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Voltaire
Apresentação
Selecionamos, aqui, quatro contos em que Voltaire discute questões
fundamentais do conhecimento e comportamento humanos, com a sua habitual profundidade
filosófica. Como sempre, as críticas severas, a ironia e o sarcasmo
estão presentes. Costumes, crenças, autoridades são todos
ridicularizados.
“Memnon” relata a história de um homem que teve a ousadia
de se tornar perfeito. Voltaire, com todo o seu sarcasmo, demonstra o quão
insensata é essa tentativa.
“Os Dois Consolados” é um pequeno apólogo, onde
o autor mostra como se é possível ficar consolado dos problemas
da vida, analisando-se as dores ainda maiores de outros. Sem dúvida,
extremamente irônico.
Em “História das Viagens de Scarmentado” o herói
viaja por inúmeros países, mostrando que os homens são
os mesmos em todos os cantos da terra.
“História de um Brâmane” (1759), se desenvolve
explorando contrastes com que Voltaire consegue desmoralizar a especulação
metafísica. O brâmane é um dos personagens preferidos
do autor, presente em quase todas as suas obras.
São textos que merecem ser lidos, nos ensinam, fazem-nos pensar e,
principalmente, sorrir.
Nélson Jahr Garcia
MEMNON OU A SABEDORIA HUMANA
Memnon concebeu um dia o insensato projeto de ser perfeitamente sábio.
Não há homem a quem essa loucura não tenha ocorrido alguma
vez.
“Para ser bastante sábio, e por conseguinte bastante feliz,
– considerou Memnon, – basta não ter paixões; e
nada é mais fácil, como se sabe. Antes de tudo, jamais amarei
mulher nenhuma: pois, ao ver uma beleza perfeita, direi comigo mesmo: “Essas
faces se enrugarão um dia; esses belos olhos se debruarão de
vermelho; esses rijos seios se tornarão flácidos e pendentes;
essa linda cabeça perderá os cabelos”. É só
olhá-la agora com os olhos com que a verei então, e essa cabeça
não há de virar a minha.
Em segundo lugar, serei sóbrio. Por mais que seja tentado pela boa
mesa, os vinhos deliciosos, a sedução da sociedade, bastará
imaginar as conseqüências dos excessos, a cabeça pesada,
o estômago arruinado, a perda da razão, da saúde e do
tempo: apenas comerei por necessidade; minha saúde será sempre
igual, minhas idéias sempre puras e luminosas. Tudo isso é tão
fácil que não há nenhum mérito em consegui-lo.
“Depois” – dizia Memnon, – “devo pensar um
pouco na minha fortuna. Meus desejos são moderados; meus bens estão
solidamente colocados em mãos do recebedor geral das finanças
de Nínive; tenho com que viver independentemente; é esse o maior
dos bens. Nunca me verei na cruel necessidade de freqüentar a Corte:
não invejarei ninguém, e ninguém me invejará.
Eis o que é também bastante fácil. Tenho amigos –
continuava ele – e hei de conservá-los, pois nada terão
que me disputar. Nunca me indisporei com eles, nem eles comigo. Isso não
tem dificuldade alguma”.
Tendo assim feito no interior do quarto o seu pequeno plano de sabedoria,
Memnon pôs a cabeça à janela. Viu duas mulheres que passeavam
debaixo dos plátanos, perto da sua casa. Uma era velha e não
aparentava pensar em nada. A outra era jovem, bonita, e parecia muito preocupada.
Suspirava, chorava, e com isso não fazia mais que aumentar as suas
graças. O nosso filósofo sentiu-se impressionado, não
com a beleza da dama (estava seguro de não se entregar a tais fraquezas),
mas com a aflição em que a via. Desceu à rua e abordou
a jovem, com a intenção de consolá-la sabiamente. A linda
criatura contou-lhe, com o ar mais ingênuo e comovente do mundo, todo
o mal que lhe causava um tio que ela não tinha; com que artimanhas
lhe roubara ele uns bens que ela jamais possuíra; e tudo o que tinha
a temer da sua violência. “O senhor me parece um homem tão
avisado – lhe disse ela, – que, se tivesse a bondade de acompanhar-me
até em casa e examinar meus negócios, estou certa de que me
tiraria do cruel embaraço em que me encontro”. Memnon não
hesitou em segui-la para examinar sabiamente os seus negócios e dar-lhe
um bom conselho.
A dama aflita levou-o para um salão perfumado e fê-lo sentar-se
polidamente num largo sofá, onde se mantinham ambos, com as pernas
cruzadas, um defrontando o outro. A dama falou baixando os olhos, de onde
escapavam lágrimas de vez em quando e que, ao erguerem-se, cruzavam
sempre com os olhares do sábio Memnon. As frases dela eram cheias de
um enternecimento que redobrava sempre que os dois se olhavam. Memnon tomava
os seus negócios extremamente a peito, e de momento a momento sentia
maior desejo de socorrer a uma criatura tão honesta e tão desgraçada.
