Dia da Constituição Política do Brasil

Carta de Lei de 25 de Março de 1824

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Dia da Constituição Política do Brasil

“A palavra constituição, envolvendo a idéia de que esta lei é a expressão da vida nacional, tem o valor de seu sentido fisiológico: é uma predicação política feita para assinalar que é uma lei adaptada à realidade social, obedecendo a fins práticos, não só originariamente inspirada em certa ordem de objetos gerais e permanentes, mas ordinariamente dominada pelo escopo de sua aplicação ao desenvolvimento evolutivo da sociedade. A política é o laço que domina o corpo da constituição e liga suas disposições entre si e sua inteligência aos movimentos da sociedade, do povo e dos fatos. Daí a supremacia, na interpretação, deste amplo e elevado sentido, sobre a inteligência expressa, isolada e lateral da lei. O desvirtuamento da palavra política, em quase toda a parte, e, assinaladamente, entre nós, faz surgir, nos espíritos certa repugnância a aceitação desta inteligência constitucional.

Quando não considerada arena de lutas pessoais, a política é tida como luta partidária, entre homens que Pleiteiam certo número de princípios teóricos. A concepção acadêmica do Governo e do Estado, fundada sobre a pressuposição de sistemas, normas e princípios permanentes, sugeriu a idéia da separação entre as regras e programas, e as realidades da sociedade, do homem e da terra. Daí a existência das políticas dos partidos, em todas as nacionalidades, e a falta da política nacional”.

O nascimento do Constitucionalismo no Brasil deu-se antes mesmo da Independência, em junho de 1822; no entanto tornou-se uma realidade somente em 1824, com a promulgação da Constituição Política do Império do Brasil. Esta foi a Carta Constitucional de maior tempo de vigência da História do Brasil, 65 anos – de 25 de março de 1824 a 24 de fevereiro de 1891.

A 28 de novembro de 1807, a comitiva da Família Real, acompanhada por mais de dez mil pessoas entre nobres, clérigos, fidalgos, funcionários públicos, entre outras categorias, embarcaram em quatorze navios rumo à América do Sul, devidamente escoltados por uma esquadra inglesa.

A partir de então, diversas ações da Coroa Portuguesa contribuíram para a evolução da sociedade brasileira, ainda incipiente. Como exemplos de incremento cultural, econômico e político, citamos: criação da Junta de Comércio, Agricultura e Navegação do Brasil; a Real Fábrica de Pólvora; a Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica; fundação do Banco do Brasil (1808); surgimento de uma imprensa nacional, a Imprensa Régia, e com ela o primeiro jornal do Brasil, A Gazeta do Rio de Janeiro(14); entre outros avanços.

Assim, podemos afirmar que, ao mesmo tempo em que, permanecendo aqui, a Família Real pretendeu paralisar possíveis movimentos de emancipação política brasileiros, sua estadia aqui criou toda a estrutura política, social, econômica e cultural necessária e propícia para o desprendimento do Brasil de sua tutela. O Brasil deixava de ser uma mera colônia do sistema mercantil português para fazer parte de um liberalismo generoso, principalmente, em favor da Inglaterra.

A partir de então, a independência era cada vez mais iminente.

Em maio de 1822, a ruptura entre D. Pedro e as Cortes tornou-se mais profundo: o Príncipe Regente determinou que qualquer ordem vinda das Cortes portuguesas só poderia ser executada caso ele, D. Pedro, assinalasse o “Cumpra-se” nos decretos. “Na prática, isso significava conferir plena soberania ao Brasil”.O apoio à medida foi imediato: o Senado da Câmara do Rio de Janeiro a D. Pedro o título de Defensor Perpétuo do Brasil.(31)

A 3 de junho de 1822, D. Pedro convocou uma Assembléia Constituinte. A idéia original de Gonçalves Ledo e dos liberais radicais era a de votação direta para a eleição dos constituintes. No entanto, José Bonifácio Andrada, Ministro do Reino e dos Estrangeiros, era contrário à Assembléia. Não podendo, porém, impedir sua efetivação, José Bonifácio conseguiu sua descaracterização através da instituição da votação indireta para eleição dos representantes na Constituinte.

Fonte: UFGNet, CEDI

Dia da Constituição Política do Brasil

Carta de Lei de 25 de Março de 1824

Formalmente proclamado o total rompimento do Brasil em princípios de setembro de 1822, oficialmente conhecida como ato da Proclamação da Independência, tornou-se indispensável dar uma nova contextura política ao País. Somente para esclarecer bem o/a leitor/a, em verdade o Brasil já ganhara sua independência política, em 15 de dezembro de 1815, quando fora elevado de sua condição de Vice-Reino, embora já sede da Monarquia desde janeiro de 1808, para a condição de Reino Unido ao de Portugal e Algarves.

Quando ainda sediada em terras Brasileiras, a Coroa Portuguesa passou por profundas transformações que tiveram como resultado a eclosão da Revolução Constitucionalista do Porto, na Europa, levando a Monarquia a findar o largo período absolutista que vinha desde sua fundação como nação.

Sua Majestade Fidelíssima el Rey Dom João VI, mesmo no Brasil, chegou a ser forçado a jurar por uma constituição que todavia não fora escrita mas, que lhe deixara muitíssimo claro não mais reinaria como monarca absoluto – iniciava-se em seu reinado o princípio da constitucionalização do Regime Monárquico face aos ventos de mudança que sopravam na Europa findada as guerras napoleônicas.

O Brasil tornando-se Sede da Coroa por ocasião das guerras na Europa, viu-se jubilosamente beneficiado pelas mudanças que passaram a ocorrer – desenvolveu-se o País, em sete anos tornou-se Reino, com todas as prerrogativas que uma independência justa e pacífica a que lhe fazia jus, mostrando ao conjunto rebelde de sua vizinha América Espanhola que sua independência fora fruto de uma gradativa porém rápida evolução natural de sua sociedade ante a presença do Poder Real em solo americano.

