoois, ácidos orgânicos, sais, ácidos minerais e orgânicos, compostos fenólicos, compostos nitrogenados, pectinas, gomas e mucilagens, compostos voláteis e aromáticos. Logo abaixo serão relatadas algumas destas substâncias.

AÇÚCARES

O teor de açúcar da uva varia de 15% a 30% em função de vários fatores, tais como o estágio de maturação, o clima, o solo e a variedade da uva. Os açúcares da uva são constituídos quase que exclusivamente de glicose e frutose em proporções sensivelmente iguais no momento da maturação (Peynaud,1982 e Aquarone, 1983).

Os vinhos fermentados completamente sempre apresentam uma fração de grama de frutose e um pouco de glicose; nos vinhos tintos, a glicose provém, também, da hidrólise de certos glicosídios durante a conservação (Aquarone, 1983).

Segundo Peynaud (1982), a uva contem apenas alguns vestígios de sacarose, que desaparecem durante a fermentação. O vinho não pode, portanto conter este açúcar a menos que lhe seja adicionado. A presença de sacarose num vinho revela de forma segura um enriquecimento fraudulento. A fruta, a uva, ainda contem uma pequena quantidade de açúcares não fermentáveis, e que é constituída pelas pentoses. O seu componente principal é a arabinose; a xilose pode também estar presente.

Por causa destes açúcares e de outras substãncias capazes de reduzir os reativos dos açúcares, nunca se encontra o zero na dosagem dos açúcares redutores de um vinho seco e os conteúdos normais situam-se entre 1 e 2 gramas por litro (Peynaud, (1983).

ÁLCOOIS

O álcool etílico é o constituinte mais importante do vinho após a água, que representa cerca de 85% a 90%. Admitindo-se que o grau alcoólico dos vinhos varia entre 9° GL e 15°GL, o álcool etílico representa de 72 a 120g/L (Aquarone, 1983).

De acordo com Aquarone (1983), e Peynaud (1982), a glicerina é um álcool com três funções álcoois. Seu sabor adocicado, quase igual ao da glicose, contribui para maciez do vinho, mas não constitui o fator principal.

Ela é depois do álcool, o componente mais importante: 5 a 10 g por litro É um produto da fermentação alcoólica. Representa normalmente a décima ou a décima quinta parte do peso do álcool. Forma-se, sobretudo no princípio da fermentação, a partir das primeiras 50 g de açúcar fermentado.

A sua proporção depende da taxa inicial dos açúcares, e da espécie das leveduras, das condições de fermentação: temperatura, arejamento, acidez, adição do ácido sulfuroso, entre outros.

De acordo com Amerine (1976), os vinhos contêm junto com o etanol, um certo número de outros mono e poliálcoois (ao qual a glicerina se enquadra). Tais substãncias se encontram originalmente na uva e se formam no vinho durante a fermentação. Elas se formam diretamente dos hidratos de carbono por ação de leveduras. A sua participação é afetada pela concentração de açúcar, temperatura de fermentação, pH e quantidade de oxigênio presente.

De acordo com Aquarone (1983), o metanol está normalmente presente no vinho. É um álcool provindo da hidrólise da pectina. Seu teor varia de 0 a 635 mg/L, com a média de 100mg/L.

Alguns fatores contribuem para o aumento do metanol do vinho, tais como: a adição da enzima pectinolítica ao mosto; vinhos obtidos por fermentação em tinto com casca; e vinhos obtidos por maceração prolongada de cascas de uvas.

ÁCIDOS ORGÂNICOS

Os principais ácidos orgânicos de vinho são, segundo Aquarone, (1983):

Os provenientes da uva: tartárico, málico e cítrico;

Os provenientes da fermentação: succínico, lático e acético.

Existem outros ácidos orgânicos em pequenas quantidades: galacturônico, glucurônico, glucônico, citramático, dimetilglicérico, pirúvico, cetoglutário, entre outros (Aquarone, 1983).

Ainda seguindo os conceitos de Aquarone (1983), a acidez fixa no vinho é basicamente formada dos seguintes ácidos: taratárico, málico, lático, succínico e cítrico.

Abaixo segue uma breve descrição dos principais ácidos orgânicos, presentes no vinho:

Ácido tartárico

Sua concentração diminui por precipitação sob forma de cristais de bitartarato de potássio e tartarato de cálcio (cremor tártaro), ocasionado pelo aumento em álcool e abaixamento da temperatura.No vinho, o teor de ácido tartárico é duas vezes ou três vezes menor que no mosto original (Aquarone, 1983).

De acordo com Peynaud (1982), este é o ácido específico da uva e do vinho; nas regiões de temperadas encontra-se raramente na natureza, a não ser na videira.

A sua concentração diminui pela preciptação sob a forma de cristais de bitartarato de potássio e de tartarato neutro de cálcio, provocada pelo enriquecimento em álcool e o abaixamento da temperatura.

Ácido málico

Aquarone (1983) nos diz que a fermentação malolática constitui uma melhora considerável do vinho, que o torna notadamente macio e elimina a característica ácida do vinho novo ou de vinho excessivamente ácido.

Peynaud (1982), relata que é um dos ácidos mais distribuídos no reino vegetal; encontra-se nas folhas e nos frutos. O ácido málico, é fermentado na sua totalidade por bactérias lácticas que o transformam em ácido lático e gás carbônico. Este última separa-se e a acidez total do vinho diminui assim de metade do ácido málico fermentado. Este fenômeno chama-se fermentação malolática.