No calor da conversação, deixaram insensivelmente, de estar
um defronte ao outro. As suas pernas descruzaram-se. Memnon aconselhou-a de
tão perto, deu-lhe conselhos tão ternos, que nenhum dos dois
podia falar de negócios, e não sabiam mais onde se achavam.
E, como se achassem em tal ponto, eis que chega o tio, como era de prever;
estava armado da cabeça aos pés; e a primeira coisa que disse
foi que ia matar, como de razão, o sábio Memnon e a sobrinha;
a última que lhe escapou foi que ainda poderia perdoar aquilo tudo
mediante considerável quantia. Memnon foi obrigado a entregar tudo
o que tinha consigo. Davam-se por muito felizes, naquele tempo, em livrar-se
tão modicamente; a América ainda não tinha sido descoberta
e as damas aflitas não eram tão perigosas como hoje.
Memnon, envergonhado e desesperado, voltou para casa: encontrou um bilhete
que o convidava para jantar com alguns amigos íntimos. “Se fico
sozinho em casa – considerava ele, – terei o espírito preocupado
com a minha triste aventura, não poderei comer, e acabo adoecendo.
E melhor ir fazer, com meus íntimos, uma refeiçãozinha
frugal. Esquecerei, na doçura do seu convívio, a tolice que
fiz esta manhã”. Comparece à reunião; acham-no
um pouco taciturno. Obrigam-no a beber para dissipar a tristeza. Um pouco
de vinho tomado com moderação é um remédio para
a alma e o corpo. E assim que pensa o sábio Memnon; e embebeda-se.
Depois propõem-lhe uma partida. Um joguinho entre amigos é um
passatempo honesto. Ele joga; ganham-lhe tudo o que tem na bolsa, e quatro
vezes mais sob palavra. No meio do jogo surge uma disputa; exaltam-se os ânimos:
um de seus amigos íntimos lança-lhe à cara um copo de
dados e lhe vasa um olho. Carregam para casa o sábio Memnon, embriagado,
sem dinheiro, e com um olho de menos.
Cozinha um pouco o seu vinho; e, logo que se vê com a cabeça
mais livre, manda o criado conseguir dinheiro com o recebedor geral das finanças
de Nínive, a fim de pagar seus íntimos amigos: dizem-lhe que
seu credor, pela manhã, abrira falência fraudulenta, deixando
cem famílias em pânico. Memnon, consternado, dirige-se à
Corte, com um emplastro no olho e um memorial na mão, para pedir justiça
ao rei contra o bancarroteiro. Encontra num salão várias damas
que usavam todas, comodamente, umas saias de vinte e quatro pés de
circunferência. Uma delas, que o conhecia um pouco, exclamou, olhando-o
de soslaio: “Ai, que horror!” Outra, que o conhecia mais, lhe
disse: “Boa tarde, senhor Memnon. Verdadeiramente encantada de vê-lo,
senhor Memnon. A propósito, senhor Memnon: como foi que perdeu um olho?”
E passou adiante sem esperar resposta. Memnon ocultou-se a um canto, aguardando
o momento em que se pudesse lançar aos pés do rei. Chegado esse
momento, beijou três vezes o chão e apresentou seu memorial.
Sua Graciosa Majestade o recebeu muito favoravelmente e entregou o memorial
a um dos sátrapas, para informar. O sátrapa chama Memnon à
parte e diz-lhe com ar altivo, rindo amargamente: “Belo caolho me saiu
você, dirigindo-se ao rei e não a mim! E ainda por cima ousa
pedir justiça contra um honesto bancarroteiro a quem honro com a minha
proteção e que é sobrinho de uma camareira de minha amante.
Quer saber de uma coisa? Abandone esse negócio, meu amigo, se pretende
conservar o olho que lhe resta. Memnon, tendo assim renunciado, pela manhã,
às mulheres, aos excessos da mesa, ao jogo, a qualquer discussão,
e sobretudo à Corte fora, antes de chegar a noite, enganado e roubado
por uma bela dama, embriagara-se, jogara, metera-se numa disputa, perdera
um olho e recorrera à Corte, onde haviam zombado dele.
Petrificado de espanto, transido de dor, regressa com a morte no coração.
Quer entrar em casa: ali encontra oficiais de justiça que o despejavam
em nome dos credores. Detém-se quase desmaiado sob um plátano;
ali se encontra com a bela dama da manhã, a passear com o querido tio
e que explodiu de riso ao ver Memnon com o seu emplastro. Tombou a noite;
Memnon deitou-se na palha junto dos muros de sua casa. Veio-lhe a febre; assim
adormeceu; e um espírito celeste lhe apareceu em sonhos.