Voltando ao relatado no segundo parágrafo, ocorreram substanciais mudanças dentro do próprio regime que irremediavelmente forçaram a volta de el Rey à Lisboa (Sua Majestade Fidelíssima voltara muito a contra-gosto – tinha em a grande visão de construir e manter o Império em solo Brasileiro). Com a abertura das Côrtes Constituintes em Lisboa, o Brasil, como País independente porém unido sob a mesma coroa, envia representantes eleitos para participarem da elaboração da que seria a primeira Carta Constitucional do Império Português, dando início à uma complexa reforma de todo o regime até então vigente.

Somente em seu princípio, os trabalhos das Côrtes Constituintes iniciaram-se bem aos interesses do Brasil, até quando a representação portuguesa, que era maioria, passou a apoiar a revogação de todos os atos régios concernentes à independência política e econômica do Reino do Brasil. Verdadeiramente tratava-se de um processo de recolonização ao patamar anterior ao de 1808, onde somente a Câmara de Lisboa deveria deter o poder do que era ou não era permitido ao então novo reino americano, em detrimento da já consolidada Assembléia Geral do Rio de Janeiro.

Verdadeiramente ultrajados por tamanhas disparidades apresentadas diante das Côrtes Constituintes em Lisboa, os representantes Brasileiros retiram-se das mesmas e regressam ao Brasil, onde apoiados por sua elites locais já não poderiam suportar um rebaixamento de tamando porte – acercam-se do augusto Príncipe Regente, o Senhor Dom Pedro de Alcântara, Herdeiro da Coroa convencendo-o a ficar no Brasil.

Já na Europa, el Rey não mais detinha real poder de indispor-se ante as Côrtes Constituintes, não restanto à este senão aconselhar seu mui amado filho, por cartas pessoais, estimulando-o a sim resistir e ficar no Brasil, pois este se separando, deveria manter-se unido não somente sob sua liderança, bem como principalmente em sua continental dimensão geográfica, evitando-se o que catastroficamente passou-se com toda a América Espanhola.

Pesquisando e lendo em muitos dos textos e comentários da época, é bastante claro supor que el Rey Dom João VI, em sua grande sapiência política chegou a visionar quatro grandes possibilidades bastante possíveis ao que poderia vir a ser o destino do Brasil caso regressasse ou negasse a regressar ao velho mundo – são eles:

1. Se recusasse a regressar à Europa, perderia ele e seus sucessores todo e qualquer direito dinástico sobre o território português, segundo as resoluções do Congresso de Viena após a guerra, porém converteria o Brasil definitavemente sede do grande Império Americano que muitos de seus antepassados chegaram a idealizar, mas somente ele a concretizou, com a subordinação ainda que por treze anos consecutivos de todas as outras colônias ultramarinas diretamente ao Rio de Janeiro;

2. Não procedendo as intenções das elites portuguesas e estas sendo definivamente derrotadas nas Côrtes Constituintes em Lisboa em retroceder o Brasil, vitoriáva-se a manutenção da independência dos dois reinos – sua visão pela manutenção do benéfico “status quo” traria não somente à Portugal, mas principalmente ao Brasil inúmeros benefícios pela manutenção do imenso Império Português – seria como uma espécie de Commonwealth Britânica dos dias de hoje existente em países como Canadá, Austrália, Nova Zelândia, entre muitos outros, onde estes são completamente independentes da Inglaterra porém têm o maior orgulho de manterem como seu Chefe-de-Estado o/a monarca britânico/a;

3. Inevitável a separação do Reino Unido do Brasil face a vitória esmagadora pelo processo de retrocesso político ao mesmo, estando seu filho na cabeça do Estado Brasileiro, conservar-se-ia a unidade territorial do Brasil, e este não seria hostil à sua pátria-mãe, e ainda como Chefe-de-Estado do Brasil, mais tarde, obrigatoriamente, tornar-se-ia Rei de Portugal e talvez poderia propor uma nova re-estruturação contornando a delicada situação política e novamente unir as duas coroas, evidentemente ratificando e respeitando a total independência dos dois reinos, porém sob a mesma coroa – esta possibilidade, dentre as quatro apresentadas, foi a que vingou, porém não levando em conta a reunificação das coroas brasileira e portuguesa – optou-se pela separação total;

4. Derrotados os Constituintes Brasileiros e regressando seu filho à Europa, inevitavelmente testemunharia o então Reino do Brasil o seu esfaçelamento em uma série de repúblicas, umas tentando tragar as demais, face às falsas idéias de liberdade campeantes, a falta de verdadeiros líderes capazes de manter a ordem e, principalmente, o surgimento do contagiante caudilhismo latino americano que já devastava o restante do continente – esta última visão, certamente era a que mais Dom João VI verdadeiramente empenhou-se em evitar que ocorre-se, pois a permanência de seu filho o Príncipe Regente possibilitava uma entre a segunda ou terceira visão pela manutenção da integridade do Império.

Bem, depois de haver passado à limpo um pouco da história que precede a independência, elucidando alguns pontos importantes antes de chegarmos à outorgação da primeira constituição, espero que o prezado/a leitro/a tenha começado a captar a grandiosidade da situação da época.

É conveniente lembrar que durante a instauração das Côrtes Constituintes, no Brasil fora criada ao mesmo tempo uma Assembléia Geral Constituinte mas que fora fechada por ordem das Côrtes em Lisboa. A segunda assembléia fora convocada imediatamente após o ato de independência, porém esta também chegou a ser dissolvida pelo próprio Poder Moderador em virtude da falta de concenso entre as elites representativas, que ao ver de muitos estariam a ameaçar em muito a ordem estabelecida, podendo levar o país à uma secessão irreversível. O tempo era pouco, daí já no dia 25 de março de 1824, a Primeira Constituição do Brasil fora outorgada e, como não poderia deixar de ser, trouxe em seu bojo muitíssimos dispositivos de ordem político-social-eleitoral.

Penso ser de uma leviandade muito grande que muitos e, principalmente, a historiografia oficial denominem a primeira constituição como antidemocrática. Vejam bem, àquela época, o teromo democracia não detinha a definição como em nossos dias, e vale muito bem frisar que o Brasil já se encontrava na vanguarda do mais moderno liberalismo existente no que tange nitidamente a palavra democracia, principalmente que em quatorze anos (1808-1822), conseguiu impulsionar-se de maneira impressionante, em todos os aspectos, político-econômico-social, sem o cataclisma caudilhesco que assolou o restante de sua vizinha América Espanhola.

