Junqueira Freire
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Lá corre a nuvem negra,
Lá cobre a face ao céu,
Qual lutuoso crepe,
Qual mortuário véu.
E a chuva se despenha
Dos bojos dos bulcões,
E varre e lava a terra
Coos fortes aquilões,
– E a terra vácua e nua,
Qual foi o caos informe,
Quando hórrida caligem
Cerrava a massa enorme.
Eis o terror, – a morte,
Que manda, reina e aterra,
Como um franger de campas,
Como um bradar de guerra.
Não temas, não, donzela,
O estrépito do raio;
Não te esmoreça o peito
Em tímido desmaio.
Mas antes vem, donzela,
Medrosa muito embora,
Perder comigo o medo
Que as faces te descora.
Mas antes vem, correndo,
Qual pávida criança,
Saltando leve e leve,
Como o girar da dança.
Vem aninhar-te à pressa
Cá dentro de meu peito;
– Aqui não entra o gelo
Desse pegão desfeito.
Embora neve o éter,
Palor a terra embora:
Embora! – aqui no peito
Calor constante mora.
Vem aprender comigo
Como se adora o Eterno;
Quer arda o sol formoso,
Quer sofre o fio invernoso;
Quer seja dia ou noite,
Quer seja mar ou terra,
Quer seja calma ou brisa,
Quer seja paz ou guerra.
Que belo é ver o éter
Cortado pelo raio,
E um coração de virgem
Estanque entre o desmaio!
Ó Deus! – eis como queres
Que se te adore e ame:
Não és, não és tirano,
– Pesar do ímpio infame.
Pesar de vãos devotos,
Pesar de vãos ateus,
Ou és clemência e amor,
Ou já não foras Deus.
Teu rosto lindo, ó virgem,
Prova o saber superno:
Por mim – eu hei de amar-te,
Lavor das mãos do Eterno.
Hei de cingir-te, ó virgem,
Na fronte de minha alma,
Qual cívico laurel,
Qual trinfante palma.
Hei de apertar-te, ó virgem,
Aos pulsos de meu peito,
– Onde não entra o gelo
Desse pegão desfeito.
Embora estejas fria,
Embora temerosa,
Hás de adornar-me o peito,
Como um botão de rosa.
Que importa o céu nublado,
Que importa o éter denso,
Que importa o caos medonho,
Que importa o raio intenso?
É belo pra meu gênio
Nos céus ver tanta guerra,
E te abraçar, ó virgem,
Em paz aqui na terra!
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