Era todo resplendente de luz. Tinha seis belas asas, mas nem pés,
nem cabeça, nem cauda, e não se assemelhava a coisa alguma.
— Quem és tu? – lhe diz Memnon.
— O teu bom gênio – respondeu-lhe o outro.
— Devolve-me então o meu olho, a minha saúde, o meu
dinheiro, a minha sabedoria – pede-lhe Memnon.
Em seguida contou-lhe como perdera tudo aquilo em um único dia.
— Eis aí aventuras que nunca nos acontecem no mundo em que
habitamos – observa o espírito.
— E em que mundo habitas? – indaga o infeliz.
— A minha pátria fica a quinhentos milhões de léguas
do sol, numa pequena estréia perto de Sírio, que tu vês
daqui.
— Que bela terra! – exclamou Memnon. – Quer dizer que
lá não há espertalhonas que enganem um pobre homem, nem
amigos íntimos que lhe ganhem o dinheiro e lhe furem um olho, nem bancarroteiros,
nem sátrapas que zombem da gente, recusando-nos justiça?
— Não – respondeu o habitante da estrela, – nada
disso. Nunca somos enganados pelas mulheres, porque não as temos; não
nos entregamos a excessos de mesa, porque não comemos; não temos
bancarroteiros, porque não existe entre nós nem ouro nem prata;
não nos podem furar os olhos, porque não temos corpos à
maneira dos vossos; e os sátrapas nunca nos fazem injustiça,
porque na nossa estrela todos são iguais.
— Sem mulher e sem dinheiro – disse Memnon, – como passam
então o tempo?
— A vigiar – respondeu o gênio – os outros globos
que nos são confiados; e eu vim para consolar-te.
— Ah! – suspirava Memnon. – Por que não vieste
na noite passada, para impedir-me de cometer tantas loucuras?
— Eu estava junto de Assan, teu irmão mais velho – respondeu
o ente celeste. – Ele é mais digno de lástima que tu.
Sua Graciosa Majestade o Rei das Índias, em cuja Corte tem a honra
de servir, mandou-lhe vazar os dois olhos, devido a uma pequena indiscrição,
e Assan acha-se atualmente num calabouço, com ferros nos pulsos e tornozelos.
— Mas que adianta ter um gênio na família, para que,
de dois irmãos, um esteja caolho, o outro cego, um nas palhas, o outro
na prisão?
— A tua sorte mudará – tornou o animal da estrela. –
É verdade que serás sempre caolho; – mas, afora isso,
ainda hás de ser bastante feliz, contanto que não faças
o tolo projeto de ser perfeitamente sábio.
— É então uma coisa impossível de conseguir?
– exclamou Memnon, suspirando.
— Tão impossível – replicou o outro – como
ser perfeitamente hábil, perfeitamente forte, perfeitamente poderoso,
perfeitamente feliz. Nós próprios estamos muito longe disso.
Há um globo em tais condições; mas, nos cem milhões
de mundos que estão esparsos pela imensidade, tudo se encadeia por
gradações. Tem-se menos sabedoria e prazer no segundo que no
primeiro, menos no terceiro que no segundo. E assim até o último,
onde todos são completamente loucos.
— Receio muito – disse Memnon – que este nosso pequeno
globo terráqueo seja precisamente o hospício do universo de
que me fazes a honra de falar.
— Não tanto – respondeu o espírito, – mas
aproxima-se: tudo está no seu lugar.
— Ah! – exclamou Memnon. – Bem se vê que certos
poetas, certos filósofos, não têm razão nenhuma
em dizer que tudo está bem.
— Pelo contrário, têm toda a razão – retrucou
o filósofo das alturas, – levando-se em conta o arranjo do universo
inteiro.
— Ah! só acreditarei nisso – replicou o pobre Memnon
quando não for mais caolho.
OS DOIS CONSOLADOS
O grande filósofo Citófilo dizia certa vez a uma mulher desolada,
e que tinha razões de sobra para isso:
A rainha da Inglaterra, filha do grande Henrique IV foi tão infeliz
quanto a senhora: expulsaram-na de seus domínios; esteve prestes a
naufragar numa tempestade; assistiu à morte de seu real esposo, no
cadafalso.
— Lamento-a – disse a dama; e pôs–se a chorar seus próprios
infortúnios.
— Mas lembre-se de Maria Stuart – insistiu Citófilo.
– Ela amava muito honestamente a um bravo músico que tinha uma
bela voz de baixo. O marido matou-lhe o músico à sua própria
vista; e depois a sua boa amiga e parenta a rainha Elizabeth que se dizia
virgem, mandou cortar-lhe o pescoço num cadafalso forrado de negro,
depois de a ter conservado prisioneira durante dezoito anos.