A Constituição Imperial do Brasil foi a que mais tempo durou, e durou pelo simples fato que era uma carta justa para a sociedade da época e, principalmente, aberta à interpretações e adequações de acordo com os tempos vindouros. Por ela, segundo as necessidades e costumes da época, o voto era censitário: só podia votar quem tivesse uma renda mínima de cem mil réis anuais. Para ser votado, a renda era maior ainda. E as eleições por conseguinte, eram realizadas de maneira indireta. Elegia a massa de cidadãos ativos em assembléias paroquiais os eleitores de província e estes os representantes da Nação e suas respectivas províncias. Obviamente, prezado/a leitor/a, que assim o processo eleitoral deveria partir e evoluir-se.

A Contituição Imperial era tão prática quanto perfeita, pois permitiu que no II Reinado, fosse instituído o Parlamentarismo com suas peculiaridades e adequações às necessidades do País e seguramente o sistema eleitoral já encontráva-se em processo de re-estruturação para sua modificação no III Reinado entrante, sob a égide de uma mulher como Chefe-de-Estado, que seria Dona Isabel I, a Redentora dos Escravos.

Deve-se frisar que muito provavelmente, caso Dona Isabel chegasse a reinar verdadeiramente em solo Brasileiro – não existe qualquer dúvida que os direitos da mulher, dentre eles inclusive o de votar, seriam amplamente defendidos e postos em prática como continuidade da evolução social e política Brasileiros.

Evidentemente, isso não ocorreu, tal como sabemos, ainda que de ouvidos surdos e olhos bem cegos – um minguado grupo de republicanos conseguiu instaurar a república no Brasil e assim pôr fim ao longo período de paz e verdadeira prosperidade político-social nesta monarquia constitucional e parlamentarista – introduziram os golpes, os estados-de-sítio, o fechamento do congresso, proibiu-se a livre expressão, tudo em nome do que era vindo dos ideais republicanos e democratas – não se dera conta o povo que estes sim acabaram com a verdadeira democracia que havia, esta havia sido a Monarquia Constitucional e Parlamentarista do Brasil.

O Poder Legislativo constituía-se em Assembléia Geral do Império e era formado pela Câmara dos Deputados, eletiva e temporária, e pelo Senado do Império (o senador, como nos dias de hoje, tinha como funções protocolares representar os interesses de sua província e governo local – segundo a constituição, eram eleitos, segundo as leis eleitorais da época, três senadores por província, onde um deles era nomeado pelo Poder Moderador para ocupação do cargo até sua morte).

O Poder Judiciário, os juízes dos tribunais eram nomeados pelo Poder Moderador.

O Poder Executivo, até a introdução do parlamentarismo, era presidido também pelo Imperador. Com o parlamentarismo, o governo passou a ser responsabilidade exclusiva do Presidente do Conselho de Ministros (quem realmente governava o Brasil), que era um membro da Assembléia Geral, passando este a prestar contas de todos os negócios e contas relativos ao Governo Imperial, referendados, negados e sancionados todos os seus atos pelo Legislativo e consequentemente pelo Poder Moderador.

Era ainda de delegação exclusiva do Poder Moderador, fechar a Assembléia Geral, demitir juízes do Supremo Tribunal e convocar tropas para cumprimento de estado-de-sítio ou de defesa. Ora, prezado/a leitor/a, o que lemos aqui, notem bem que estas prerrogativas eram delagadas ao Imperador como Chefe-de-Estado, porém em seu longo e próspero reinado, jamais a Assembléia Geral fora fechada arbitrariamente, decretação de estados-de-sítio ou de defesa nem se quer. Para contra-balançar, já na república, seu primeiro ato fora exilar o Grande Imperador e Sua família, sitiar o Rio de Janeiro, por à pique a ex-Esquadra Imperial e tantos outros funestos acontecimentos que nos preenchem de vergonha até nossos dias.

Nesta Constituição de 1824, a Igreja Católica fora reconhecida como ainda religião oficial do Estado, permitindo o culto doméstico ou partitular das demais outras – seu Chefe era o Imperador. Toda e qualquer resolução emitida pelo Vaticano, obrigatoriamente deveria passar pelas do Imperador para ratificação e execução das mesmas resoluções e orientações religiosas.

A Constituição do Império do Brasil pode, assim, ser considerada o grande e mais orgulhoso marco inicial, como Nação, da evolução não somente do Direito Eleitoral Brasileiro, embora não se desconheçam anteriores disposições eleitorais, mas de todo um conjunto de direitos e deveres, coletivos e individuais, verdadeiramente dígna de ser declarada DEMOCRÁTICA para sua época, unido ou não sob a mesma coroa junto à Portugal.

A primeira instrução eleitoral, como Monarquia Constitucional Independente, foi baixada por decreto e, a rigor, deve ser considerada como a primeira lei eleitoral do Brasil.

Entrou em vigor um dia após a outorga da Constituição e vigorou por mais de vinte anos.

Yitzhak Frank Katan

Fonte: avante-camarada.tripod.com

Dia da Constituição Política do Brasil

Carta de Lei de 25 de Março de 1824

1824: Uma contituição Antidemocrática

“Causa-me horror só ouvir falar em revolução”.

Muniz Tavares, antigo revolucionário de 1817 na Assembléia Constituinte (21/mai/1823). Anais do Parlamento Brasileiro – Assembléia Constituinte, 1823, tomo I, Rio de Janeiro, pág. 90.

“Durante as discussões da Constituinte ficou manifesta a intenção da maioria dos deputados de limitar o sentido do liberalismo e de distingui-lo das reivindicações democratizantes. Todos se diziam liberais, mas ao mesmo tempo se confessavam antidemocratas e antirevolucionários. As idéias revolucionárias provocavam desagrado entre os constituintes. A conciliação da liberdade com a ordem seria o preceito básico desses liberais, que se inspiravam em Benjamim Constant e Jean Baptiste Say. Em outras palavras: conciliar a liberdade com a ordem existente, isto é, manter a estrutura escravista de produção, cercear as pretensões democratizantes”.