Ácido cítrico

Aquarone (1983) comenta que o ácido cítrico é pouco abundante na uva – cerca de 150 a 300 mg/L. Ele é transformado durante a maturação em ácido málico e ainda fermentado pelas bactérias láticas, e desaparece no vinho. Esse ácido é utilizado para o tratamento do vinho, pois apresenta a propriedade de solubilizar o ferro.

Peynaud (1982) relata que seu emprego é autorizado em doses limitadas, segundo os países e as necessidades de acidificação. O seu emprego nos vinhos tintos jovens é desaconselhável por causa da sua fraca estabilidade bacteriana e do aumento de acidez volátil que a sua fermentação lática provoca.

Ácido succínico

Este ácido é produzido na fermentação alcoólica. Seu teor no vinho é de 0,5 a 1,5 g/litro. Trata-se de ácido bastante estável em relação às fermentações bacterianas. Apresenta um papel importante sobre o gosto. Seu sabor é uma mistura de gostos ácidos, salgado e amargo de acordo com Aquarone (1983).

Ácido lático

Este ácido é produzido unicamente pela fermentação e é um dos componentes normais do vinho. Aquarone (1983) ainda diz que é abundante nos vinhos com anomalia ou doente, mas sua presença não constitui, necessariamente, um sinal de alteração microbiana.

A formação ocorre durante a fermentação alcoólica dos açúcares. Numa fermentação alcoólica sadia ou normal, pode produzir de 0,2 a 0,4 g/L (Peynaud, 1982).

O ácido lático pode ter três origens segundo Aquarone (1983):

Mediante a fermentação malolática pelas bactérias em função da transformação do ácido málico. Em vinho que tenha realizado a fermentação malolática é encontrado de 0,1 a 3,0 g/L;

Nos vinhos alterados, sua formação se dá pela fermentação láctica de açúcares, de glicerina, de ácido tartárico e de outros constituintes de vinho. Neste caso, seu teor pode eleva-se a alguns gramas

Tem sua origem na fermentação, e não é existente como componente normal dos vinhos, sendo mais abundante nos vinhos doentes, onde a sua presença não é necessariamente um sinal de alteração (Peynaud, 1982).

Ácido acético

Seguindo Aquarone (1983), o ácido acético é o principal componente da acidez volátil do vinho. Ao destilar o vinho, o ácido se volatiliza e é recolhido no condensado, o que não acontece com os ácidos fixos (málico, láctico e succínico). Este se encontra no vinho sadio em teor ao redor de 0,48 g/L. Sua formação se dá pelas mesmas vias do ácido lático e pelas bactérias acéticas.

Ele possui as mesmas vias de formação que o ácido láctico, acrescido da via das bactérias acéticas. A alteração do gosto pelo ácido acético, percebe-se pela dureza, e características de amargor no final. O cheiro a picante é uma característica devida não ao ácido acético, mas sim ao acetato de etila. (Peynaud, 1982).

SAIS

Aquarone (1983), relata que o vinho contém de 2 a 4 g/litro de sais de ácidos orgânicos e minerais. A cinza do vinho, resultante da incineração de extrato, representa-os imediatamente.

Os principais constituintes de sais do vinho são, os abaixo citados de acordo com Aquarone (1983):

Ânions minerais (fosfato, sulfato, cloreto, sulfito) e orgânicos (tartarato, malato, lactato)

Cátions: K, Na, Mg, Ca, Fé, Al, Cu. Ainda existem oligoelementos, tais como: F, Si, I, Br, Zn, Mn, Pb, Co, Cr, Ni, etc.

SUBSTÂNCIAS DE GOSTO AÇUCARADO

As substãncias açucaradas do vinho pertencem a três grupos, segundo Peynaud, (1982):

Os açúcares propriamente ditos, existentes na uva e que em parte não fermentam nos vinhos brancos doces, mas que também estão presentes embora em doses fracas nos vinhos brancos secos e nos vinhos tintos

Os álcoois igualmente proveniente das uvas, e que se apresentam em algumas centenas de mg por litro de mosto, e se encontram nos vinhos em doses diferentes devido à fermentação

As substâncias que têm uma ou mais funções alcoólicas, formadas pela fermentação alcoólica.

SUBSTÂNCIAS DE GOSTO SALGADO

São os sais de ácidos minerais e de alguns ácidos orgânicos. As cinzas do vinho, resultado da incineração do extrato, representam aproximadamente., em cada litro de vinho existe aproximadamente 1g de potássio, 100 mg de magnésio e de cálcio (Peynaud, 1982).

Os principais componentes dos sais do vinho são divididos em duas classes:

Minerais: Fosfato, sulfato, clorato, sulfito, potássio, sódio, magnésio e cálcio.

Orgânicos: Lactato, tartarato, malato, Málico, ferro, alumínio, cobre,…

Substâncias de gosto amargo e adstringente

São compostos fenólicos e que fornecem e dão aos vinhos a sua cor e uma grande parte do seu sabor. Possuem a propriedade de coagular as proteínas e intervêm na clarificação dos vinhos por colagem, sendo que alguns deles influem nas qualidades alimentares, especialmente dos vinhos tintos pela sua riqueza em vitamina P e do seu poder bactericida (Peynaud, 1982).

Fonte: professor.ucg.br

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