— Cruel destino – respondeu a dama; e tornou a abismar-se na
sua melancolia.
— E com certeza já ouviu falar – continuou o consolador
– na bela Joana de Nápoles, aquela que foi presa e estrangulada?
— Lembro-me confusamente – respondeu a aflita senhora.:
— Pois bem, devo então contar-lhe o que aconteceu a uma outra
grande princesa, a quem ensinei filosofia. Tinha ela um namorado, como acontece
a todas as grandes e belas princesas. Uma vez o pai entrou-lhe no quarto e
ali surpreendeu o amante, que tinha as faces em brasa e cujo olhar fulgurava
como um diamante; a dama estava também muito animada de cores. A cara
do jovem desagradou de tal maneira ao pai, que este lhe aplicou o mais formidável
bofetão de que há memória na sua província. O
amante pegou um par de tenazes e rachou a cabeça do sogro. que só
agora se está curando, e ainda tem as cicatrizes do ferimento. A amante,
desesperada, saltou pela janela e destroncou o pé; de maneira que hoje
coxeia visivelmente, embora tenha em compensação um corpo muito
bonito. O amante foi condenado à morte por haver quebrado a cabeça
de tão alto príncipe. Imagine o estado em que não estava
a princesa quando levavam o amante para a forca. Visitei-a durante muito tempo,
enquanto ela se achava em prisão: só me falava das suas desgraças
— Por que não quer então que eu pense nas minhas? –
retrucou a dama.
— É porque não deve – replicou o filósofo.
– Pois, havendo tantas e tão grandes damas com tamanhas desgraças,
não lhe fica bem desesperar-se. Pense em Hécuba, pense em Niobe.
— Ah! – exclamou a dama. – Se eu tivesse vivido no tempo
destas últimas, ou no de tantas belas princesas e, para as consolar,
lhes contasse o senhor as minhas desgraças, acha que elas lhe dariam
ouvidos?
No dia seguinte, o filósofo perdeu o seu filho único, e esteve
a ponto de morrer de dor. A dama organizou então uma lista de todos
os reis que haviam perdido os filhos e levou-a ao filósofo. Este a
leu, achou-a bastante exata, e nem por isso chorou menos.
Três meses depois tornaram a encontrar-se, e muito se espantaram de
achar-se mais alegres. E mandaram erigir uma bela estátua ao tempo,
com a seguinte inscrição: ÀQUELE QUE CONSOLA.
HISTÓRIA DAS VIAGENS DE SCARMENTADO ESCRITA POR ELE PRÓPRIO
Nasci em 1800 na cidade de Cândia, de que meu pai era governador.
Lembra-me que um poeta medíocre, e que não era mediocremente
duro, compôs uns maus versos em meu louvor, nos quais me fazia descender
de Minos em linha reta; mas, tendo meu pai caído em desgraça,
fez ele outros versos, onde eu descendia apenas de Pasifaé e seu amante.
Mau homem, esse Iro, e o mais aborrecido velhaco de toda a ilha.
Quando completei quinze anos, meu pai mandou-me estudar em Roma. Cheguei
na esperança de aprender todas as verdades; pois até então
me haviam ensinado exatamente o contrário, conforme é de uso
neste mundo, desde a China até os Alpes. Monsignor Profondo, a quem
fora recomendado, era um homem singular e um dos mais terríveis sábios
que já houve no mundo. Quis ensinar-me as categorias de Aristóteles,
e esteve a ponto de me colocar na categoria de seus mignons: escapei-me a
tempo. Vi procissões, exorcismos e algumas rapinas. Diziam, mas falsamente,
que a signora Olímpia, pessoa de grande prudência, vendia muita
coisa que não se deve vender. Estava eu numa idade em que tudo isso
me parecia muito divertido. Uma jovem dama de costumes muito brandos, chamada
signora Fatelo, houve por bem amar-me. Era cortejada pelo reverendo padre
Poignardini e pelo reverendo padre Acomiti, jovens professores de uma ordem
que não mais existe: ela os pôs de acordo, concedendo-me as suas
graças; mas ao mesmo tempo corria o risco de ser excomungado e envenenado.
De modo que parti, muito contente com a arquitetura de S. Pedro.
Viajei pela – França; era no tempo do reinado de Luis, o justo.
A primeira coisa que me perguntaram foi se eu não queria, para o almoço
uma pequena porção do marechal d’Ancre, cuja carne o povo
tinha assado e que vendiam modicamente a quem pedisse.
Esse Estado era continuamente agitado de guerras civis, algumas por causa
de um lugar no Conselho, outras vezes por duas páginas de controvérsia.
Fazia mais de sessenta anos que aquele fogo, ora abafado, ora soprado com
violência, desolava aqueles belos climas. Eram as liberdades da igreja
galicana. “No entanto – suspirava eu – esse povo nasceu
tranqüilo: quem pode tê-lo assim arrebatado a seu gênio?