Emília Viotti da Cost

O primeiro processo constitucional do Brasil iniciou-se com um decreto do príncipe D. Pedro, que no dia 3 de junho de 1822 convocou a primeira Assembléia Geral Constituinte e Legislativa da nossa história, visando a elaboração de uma constituição que formalizasse a independência política do Brasil em relação ao reino português. Dessa maneira, a primeira constituição brasileira deveria ter sido promulgada. Acabou porém, sendo outorgada, já que durante o processo constitucional, o choque entre o imperador e os constituintes, mostrou-se inevitável.

A abertura da Assembléia deu-se somente em 3 de maio de 1823, para que nesse tempo fosse preparado o terreno através de censuras, prisões e exílios aos opositores do processo constitucional.

A) ANTECEDENTES: DIVERGÊNCIAS INTERNAS

O contexto que antecede a Assembléia foi marcado pela articulação política do Brasil contra as tentativas recolonizadoras de Portugal, já presentes na Revolução do Porto em 1820. Neste mesmo cenário, destacam-se ainda, divergências internas entre conservadores e liberais radicais. Os primeiros, representados por José Bonifácio resistiram inicialmente à idéia de uma Constituinte, mas por fim pressionados, acabaram aderindo, com a defesa de uma rigorosa centralização política e a limitação do direito de voto. Já os liberais radicais, por iniciativa de Gonçalves Ledo, defendiam a eleição direta, a limitação dos poderes de D. Pedro e maior autonomia das províncias.

Apesar da corrente conservadora controlar a situação e o texto da convocação da Constituinte ser favorável à permanência da união entre Portugal e Brasil, as Cortes portuguesas exigem o retorno imediato de D. Pedro, que resistiu e acelerou o processo de independência política, rompendo definitivamente com Portugal, a 7 de setembro de 1822. Sofrendo severas críticas de seus opositores e perdendo a confiança do imperador, José Bonifácio e seu irmão Martim Francisco demitiram-se em julho de 1823, assumindo uma oposição conservadora ao governo, através de seus jornais A sentinela da Liberdade e O Tamoio. Rompidas definitivamente as relações com Portugal, o processo para Constituinte tem prosseguimento, discutindo-se a questão dos critérios para o recrutamento do eleitorado que deveria escolher os deputados da Assembléia.

O direito de voto foi estendido apenas à população masculina livre e adulta (mais de 20 anos), alfabetizada ou não. Estavam excluídos religiosos regulares, estrangeiros não naturalizados e criminosos, além de todos aqueles que recebessem salários ou soldos, exceto os criados mais graduados da Casa Real, os caixeiros de casas comerciais e administradores de fazendas rurais e fábricas. Com esta composição social, ficava claro o caráter elitista que acabará predominando na Constituinte, já que retirava-se das camadas populares o direito de eleger seus representantes.

B) O ANTEPROJETO: LIBERAL E ANTIDEMOCRÁTICO

Com um total de 90 membros eleitos por 14 províncias, destacavam-se na Constituinte , proprietários rurais, bacharéis em leis, além de militares, médicos e funcionários públicos. Para elaborar um anteprojeto constitucional, foi designada uma comissão composta por seis deputados sob liderança de Antônio Carlos de Andrada, irmão de José Bonifácio.

O anteprojeto continha 272 artigos influenciados pela ilustração, no tocante à soberania nacional e ao liberalismo econômico. O caráter classista e portanto antidemocrático da carta, ficou claramente revelado com a discriminação dos direitos políticos, através do voto censitário, onde os eleitores do primeiro grau (paróquia), tinham que provar uma renda mínima de 150 alqueires de farinha de mandioca. Eles elegeriam os eleitores do segundo grau (província), que necessitavam de uma renda mínima de 250 alqueires. Estes últimos, elegeriam deputados e senadores, que precisavam de uma renda de 500 e 1000 alqueires respectivamente, para se candidatarem.

A postura elitista do anteprojeto aparece também em outros pontos, como a questão do trabalho e da divisão fundiária. O escravismo e o latifúndio não entraram em pauta, pois colocariam em risco os interesses da aristocracia rural brasileira. Segundo Raymundo Faoro “o esquema procurará manter a igualdade sem democracia, o liberalismo fora da soberania popular”. Tratava-se portanto, de uma adaptação circunstancial de alguns ideais do iluminismo aos interesses da aristocracia rural.

Destaca-se ainda, uma certa xenofobia na carta, que expressava na verdade, uma lusofobia marcadamente anticolonialista, já que as ameaças de recolonização persistiam, tanto no Brasil (Bahia, Pará e Cisplatina), como em Portugal, onde alguns setores do comércio aliados ao clero e ao rei, alcançam uma relativa vitória sobre as Cortes, no episódio conhecido como “Viradeira”. A posição anti-absolutista do anteprojeto, fica clara devido a limitação do poder de D. Pedro I, que além de perder o controle das forças armadas para o parlamento, tem poder de veto apenas suspensivo sobre a Câmara. Dessa forma, os constituintes procuram reservar o poder político para a aristocracia rural, combatendo tanto as ameaças recolonizadoras do Partido Português, como as propostas de avanços populares dos radicais, além do próprio absolutismo de D. Pedro I.

“Afastando o perigo da recolonização; excluindo dos direito político as classes inferiores e praticamente reservando os cargos da representação nacional aos proprietários rurais; concentrando a autoridade política no Parlamento e proclamando a mais ampla liberdade econômica, o projeto consagra todas as aspirações da classe dominante dos proprietários rurais, oprimidos pelo regime de colônia, e que a nova ordem política vinha justamente libertar.” (PRADO JR., Caio. Evolução política do Brasil).

C) A DISSOLUÇÃO DA ASSEMBLÉIA

A posição da Assembléia em reduzir o poder imperial, faz D. Pedro I voltar-se contra a Constituinte e aproximar-se do partido português que defendendo o absolutismo, poderia estender-se em última instância, à ambicionada recolonização. Com a superação dos radicais, o confronto político se polariza entre os senhores rurais do partido brasileiro e o partido português articulado com o imperador. Nesse ambiente de hostilidades recíprocas, o jornal “A Sentinela”, vinculado aos Andradas, publica uma carta ofensiva a oficiais portugueses do exército imperial. A retaliação dá-se com o espancamento do farmacêutico David Pamplona, tido como provável autor da carta. Declarando-se em sessão permanente, a Assembléia é dissolvida por um decreto imperial em 12 de novembro de 1823. A resistência conhecida como “Noite da Agonia” foi inútil . Os irmãos Andradas, José Bonifácio, Martim Francisco e Antônio Carlos, são presos e deportados.

