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Entre todas as aves, espalhou-se a notícia de uma festa no Céu. Todas as aves compareceriam e começaram a fazer inveja aos animais e outros bichos da terra incapazes de vôo.
– Que não tem pena não vai poder ir a ao Céu – berrava a Maritaca toda orgulhosa.
Imaginem quem foi dizer que ia também à festa… O Sapo-Boi, que não querendo ficar pra trás, tratou logo de dizer:
– Eu também vou.
A Maritaca ficou surpresa:
– Como?! Sapo não voa.
– E precisa?
– Como você é ignorante. Fala pros cotovelos. Onde já se viu sapo voar?
Pois bem, o Sapo-Boi disse que tinha sido convidado e que ia sem dúvida nenhuma.
– Sou convidado de honra do São Pedro. Ele me disse que não abre o portão do Céu enquanto eu não chegar. Os bichos só faltaram morrer de rir e Maritaca, então, nem se fala.
Disparou a falar mal do Sapo-Boi. Dizia que ele era pesado e nem sabia dar uma corrida, seria capaz de aparecer naquelas alturas.
– Sua língua, Dona Maritaca, não é feita de aço, mas ela corta uma navalha.
Para não ter que brigar com a Maritaca, o Sapo-Boi saiu de perto, resmungando pra si mesmo: Essa Maritaca é como pernilongo, só cala o bico com um tapa.
O Sapo-Boi tinha seu plano. Estão rindo de mim, mas não perdem por esperar. Duas palavras abrem qualquer porta: puxe e empurre. Vou nesta festa nem que tenho que pregar penas por todo o corpo.
Tenho uma idéia: vou procurar o Urubu. Posso descolar uma carona. A esperteza é fazer isto com arte! Não há urubu que não cobiça uma boa carniça. Basta-me oferecer pra ele as carniças do brejo que ele me leva. São as pequenas coisas que fazem as grandes diferenças – assim foi pensando o Sapo-Boi.
Na véspera da Festa do Céu, procurou o Urubu e deu uma prosa boa divertindo muito o dono da casa. Prometeu mundo e fundos pro carniceiro. Depois disse:
– Você vai à Festa no Céu.
– Vou sim. Todas as aves foram convidadas. Se você fosse uma ave, teria sido também – disse o Urubu.
O Sapo-Boi que era muito vaidoso e orgulho até os cabelos e, só pra não dar o braço a torcer, completou:
– Bom, camarada Urubu, quem é coxo parte cedo e eu vou indo, porque o caminho é comprido. Tem que me apressar, ainda vou me arrumar para ir a Festa no Céu.
O Urubu também ficou surpreso:
– Você vai mesmo?
– Se vou? Claro!
– De que jeito?
– Indo – respondeu o Sapo-Boi com sua bocarra escancarada, todo confiante. – Até lá, camarada Urubu, sem falta! Em vez de sair da casa o Urubu, o Sapo-Boi deu um pulo pela janela do quarto do Urubu e vendo a viola, em cima da cama, meteu-se dentro dela, encolhendo-se todo, ajuntando bem as penas longas.
Se você controla os pés, controla a mente. Ficou quietinho: Aqui me ajeito. Vou ou não vou na Festa?! Sempre tem um chinelo velho para um pé cansado.
O urubu, mais tarde, pegou na viola, amarrou-a a tira-colo e bateu asas para o céu, vrru-rru-rrum… O Sapo-Boi ficou na sua, bem amoitado no fundo da viola.
Chegando ao céu, o Urubu arriou a viola em um canto e foi procurar as outras aves pra prosear. O Sapo-Boi botou um olhão de fora e, vendo que estava sozinho, ninguém pra xeretar, deu um pulo e ganhou a pista
da Festa, todo satisfeito. Não queiram saber o espanto que as aves tiveram, vendo o sapo pulando no céu!
Perguntaram e perguntaram curiosas:
– Como você chegou até aqui?
