Lima Barreto
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Os conselhos municipais de São Paulo e Belo Horizonte acabam de legislar sobre a obrigatoriedade de serem redigidas em língua vernácula as inscrições de placas, tabuletas, emblemas, rótulos ou denominações de casas comerciais, de diversões, etc.
Os nossos jornais, os daqui, pedem que, à vista de semelhante exemplo, o nosso conselho faça o mesmo e vá até o ponto de exigir que tais emblemas, etc, quando não sejam estritamente sintáticos ou tenham erros ortográficos, mereçam multas e outras punições.
Não há dúvida que a medida merece louvores, mas a nossa língua é tão indisciplinada, que não sei bem como os agentes e guardas fiscais se vão haver para executar a postura.
Supondo mesmo que eles tenham instrução para corrigir ou julgar dos erros das tabuletas, é bem de ver que, à vista dos casos controversos, no que toca ao nosso idioma, eles se vejam em palpos de aranha, para resolver certos casos.
Por exemplo: a Light põe “Larangeiras” com g , mas há quem admita que “Laranjeiras” se deve escrever com “j”. Se a gente for dessa última opinião, pode multar a companhia canadense?
Outra coisa: um ferrador põe na placa o seguinte letreiro: “Ferra-se burros”. Está certo? Está errado? Para uns está, para outros não. Como se há de resolver a multa?
O projeto chama uma comissão de gramáticos e esta é uma espécie de gente que não se entende.
Mas ainda: uma casa de modas escreve na tabuleta: “modas e confecções”. Todos sabem que esta última palavra é um crasso galicismo, mas por ser crasso é que é usual.
Como há de ser imposta a multa? Nova comissão de gramáticos e grossa descompostura, entre todos os especialistas no gênero.
Estou a ver uma barulharia infernal só por causa de uma inovante postura municipal.
Careta, Rio, 9-10-1915
Fonte: pt.wikisource.org
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