Perdendo o poder que vinham conquistando desde o início do processo de independência, a aristocracia rural recua, evidenciando que a formação do Estado brasileiro não estava totalmente concluída.

“. . . Havendo eu convocado, como tinha direito de convocar, a Assembléia Constituinte Geral e Legislativa, por decreto de 3 de junho do ano passado, a fim de salvar o Brasil dos perigos que lhe estavam iminentes: E havendo esta assembléia perjurado ao tão solene juramento, que prestou à nação de defender a integridade do Império, sua independência, e a minha dinastia: Hei por bem, como Imperador e defensor perpétuo do Brasil, dissolver a mesma assembléia e convocar já uma outra na forma de instruções feitas para convocação desta, que agora acaba, a qual deverá trabalhar sobre o projeto da Constituição que eu lhe ei de em breve lhe apresentar, que será mais duplicamente liberal do que a extinta assembléia acabou de fazer .” (Decreto Da dissolução da Assembléia Constituinte). 12/nov/1823

D) A CONSTITUIÇÃO DE 1824

Foi a primeira constituição de nossa história e a única no período imperial. Com a Assembléia Constituinte dissolvida, D. Pedro I nomeou um Conselho de Estado formado por 10 membros que redigiu a Constituição, utilizando vários artigos do anteprojeto de Antônio Carlos.

Após ser apreciada pelas Câmaras Municipais, foi outorgada (imposta) em 25 de março de 1824, estabelecendo os seguintes pontos:

Um governo monárquico unitário e hereditário.

Voto censitário (baseado na renda) e descoberto (não secreto).

Eleições indiretas, onde os eleitores da paróquia elegiam os eleitores da província e estes elegiam os deputados e senadores. Para ser eleitor da paróquia, eleitor da província, deputado ou senador, o cidadão teria de ter, agora, uma renda anual correspondente a 100, 200, 400, e 800 mil réis respectivamente.

Catolicismo como religião oficial.

Submissão da Igreja ao Estado.

Quatro poderes: Executivo, Legislativo, Judiciário e Moderador. O Executivo competia ao imperador e o conjunto de ministros por ele nomeados. O Legislativo era representado pela Assembléia Geral, formada pela Câmara de Deputados (eleita por quatro anos) e pelo Senado (nomeado e vitalício). O Poder Judiciário era formado pelo Supremo Tribunal de Justiça, com magistrados escolhidos pelo imperador. Por fim, o Poder Moderador era pessoal e exclusivo do próprio imperador, assessorado pelo Conselho de Estado, que também era vitalício e nomeado pelo imperador.

Nossa primeira constituição fica assim marcada pela arbitrariedade, já que de promulgada, acabou sendo outorgada, ou seja, imposta verticalmente para atender os interesses do partido português, que desde o início do processo de independência política, parecia destinado ao desaparecimento. Exatamente no momento em que o processo constitucional parecia favorecer a elite rural, surgiu o golpe imperial com a dissolução da Constituinte e consequente outorga da Constituição. Esse golpe, impedia que o controle do Estado fosse feito pela aristocracia rural, que somente em 1831 restabeleceu-se na liderança da nação, levando D. Pedro I a abdicar.

Fonte: www.historianet.com.br

Dia da Constituição Política do Brasil

Carta de Lei de 25 de Março de 1824

A Constituição de 1824

A Constituição Imperial (1824) foi outorgada, após a dissolução da Assembléia Constituinte, que desagradou aos Liberais, mas agradou aos portugueses do Rio de Janeiro, tanto aos Realistas, quanto aos Sectários.

Após a dissolução da Assembléia, Dom Pedro I, justificando seu ato, declarou que convocaria uma outra Assembléia (…) “a qual deverá trabalhar sobre o projeto de Constituição que eu lhe hei de breve apresentar; que será duplicadamente mais liberal, do que a extinta Assembléia acabou de fazer”.

Entretanto, isto não aconteceu. No dia 26 de novembro de 1823, ou seja, dez dias depois da dissolução, o Imperador organizou o chamado Conselho de Estado. Composto por 10 membros, este tinha por objetivo organizar uma Constituição digna da aprovação Imperial e Dom Pedro I controlava por completo a elaboração do texto constitucional.

Os Liberais Republicanos temiam que Dom Pedro I pretendesse reunir Brasil e Portugal, inutilizando a Independência. Sendo assim, decidiram armar um plano para matar o Monarca. Escolheram para a execução o dia do juramento da Constituição.

A Independência vinha se consolidando, apesar da dissolução da Assembléia e dos planos dos Liberais Republicanos para matar Dom Pedro I. Os últimos focos da resistência portuguesa no Brasil, ou seja, em Montevidéu, desistissem da luta armada, se rendiam e voltavam para Portugal pacificamente.

Nos primeiros dias de 1824 publicou-se o projeto da nova Constituição, mas ao contrário do que se havia prometido, ela não foi julgada por uma Assembléia Nacional. Afirmando que o apoio a ela era geral, D. Pedro I enviou uma cópia para cada Câmara Municipal, esperando uma resposta de apoio.

Porém, como não havia tempo hábil o suficiente para esperar por todas as respostas devido às enormes distâncias existentes no país, haja visto que a única via de comunicação com diversas localidades era a marítimo-fluvial, o Imperador, a Imperatriz, o Bispo e a Câmara Municipal do Rio de Janeiro juraram a Constituição no dia 25 de março de 1824. Esta Constituição estabelecia um Governo monárquico, hereditário, constitucional, representativo e afirmava que (…), “o Império é a associação política a todos os cidadãos brasileiros”. Também estabelecia que “cidadãos brasileiros” eram aqueles que, nascidos no Brasil, fossem “ingênuos” (filhos escravos nascidos livres) ou libertos, além daqueles que, apesar de nascidos em Portugal ou em suas possessões residissem no Brasil (…) “na época em que se proclamou a independência”, e que tivessem aderido a ela.