Ele diverte-se e faz S. Bartolomeus. Venturosos os dias em que não
fizer mais que divertir-se!”
Passei para a Inglaterra: as mesmas querelas excitavam ali os mesmos furores,
Santos católicos tinham resolvido, a bem da Igreja, fazer saltar pelos
ares, a pólvora, o rei, a família real e todo o Parlamento,
e livrar a Inglaterra de tais heréticos. Mostravam-me o local onde
a bem-aventurada rainha Maria, filha de Henrique VIII, mandara queimar mais
de quinhentos de seus súditos. Um padre assegurou-me que era uma belíssima
ação: primeiro, porque aqueles a quem haviam queimado eram ingleses;
em segundo lugar, porque nunca usavam água benta e não acreditavam
no buraco de S. Patrício. Espantava-se de que ainda não tivessem
canonizado a rainha Maria; mas aguardava-o para breve, logo que o cardeal-sobrinho
dispusesse de algum lazer.
Dirigi-me para a Holanda, onde esperava encontrar mais tranqüilidade
em meio a um povo mais fleumático. Cortava-se a cabeça a um
venerável ancião, quando desembarquei em Haia. Era a cabeça
calva do primeiro ministro Barneveldt, o homem que mais merecera da República.
Cheio de piedade, perguntei qual o seu crime e se havia traído o Estado.
“Fez muito pior – respondeu-me um pregador de manto negro. –
Esse homem acredita que a gente pode salvar-se pelas boas obras, tanto como
pela fé. Bem vê que, a vigorarem tais opiniões, não
poderia uma república subsistir, e que há necessidade de leis
severíssimas para reprimir esses escândalos”. Um profundo
político da terra disse-me a suspirar: “Ah! meu senhor, os bons
tempos não durarão sempre; é só por acaso que
este povo se mostra agora tão zeloso; o fundo de seu caráter
é inclinado ao dogma abominável da tolerância; esse dia
virá: é o que me faz tremer”. Quanto a mim, enquanto não
chegavam esses funestos dias da moderação e da indulgência,
deixei mais que depressa um país onde a severidade não era suavizada
por nenhum atrativo, e embarquei para a Espanha.
A Corte estava em Sevilha; os galeões tinham chegado; tudo respirava
abundância e alegria na mais bela estação do ano. Ao fim
de uma alameda de laranjeiras e limoeiros, vi uma espécie de pista
imensa, cercada de gradis cobertos de preciosos tecidos. O rei, a rainha,
os infantes, as infantas achavam-se acomodados sob um pálio soberbo.
Fronteiro a essa augusta família, erguia-se um outro trono, mas muito
mais elevado. Disse a um de meus companheiro, de viagem: “A não
ser que esse trono seja reservado para Deus, não sei a quem possa servir…”
Essas indiscretas palavras foram ouvidas por um bravo espanhol e me custaram
bastante caro. Imaginava que fôssemos assistir a alguma cavalgada ou
corrida de touro, quando o grande inquisidor surgiu naquele trono, de onde
abençoou o rei e o povo.
Em seguida entrou um exército de padres, em formação
de dois, brancos, negros, cinzentos, calçados, descalços, com
barba, sem barba, encapuzados, sem capuz; em seguida marchava o carrasco;
depois, no meio dos alguazis e dos grandes, via-se cerca de quarenta pessoas
vestidas de sacos, nos quais haviam pintado diabos e chamas. Eram judeus que
não tinham querido renunciar a Moisés, cristãos que tinham
desposado as próprias comadres, ou que não haviam adorado a
Nossa Senhora de Atocha, ou não quiseram desfazer-se de seus negócios
em favor dos irmãos hieronimitas Cantaram devotamente belas orações.
depois queimaram todos os culpados a fogo lento, com o que a família
real pareceu extremamente edificada.
A noite, quando ia meter-me na cama, chegaram dois familiares da Inquisição
com a santa Hermandad; beijaram-mo ternamente e levaram-me, sem dizer palavra,
para um calabouço muito fresco, mobiliado de uma esteira e um belo
crucifixo. Fiquei ali seis semanas, ao fim das quais o reverendo padre Inquisidor
me mandou pedir que lhe fosse falar: estreitou-me algum tempo entre os braços,
com uma afeição toda paternal; disse-me que se sentia sinceramente
aflito por ter sabido que eu estava tão mal alojado; mas que todos
os apartamentos da casa se achavam ocupados e esperava que, da próxima
vez, me sentisse mais a gosto. Em seguida perguntou-me cordialmente se eu
não sabia por que estava lá. Disse ao reverendo que provavelmente
pelos meus pecados. “Pois bem, meu caro filho, por qual pecado? Fala-me
com toda a confiança”. Por mais que procurasse, não pude
adivinhar: ele caridosamente me auxiliou. Até que me lembrei das minhas
indiscretas palavras, de que fui remido com disciplinas e uma multa de trinta
mil reales. Levaram-me a saudar o grande inquisidor: era um homem polido,
que me perguntou como tinha eu achado a sua festinha. Disse-lhe que achara
uma coisa deliciosa, e fui instar com meus companheiros de viagem para que
deixássemos aquele país, por mais belo que fosse. Tiveram eles
tempo de informar-se de todas as grandes coisas que os espanhóis haviam
feito pela religião. Leram as memórias do famoso bispo de Chispa,
das quais se depreende que haviam degolado ou queimado ou afogado dez milhões
de infiéis na América, a fim de os converter. Achei que o bispo
exagerava; mas, ainda que se reduzisse tal sacrifício a cinco milhões
de vitimas, seria igualmente admirável.
