Redondilhas de Luís Vaz de Camões
Trovas
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a üa Dama
Dama d’estranho primor,
se vos for
pesada minha firmeza,
olhai não me deis tristeza,
porque a converto em amor.
Se cuidais de
me matar quando usais
de esquivança,
irei tomar por vingança
amar-vos cada vez mais.
Porém vosso pensamento,
como isento,
seguirá sua tenção
crendo que em tanta afeição
não haja acrescentamento.
Não creiais
que destarte vos façais
invencível;
que Amor sobre o impossível
amostra que pode mais.
Mas já da tenção que sigo
me desdigo;
que, se há tanto poder nele
também vós podeis mais qu’ele
neste mal que usais comigo.
Mas se for
o vosso poder maior
entre nós,
quem poderá mais que vós
se vós podeis mais que Amor?
Despois que, Dama, vos vi,
entendi
que perdera Amor seu preço;
pois o favor que lhe eu peço
vos pede ele para si.
Nem duvido
que não pode, de sentido,
resistir;
pois, em vez de vos ferir,
ficou, de vos ver,
ferido.
Mas, pois vossa vista e tal
em meu mal,
que posso de vós querer?
Que mal poderei valer
onde o mesmo Amor não val?
Se atentar,
nenhum bem posso esperar;
e oxalá
Que vos
alembrasse já,
sequer para me matar.
Mas nem com isto creiais
que façais
meus serviços mais pequenos;
porqu’eu, quando espero menos,
sabei que então quero mais.
Nada espero,
mas de mim crede este fero
que, em ser vosso,
vos quero tudo o que posso
e não posso quanto quero.
Só por esta fantasia
merecia
de meus males algum fruito;
que ainda não quero muito
para o muito que queria.
De maneira
que não é, na derradeira,
grande espanto,
que quem, Dama, vos quer tanto
que outro tanto de vós queira.
Fonte: www.bibvirt.futuro.usp.br
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