Na mesma noite, a família Imperial foi ao teatro, onde deveria ser posto em prática o plano dos Liberais Republicanos de assassinar Dom Pedro I. O plano consistia em incendiar o teatro para que no tumulto da saída o Monarca fosse assassinado. Entretanto, logo no princípio do tumulto, a família Imperial deixou o teatro e Dom Pedro I saiu ileso, sem nem ao menos saber do atentado, cuja existência só foi revelada em 1831, após a abdicação.

Esta Carta tinha, entre outras características, um sistema baseado em eleições indiretas e censitárias. Para votar e ser votado apontava requisitos quanto a renda. Isto denotava um caráter excludente na sociedade imperial, já que grande parte da população era composta por homens livres e pobres e por escravos.

Para a Câmara dos Deputados elegia-se inicialmente um corpo eleitoral que, posteriormente, seria responsável pela eleição dos deputados para um período de quatro anos.

A marca mais característica desta Constituição foi a instituição de um quarto poder, o Moderador, ao lado do Executivo, Legislativo e Judiciário. Este quarto poder era exclusivo do monarca e, por ele, o imperador controlava a organização política do Império do Brasil.

Por meio do Poder Moderador o imperador nomeava os membros vitalícios do Conselho de Estado os presidentes de província, as autoridades eclesiásticas da Igreja oficial católica apostólica romana, o Senado vitalício. Também nomeava e suspendia os magistrados do Poder Judiciário, assim como nomeava e destituía os ministros do Poder Executivo.

Utilizando-se deste quarto poder, Dom Pedro I aprovava ou não as decisões da Assembléia Geral, além de convocar ou dissolver a Câmara dos Deputados.

Dessa forma, o imperador concentrava um poder sem paralelo, o que demonstrava o caráter centralizador e autoritário da organização política do Império do Brasil. Tal situação não foi aceita por toda a sociedade imperial. Havia quem aprovasse, quem calasse por temor e quem contestasse. O protesto mais violento partiu da província de Pernambuco e se transformou no episódio conhecido como Confederação do Equador.

A Constituição de 25 de março de 1824 vigorou até 15 de novembro de 1889, ou seja, durante mais de 65 anos.

Declaração de Direitos

Diferente das primeiras Constituições Francesas, a brasileira não se inicia por uma Declaração de Direitos. Os constituintes preferiram colocá-la no final. Sob o título “Das Disposições Geraes, e Garantias dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros”, essa declaração enumera:

“Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte

I. Nenhum Cidadão póde ser obrigado a fazer, ou deixar de fazer alguma cousa, senão em virtude da Lei.

II. Nenhuma Lei será estabelecida sem utilidade publica.

III. A sua disposição não terá effeito retroativo.

IV. Todos podem communicar os seus pensamentos, por palavras, escriptos, e publical-os pela Imprensa, sem dependencia de censura; com tanto que hajam de responder pelos abusos, que commetterem no exercicio deste Direito, nos casos, e pela fórma, que a Lei determinar.

V. Ninguem póde ser perseguido por motivo de Religião, uma vez que respeite a do Estado, e não offenda a Moral Publica.

VI. Qualquer póde conservar-se, ou sahir do Imperio, como lhe convenha, levando comsigo os seus bens, guardados os Regulamentos policiaes, e salvo o prejuizo de terceiro.

VII. Todo o Cidadão tem em sua casa um asylo inviolavel. De noite não se poderá entrar nella, senão por seu consentimento, ou para a defender de incendio, ou inundação; e de dia só será franqueada a sua entrada nos casos, e pela maneira, que a Lei determina.

VIII. Ninguem poderá ser preso sem culpa formada, excepto nos casos declarados na Lei; e nestes dentro de vinte e quatro horas contadas da entrada na prisão, sendo em Cidades, Villas, ou outras Povoações proximas aos logares da residencia do Juiz; e nos logares remotos dentro de um prazo razoavel, que a Lei marcará, attenta à extensão do territorio, o Juiz por uma Nota, por elle assignada, fará constar ao Réo o motivo da prisão, os nomes do seu accusador, e os das testemunhas, havendo-as.

IX. Ainda com culpa formada, ninguem será conduzido á prisão, ou nella conservado estando já preso, se prestar fiança idonea, nos casos que a Lei admitte; e em geral nos crimes, que não tiverem maior pena, do que a de seis mezes de prisão, ou desterro para fóra da Comarca, poderá o Réo livrar-se solto.

X. Á excepção de flagrante delito, a prisão não póde ser executada, senão por ordem escripta da Autoridade legitima. Se esta fôr arbitraria, o Juiz, que a deu, e quem a tiver requerido serão punidos com as penas que a Lei determinar.

O que fica disposto acerca da prisão antes da culpa formada, não comprehende as Ordenanças Militares, estabelecidas como necessarias á disciplina, e recrutamento do Exercito; nem os casos, que não são puramente criminaes, e em que a Lei determina todavia a prisão de alguma pessoa, por desobedecer aos mandados da Justiça, ou não cumprir alguma obrigação dentro de determinado prazo.

XI. Ninguem será sentenciado, senão pela Autoridade competente, por virtude, e na fórma por ella prescripta.

XII. Será mantida a independencia do Poder Judicial. Nenhuma Autoridade poderá avocar as Causas pendentes, sustal-as, ou fazer reviver os Processos findos.

XIII. A Lei será igual para todos, quer proteja, quer castigue, e recompensará em proporção dos merecimentos de cada um.

XIV. Todo o Cidadão pode ser admittido aos Cargos Publicos Civis, Politicos, ou Militares, sem outra differença, que não seja a dos seus talentos, e virtudes.

XV. Ninguem será exempto de contribuir para as despezas do Estado em proporção dos seus haveres.

XVI. Ficam abolidos todos os Privilegios, que não forem essencial e inteiramente ligados aos Cargos, por utilidade publica.