Acossava-me ainda o desejo de viajar. Contava terminar minha excursão
européia pela Turquia; pusemo-nos a caminho. Propus-me não mais
dar opiniões sobre as festas a que assistisse. “Esses turcos
– dizia eu a meus companheiros – são incréus, não
foram batizados e, por conseguinte, hão de ser muito mais cruéis
que os reverendos padres inquisidores. Guardemos silêncio quando estivermos
entre os maometanos”.
Fui, pois, ter com eles. Muito me espantei ao ver que na Turquia havia mais
igrejas cristãs que em Cândia. Vi até numerosos grupos
de monges, a quem deixavam rezar livremente à Virgem Maria e amaldiçoar
a Maomé, estes em grego, aqueles em latim, outros em armênio.
“Boa gente esses turcos!” – exclamei. Os cristãos
gregos e os cristãos latinos eram inimigos mortais em Constantinopla;
esses escravos perseguiam-se uns aos outros, como cães que se mordem
na rua e a quem os donos separam a bastonaços. O grão-vizir
protegia então os gregos. O patriarca grego acusou-me de haver ceado
com o patriarca latino, e eu fui condenado, em pleno divã, a cem varadas
na sola dos pés, resgatáveis por quinhentos sequins. No dia
seguinte, o grão-vizir foi estrangulado; e, no outro dia, o seu sucessor,
que era pelo partido dos latinos, e que só foi estrangulado um mês
depois, me condenou à mesma multa, por ter ceado com o patriarca grego.
Vi-me na triste emergência de não freqüentar nem a Igreja
grega nem a latina. Para consolar-me, tomei a meu serviço uma bela
circassiana, que era a mais carinhosa das criaturas na intimidade, e a mais
devota na mesquita. Uma noite; nos doces transportes do seu amor, exclamou,
beijando-me:. Alla, Illa, Alla; são as palavras sacramentais dos turcos:
julguei que eram as do amor; exclamei também com toda a ternura: Alla,
Illa, Alla. “Ah! louvado seja o Deus de misericórdia –
disse-me ela. – Agora és turco”. Disse-lhe que o bendizia
por me haver dado a força de um turco, e julguei-me muito feliz. De
manhã, chegou o imame para circuncidar-me; e, como eu relutasse, o
cádi do bairro, homem leal, propôs que me empalassem: salvei
o meu prepúcio e o meu traseiro com mil sequins, e fugi sem tardança
para a Pérsia, resolvido a não mais ouvir missa grega nem latina
na Turquia, e a nunca mais gritar: Alla, Illa, Alla em um encontro amoroso.
Chegado a Ispaão, perguntaram-me se eu era pelo carneiro preto ou
pelo carneiro branco. Respondi que isso me era indiferente, desde que o carneiro
fosse macio. Cumpre saber que as facções do Carneiro Branco
e do Carneiro Preto ainda dividiam os persas. Julgaram que eu zombava dos
dois partidos, de sorte que, já às portas da cidade, me vi envolvido
numa violenta rixa: custou-me ainda inúmeros sequins para desembaraçar-me
dos carneiros.
Fui até à China com um intérprete, que me assegurou
ser esse o país onde se vivia alegre e livremente. Os tártaros
agora o governavam, depois de haver . submetido tudo a ferro e fogo; e os
reverendos padres jesuítas de uma parte, como os reverendos padres
dominicanos da outra, diziam que ali pescavam almas para Deus, sem que ninguém
o soubesse. Jamais se viram conversores tão zelosos: pois viviam a
perseguir-se mutuamente; escreviam para Roma volumes e volumes de calúnias;
tratavam-se de infiéis e de prevaricadores, por causa de uma alma.