Mas o Sapo-Boi, esperto demais, só fazia conversa mole:
– Chegando, uai.
A Maritaca na acreditava no que via: tem carne escondida debaixo desse angu. Em terra de cego, quem tem um olho é rei, dois é deus e três é o diabo. Ainda descubro com esse bocudo veio parar aqui.
A festa começou e o sapo tomou parte se exibindo o tempo todo. Nem pro Urubu ele quis contar. Foi até arrogante:
– Eu não lhe disse que vinha? Cabra-macho não bebe água, masca fumo e engole a baba.
Pela madrugada, sabendo que só podia voltar do mesmo jeito da vinda, o Sapo-Boi foi-se esgueirando e correu para onde o Urubu havia deixado a viola. Encontrou a viola e acomodou-se, como da outra feita.
O sol ia saindo, acabou-se a festa e os convidados foram voando, cada um para seu destino. O Urubu agarrou a sua viola e tocou-se para a terra, vrru-rru-rrum…
Ia pelo meio do caminho, quando, numa curva, o sapo mexeuse e o urubu, espiando para dentro do instrumento, viu o bicho lá no escuro, todo curvado, feito uma bola. Só os enormes olhos brilhando.
– Ah! camarada sapo! É assim que você vai à festa no Céu?
– Uma carona não faz mal a ninguém – respondeu o Sapo-Boi, meio sem jeito.
– Então foi desse jeito que você veio?
– Coác! Usando um pouco minha inteligência, né, camarada.
O Urubu achou o Sapo-Boi muito folgado e, além do mais, ele contou muito papo na festa. Me fez de bobo. Se tivesse ao menos me contado. Merece um castigo – concluiu o Urubu.
– Vou te jogar lá embaixo – avisou pro Sapo-Boi.
– Cê tá louco?! – berrou o Sapo-Boi, escancarando o bocão.
O Urubu estava decidido em atirar o Sapo-Boi lá de cima.
– Pode escolher: quer cair no chão ou na água?
O Sapo-Boi desconfiou da proposta: conhecendo o urubu, ele vai me pirraçar. Boca de mel, coração de fel. Vai me jogar onde eu não escolher. Para quem está se afogando, jacaré é tronco. Cachorro mordido de cobra tem medo até de lingüiça.
Então, o Sapo-Boi querendo ser mais esperto que o Urubu, foi logo dizendo:
– Me joga no chão mesmo.
Urubu ficou surpreso com o pedido. Este sapo deve ter pirado.
– Tem certeza que isso mesmo que você quer?
– Claro, camarada Urubu – completou o Sapo-Boi, resmungo pra si mesmo: O destino não é uma questão de sorte, é uma questão de escolha.
E, naquelas alturas, o Urubu emborcou a viola. O sapo despencou-se para baixo e veio zunindo. E rezava: – Coác! Se eu desta escapar, nunca mais boto as patas nas alturas!
Nem converso demais. É melhor calar-se e deixar que as pessoas pensem que você é tolo, do que falar e acabar com a dúvida. E vendo as serras lá embaixo, berrou desesperado:
– Coác! Arreda pedras!
E as pedras não arredaram. O Sapo-Boi então pode concluir antes de esborrachar nelas: A esperança é um urubu pintado de verde.
Bateu em cima das pedras como um tomate maduro, esparramando-se todo. Ficou em pedaços.
Conta-se, lá pras bandas do brejo, que Nossa Senhora, com pena do infeliz sapo, juntou todos os pedaços do seu corpo esparramado nas pedras e o sapo viveu de novo. Aprendeu uma sábia lição: Nosso verdadeiro inimigo está em nós mesmos.
Não são os grandes planos que dão certo, são os pequenos detalhes. Não cuidei dos detalhes.
– Por isso o sapo tem o couro todo cheio de remendos. A primeira vítima da ignorância é o próprio ignorante – explica a Maritaca, sempre com certa maldade nos olhos esverdeados toda vez que conta essa história.
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