XVII. Á exceção das Causas, que por sua natureza pertencem a Juizos particulares, na conformidade das Leis, não haverá Foro privilegiado, nem Commissões especiaes nas Causas civeis, ou crimes.

XVIII. Organizar-se-há quanto antes um Codigo Civil, e Criminal, fundado nas solidas bases da Justiça e Equidade.

XIX. Desde já ficam abolidos os açoites, a tortura, a marca de ferro quente, e todas as mais penas crueis.

XX. Nenhuma pena passará da pessoa do delinquente. Por tanto, não haverá em caso algum confiscação de bens, nem a infamia do Réo se transmitirá aos seus descendentes em qualquer gráo que seja.

XXI. As Cadeas serão seguras, limpas, e bem arejadas, havendo diversas casas para separação dos Réos, conforme suas circumstancias, e a natureza dos seus crimes.

XXII. É garantido o Direito de Propriedade em toda a sua plenitude. Se o bem publico legalmente verificado exigir o uso, e emprego da Propriedade do Cidadão, será elle previamente indemnisado do valor della. A Lei marcará os casos em que terá logar esta unica excepção, e dará as regras para se determinar a indemnisação.

XXIII. Tambem fica garantida a Divida Publica.

XXIV. Nenhum genero de trabalho, de cultura, industria ou commercio póde ser prohibido, uma vez que não se oponha aos costumes publicos, á segurança, e saude dos Cidadãos.

XXV. Ficam abolidas as Corporações de Officios, seus Juizes, Escrivães, e Mestres.

XXVI. Os inventores terão propriedade das suas descobertas, ou das suas produções. A Lei lhes assegurará um privilegio exclusivo temporario ou lhes remunerará em resarcimento da perda, que hajam de soffrer pela vulgarisação.

XXVII. O Segredo das Cartas é inviolavel. A Administração do Correio fica rigorosamente responsavel por qualquer infração deste Artigo.

XXVIII. Ficam garantidas as recompensas conferidas pelos serviços feitos ao Estado, quer Civis, quer Militares, assim como o direito adquirido a ellas na fórma das Leis.

XXIX. Os Empregados Publicos são estritamente responsaveis pelos abusos e omissões praticados no exercicio das suas funções, e por não fazerem efetivamente responsaveis aos seus subalternos.

XXX. Todo o Cidadão poderá apresentar por escripto ao Poder Legislativo, e ao Executivo reclamações, queixas, ou petições, e até expôr qualquer infração da Constituição, requerendo perante a competente Autoridade a efetiva responsabilidade dos infratores.

XXXI. A Constituição também garante os socorros publicos.

XXXII. A Instrução primaria, é gratuita a todos os Cidadãos.

XXXIII. Collegios, e Universidades, aonde serão ensinados os elementos das Sciencias, Bellas Letras, e Artes.

XXXIV. Os Poderes Constitucionaes não podem suspender a Constituição, no que diz respeito aos direitos individuaes, salvo nos casos, e circumstancias especificadas no paragrapho seguinte.

XXXV. Nos casos de rebelião, ou invasão de inimigos, pedindo a segurança do Estado, que se dispensem por tempo determinado algumas das formalidades, que garantem a liberdade individual, poder-se-há fazer por ato especial do Poder Legislativo. Não se achando porém a esse tempo reunida a Assembléa, e correndo a Patria perigo imminente, poderá o Governo exercer essa mesma providencia, como medida provisoria, e indispensavel, suspendendo-a immediatamente que cesse a necessidade urgente, que a motivou; devendo num, e outro caso, remetter á Assembléa, logo que reunida fôr, uma relação motivada das prisões, e d’outras medidas de prevenção tomadas; e quaesquer Autoridades, que tiverem mandado proceder a ellas, serão responsaveis pelos abusos, que tiverem praticado a esse respeito.

Esta declaração de direitos, relegada ao fim da Constituição, mergulhada entre as Disposições Gerais e entremeada de assuntos específicos, como a extinção das corporações de ofício e a elaboração dos novos Códigos, evidencia o escasso interesse que os constituintes prestaram ao tema. Contudo, se comparado à situação anterior à Independência, o Artigo 179 constitui um avanço considerável na direção do pleno reconhecimento dos direitos humanos.

Os poderes na Constituição do Império

Não foi exatamente essa a aplicação dos princípios de Constant à Constituição de 1824. Precisando de um governo forte e bastante centralizado, o Poder Moderador e a chefia do Executivo foram concentrados no imperador, o que dava a esse cargo uma dimensão muito mais atuante e até potencialmente despótica. Por outra parte, o caráter de imperador não era bem o de um monarca supervisionador, situado acima das decisões do dia-a-dia. D. Pedro era o líder de um país em formação e, tanto por herança do absolutismo quanto por seu caráter francamente temperamental, dificilmente iria se restringir a uma atitude contemplativa e revisora.

O estabelecimento da divisão de poderes é tema do Título III da Constituição:

“Art. 9. A divisão, e harmonia dos Poderes Politicos é o principio conservador dos Direitos dos Cidadãos, e o mais seguro meio de fazer efetivas as garantias, que a Constituição offerece.

Art. 10. Os Poderes Politicos reconhecidos pela Constituição do Imperio do Brazil são quatro: o Poder Legislativo, o Poder Moderador, o Poder Executivo, e o Poder Judicial.

Art. 11. Os Representantes da Nação Brazileira são o Imperador, e a Assembléa Geral.

Art. 12. Todos estes Poderes no Imperio do Brazil são delegações da Nação.”

Observa-se, em tais enunciados, uma explícita ênfase nos “Direitos dos Cidadãos” e nas “garantias, que a Constituição offerece”. Entretanto, a definição de atribuições dos diversos poderes evidencia o interesse em centralizar as decisões e limitar a pluralidade de manifestações, que os redatores viam com certo receio, até justificadamente derivado das recentes experiências internas e externas. Embora caracterizados como “delegações da Nação”, os poderes tenderiam a perpetuar-se às expensas do livre jogo político.

O Poder Moderador está definido no Capítulo I, do Título 5º, indicando:

“Art. 98. O Poder Moderador é a chave de toda a organisação Politica e é delegado privativamente ao Imperador como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro Representante para que incessantemente vele sobre a manutenção da Independencia, equilibrio, e harmonia dos mais Poderes Politicos.”