Havia principalmente uma horrível disputa entre eles, sobre a maneira
de fazer a reverência. Queriam os jesuítas que os chineses saudassem
a seus pais e mães à moda da China, e os dominicanos queriam
que os saudassem à moda de Roma. Aconteceu-me ser tomado pelos jesuítas
por um dominicano. Fizeram-me passar aos olhos de sua Majestade tártara
por espião do Papa. O conselho supremo encarregou um primeiro mandarim,
o qual deu ordem a um sargento, o qual mandou quatro esbirros do país
efetuar a minha prisão e atar-me com todo o cerimonial. Fui conduzido,
após cento e quarenta genuflexões, perante Sua Majestade. Fez-me
perguntar se eu era espião do Papa e se era verdade que esse príncipe
viria em pessoa destroná-lo. Respondi que o Papa era um sacerdote de
setenta anos; que residia a quatro mil léguas de Sua Majestade tártaro-chinesa;
que tinha cerca de dois mil soldados que montavam guarda com um parassol;
que não destronava a ninguém, e que Sua Majestade podia dormir
em paz. Foi a aventura menos funesta da minha vida. Enviaram-me para Macau,
de onde embarquei rumo à Europa.
Meu navio teve necessidade de ser reparado no litoral de Golconda. Aproveitei
esse tempo para ir visitar a Corte do Grande Aureng-Zeb, de quem diziam maravilhas.
Achava-se ele em Delí. Tive o consolo de o fitar no dia da pomposa
cerimônia durante a qual recebeu o celestial presente que lhe enviava
o xerife de Meca. Era a vassoura com que haviam varrido a casa santa, a Caaba,
a Beth Allah. Essa vassoura é o símbolo que varre todas as impurezas
da alma. Aureng-Zeb não parecia ter necessidade desse objeto; era o
homem mais piedoso de todo o Indostão. É verdade que degolara
um de seus irmãos e envenenara o próprio pai. Vinte rayas e
outros tantos omrahs haviam sido mortos em suplícios; mas isso não
era nada, e só se falava da devoção de Aureng-Zeb. Não
o comparavam senão à Sagrada Majestade do Sereníssimo
Imperador de Marrocos, Muley-lsmael, que mandava cortar cabeças todas
as sextas-feiras, após a oração.
Quanto a mim, não dizia uma única palavra; as viagens me haviam
formado o espírito, e eu achava que não me competia decidir
entre esses dois augustos soberanos. Mas devo confessar que um jovem francês
meu companheiro faltou com o respeito ao imperador das Índias e ao
de Marrocos. Ocorreu-lhe dizer que havia na Europa soberanos muito piedosos
que governavam bem os seus Estados, e até freqüentavam as igrejas,
sem no entanto matar a seus pais e irmãos, nem degolar seus súditos.
O nosso intérprete transmitiu em hindu as ímpias expressões
de meu jovem amigo. Com a experiência do passado, fiz logo selarem os
nossos camelos e partimos, o francês e eu. Soube depois que, na mesma
noite, os oficiais do grande Aureng-Zeb tinham ido prender-nos e só
encontraram o intérprete. Executaram-no em praça pública,
e todos os cortesãos confessaram, sem lisonja, que a sua morte fora
muito justa.
Restava-me ver a África, para gozar de todos os encantos de nosso
continente. Vi-a, com efeito. Meu navio foi apresado por corsários
negros. Nosso capitão fez veementes protestos; perguntou-lhes por que
violavam assim as leis internacionais. “Vocês têm nariz
comprido – respondeu-lhe o capitão negro – e o nosso é
chato; seus cabelos são lisos, o nosso é encarapinhado; vocês
têm pele cor de cinza, e nós cor de ébano; devemos, pois,
pelas leis sagradas da natureza, ser sempre inimigos. Vocês nos compram,
nas feiras da costa de Guiné, como a animais de carga, para nos obrigar
a trabalhar em não sei que serviços tão penosos como
ridículos Fazem-nos cavar as montanhas, a golpes de nervo de boi, para
extrair uma espécie de terra amarela que, por si mesma, não
presta para nada, e que não vale uma boa cebola do Egito. De maneira
que, quando nós os encontramos e somos os mais fortes, logo escravizamos
vocês todos e os obrigamos a lavrar nossos campos, ou então lhes
cortamos o nariz e as orelhas.”
Nada tínhamos que replicar a tão sábias palavras. Fui
lavrar o campo de uma negra velha, para conservar minhas orelhas e meu nariz.
Resgataram-me ao fim de um ano. Vira tudo o que há de belo, de bom
e de admirável sobre a face do globo: resolvi não ver mais que
os meus penates. Casei-me na minha terra; ganhei um par de ornamentos, e vi
que era esse o estado mais tranqüilo da vida.
HISTÓRIA DE UM BRÂMANE
Encontrei nas minhas viagens um velho brâmane, homem bastante sábio,
cheio de espírito e erudição;. de resto, era rico, e
por isso mesmo ainda mais sábio; pois, como nada lhe faltasse, não
tinha necessidade de enganar a ninguém. Seu lar era muito bem governado
por três belas mulheres que porfiavam em agradar-lhe; e, quando não
se divertia com elas, ocupava-se em filosofar.