Consoante os princípios de Constant, a Constituição estabelece:

“Art. 99. A Pessoa do Imperador é inviolavel, e Sagrada: Elle não está sujeito a responsabilidade alguma.”

Em contrapartida, encontra-se no Capítulo VI, do mesmo título, ao definir as responsabilidades do Ministério:

“Art. 133. Os Ministros de Estado serão responsaveis

I. Por traição.

II. Por peita, suborno, ou concussão.

III. Por abuso do Poder.

IV. Pela falta de observancia da Lei.

V. Pelo que obrarem contra a Liberdade, segurança, ou propriedade dos Cidadãos.

VI. Por qualquer dissipação dos bens publicos.”

E, para afastar qualquer dúvida, o mesmo capítulo estabelece:

“Art. 135. Não salva aos Ministros da responsabilidade a ordem do Imperador vocal, ou por escripto.”
Quanto às atribuições do Poder Moderador, a Constituição estabelece as seguintes:

“Art. 101. O Imperador exerce o Poder Moderador
I. Nomeando os Senadores, na fórma do Art. 43.

II. Convocando a Assembléa Geral extraordinariamente nos intervallos das Sessões, quando assim o pede o bem do Imperio.

III. Sanccionando os Decretos e Resoluções da Assembléa Geral para que tenham força de Lei.

IV. Approvando e suspendendo interinamente as Resoluções dos Conselhos Provinciaes.

V. Prorrogando, ou adiando a Assembléa Geral e dissolvendo a Camara dos Deputados, nos casos que o exigir a salvação do Estado; convocando immediatamente outra que a substitua.

VI. Nomeando e demittindo livremente os Ministros de Estado.

VII. Suspendendo os Magistrados nos casos do Art. 154.

VIII. Perdoando e moderando as penas impostas aos Réos condemnados por Sentença.

IX. Concedendo Amnistia em caso urgente, e que assim aconselhem a humanidade, e bem do Estado.”

“O Imperador – consta no Art. 102 – é o Chefe do Poder Executivo, e o exercita pelos seus Ministros de Estado”. “O Poder Legislativo – estabelece o Art. 13 – é delegado á Assembléa Geral com a Sanção do Imperador”. No parecer de Godofredo Autran, insuspeito por ter escrito e lecionado em plena vigência da Constituição imperial, “Dizer-se que o poder legislativo é delegado á assembléa com a sanção do Imperador, é estabelecer o principio de que o Imperador faz parte do poder legislativo”. Fecha-se, assim, o cerco às instituições. A figura do Imperador permeia todas elas. Mais que uma “chave de cúpula”, imóvel e superior na manutenção do equilíbrio das forças sociais, o poder do imperador se estava tornando, simplesmente, uma “chave”, capaz de abrir e fechar todas as portas.

O Poder Representativo

O receio do desbordo das manifestações populares é claramente visível na composição do Poder Legislativo prevista na Constituição. Estruturado em duas câmaras, ele aproxima-se mais ao modelo britânico do que ao americano. Enquanto a Camara dos Deputados “é eletiva, e temporária” (Art. 35), o Senado “é composto de Membros vitalícios” (Art. 40). Porém, não existindo, como na Inglaterra, uma corte de pares decantada pelo tempo, o Senado deveria ser constituído “por eleição Provincial”.

As eleições eram indiretas, “elegendo a massa dos Cidadãos ativos em Assembléas Parochiaes os Eleitores de Provincia, e estes os Representantes da Nação, e Província” (Art. 90). Essa eleição, em degraus, tende a proporcionar um maior controle do processo eleitoral, evitando as surpresas que uma eleição direta poderia acarretar.

Embora o Art. 91 conceda o direito de votar, nas eleições primárias, a todos “os Cidadãos Brazileiros, que estão no gozo de seus direitos políticos” e ainda os “estrangeiros naturalisados”, o 92 exclui desse direito:

“I. Os menores de vinte e cinco annos, nos quaes se não comprehendem os casados, e Officiaes Militares, que forem maiores de vinte e um annos, os Bachareis Formados, e Clerigos de Ordens Sacras.

II. Os filhos familias, que estiverem na companhia de seus pais, salvo se servirem Officios publicos.

III. Os criados de servir, em cuja classe não entram os Guarda-livros, e primeiros caixeiros das casas de commercio, os Criados da Casa Imperial, que não forem de galão branco, e os administradores das fazendas ruraes, e fabricas.

IV. Os Religiosos, e quaesquer, que vivam em Communidade claustral.

V. Os que não tiverem de renda liquida annual cem mil réis por bens de raiz, industria, commercio, ou emprego”.

Nas eleições secundárias, a restrição aumenta. O Art. 94 acrescenta as seguintes exclusões:

“I. Os que não tiverem de renda liquida annual duzentos mil réis por bens de raiz, industria, commercio, ou emprego.

II. Os Libertos.

III. Os criminosos pronunciados em querela ou devassa”.

Para serem deputados, além dos excluídos nas restrições anteriores, excetuam-se (Art. 95):

“I. Os que não tiverem quatrocentos mil réis de renda liquida.

II. Os Estrangeiros naturalisados.

III. Os que não professarem a Religião do Estado”.

Para o cargo de senador, conforme o Art. 45, exige-se como requisitos:

“I. Que seja Cidadão Brazileiro, e que esteja no gozo dos seus Direitos Politicos.

II. Que tenha de idade quarenta annos para cima.

III. Que seja pessoa de saber, capacidade, e virtudes, com preferencia os que tiverem feito serviços á Patria.

IV. Que tenha de rendimento annual por bens, industria, commercio ou empregos, a somma de oitocentos mil réis”.

Finalmente, para o caso dos senadores, o Art. 43 especifica que os candidatos escolhidos serão encaminhados “em listas triplices, sobre as quaes o Imperador escolherá o terço na totalidade da lista”.

Essa gradação de filtros visa, claramente, excluir do processo político as classes inferiores, vistas pelos constituintes como os setores mais instáveis e mais permeáveis às pregações revolucionárias.

Fonte: www.independenciaoumorte.com.br

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