Perto de sua casa, que era bonita, bem ornamentada e cercada de encantadores
jardins, morava uma velha hindu carola, imbecil e muito pobre.
— Quem me dera não ter nascido! – disse-me um dia o brâmane.
Perguntei-lhe por quê. – Há quarenta anos que estudo –
respondeu-me – e são quarenta anos perdidos: ensino aos outros,
e ignoro tudo; esse estado me enche a alma de tal humilhação
e desgosto, que me torna a vida insuportável. Nasci, vivo no tempo,
e não sei o que é o tempo; acho-me num ponto entre duas eternidades,
como dizem os nossos sábios, e não tenho a mínima idéia
da eternidade. Sou composto de matéria, penso, e nunca pude saber por
que coisa é produzido o pensamento; ignoro se o meu entendimento é
em mim uma simples faculdade, como a de marchar, de digerir, e se penso com
a minha cabeça como seguro com as minhas mãos. Não só
o princípio de meu pensamento me é desconhecido, mas também
o princípio de meus movimentos: não sei por que existo. No entanto,
cada dia me fazem perguntas sobre todos esses pontos; é preciso responder;
nada tenho que preste para lhes comunicar; falo bastante, e fico confuso e
envergonhado de mim mesmo após haver falado.
O pior é quando me perguntam se Brama foi produzido por Vixnu, ou
se ambos são eternos. Deus é testemunha de que nada sei a respeito,
o que bem se vê pelas minhas respostas. “Ah! meu reverendo –
imploram-me, – dizei-me como é que o mal inunda toda a terra”.
Sinto-me nas mesmas dificuldades que aqueles que me fazem tal pergunta: digo-lhes
algumas vezes que tudo vai o melhor possível; mas aqueles que ficaram
arruinados ou mutilados na guerra não acreditam nisso, nem eu tampouco:
retiro-me acabrunhado da sua curiosidade e da. minha ignorância. Vou
consultar nossos antigos livros, e estes duplicam as minhas trevas. Vou consultar
meus companheiros: respondem-me uns que o essencial é gozar a vida
e zombar dos homens; outros julgam saber alguma coisa, e perdem-se em divagações;
tudo concorre para aumentar o doloroso sentimento que me domina. Sinto-me
às vezes à borda do desespero, quando penso que, após
todas as minhas pesquisas, não sei nem de onde venho, nem o que sou,
nem para onde vou, nem o que me tornarei”
O estado desse excelente homem me causou verdadeira pena: ninguém tinha
mais senso e boa-fé. Compreendi que, quanto mais luzes havia no seu
entendimento a mais sensibilidade no seu coração, mais infeliz
era ele.
Vi, no mesmo dia, a velha sua vizinha: perguntei-lhe se alguma vez se afligira
por saber como era a sua alma. Nem chegou a entender minha pergunta: nunca
na sua vida refletira um memento sobre um só dos pontos que atormentavam
o brâmane; acreditava de todo o coração nas metamorfoses
de Vixnu e, desde que algumas vezes pudesse conseguir água do Ganges
para se lavar, julgava-se a mais feliz das mulheres.
Impressionado com a felicidade daquela pobre criatura, voltei a meu filósofo
e disse-lhe:
— Não te envergonhas de ser infeliz, quando mora à tua
porta um velho autômato que não pensa em nada e vive contente?
— Tens razão – respondeu-me ele; – mil vezes disse
comigo que seria feliz se fosse tão tolo como a minha vizinha, e no
entanto não desejaria tal felicidade.
Essa resposta me causou maior impressão que tudo o mais; consultei
minha consciência e vi que na verdade também não desejaria
ser feliz sob a condição de ser imbecil.
Expus a questão a filósofos, e eles foram da minha opinião.
“No entanto – dizia eu, – há uma terrível
contradição nessa maneira de pensar”. Pois de que se trata,
afinal? De ser feliz. Que importa, pois, ter espírito ou ser tolo?
Mais ainda: aqueles que estão contentes consigo estão bem certos
de estar contentes; mas aqueles que raciocinam não se acham tão
certos de bem raciocinar. “É claro – dizia eu – que
se deveria preferir não ter senso-comum, uma vez que este contribua,
o mínimo que seja, para o nosso mal-estar.” Todos foram de minha
opinião, e todavia não encontrei ninguém que quisesse
aceitar o pacto de se tornar imbecil para andar contente. Donde concluí
que, se muito nos importamos com a ventura, mais ainda nos importamos com
a razão.
Mas, refletindo bem, parece uma insensatez preferir a razão à
felicidade. Como se explica, pois, tal contradição? Como todas
as outras. Aí há muito de que falar.
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