Definição
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Pelo termo Renascimento (“Novo Nascimento”), usada no seu sentido mais restrito, entende-se que um novo entusiasmo para a literatura clássica, aprendizado e arte que surgiu na Itália para o fim da Idade Média, e que durante o curso dos séculos XV e XVI deu uma nova cultura para a Europa.
Usando a palavra em um sentido um pouco mais amplo, podemos definir a Renascença como a reentrada no mundo do que secular, inquirir, espírito auto-suficientes que caracterizou a vida ea cultura da antiguidade clássica. Isto é simplesmente a dizer que sob a influência do renascimento intelectual dos homens da Europa Ocidental chegou a pensar e sentir, para encarar a vida eo mundo exterior, assim como os homens da Grécia e Roma antigas; e isso novamente é simplesmente dizer que eles deixaram de pensar e sentir como os homens medievais e começou a pensar e sentir como os homens modernos.
O que é
Renascimento é o nome que se dá a um grande movimento de mudanças culturais, que atingiu as camadas urbanas da Europa Ocidental entre os séculos XIV e XVI, caracterizado pela retomada dos valores da cultura greco-romana, ou seja, da cultura clássica. Esse momento é considerado como um importante período de transição envolvendo as estruturas feudo capitalistas.
As bases desse movimento eram proporcionadas por uma corrente filosófica reinante, o humanismo, que descartava a escolástica medieval, até então predominante, e propunha o retorno às virtudes da antiguidade. Platão, Aristóteles, Virgílio, Sêneca e outros autores greco-romanos começam a ser traduzidos e rapidamente difundidos.
O movimento renascentista envolveu uma nova sociedade e, portanto novas relações sociais em seu cotidiano. A vida urbana passou a implicar um novo comportamento, pois o trabalho, a diversão, o tipo de moradia, os encontros nas ruas, implicavam por si só um novo comportamento dos homens. Isso significa que o Renascimento não foi um movimento de alguns artistas, mas uma nova concepção de vida adotada por uma parcela da sociedade, e que será exaltada e difundida nas obras de arte.
Apesar de recuperar os valores da cultura clássica, o Renascimento não foi uma cópia, pois utilizava-se dos mesmos conceitos, porém aplicados de uma nova maneira à uma nova realidade.
Assim como os gregos, os homens modernos valorizaram o antropocentrismo: O homem é a medida de todas as coisas; o entendimento do mundo passava a ser feito a partir da importância do ser humano, o trabalho, as guerras, as transformações, os amores, as contradições humanas tornaram-se objetos de preocupação, compreendidos como produto da ação do homem.
Uma outra característica marcante foi o racionalismo, isto é, a convicção de que tudo pode ser explicado pela razão do homem e pela ciência, a recusa em acreditar em qualquer coisa que não tenha sido provada; dessa maneira o experimentalismo, a ciência, conheceram grande desenvolvimento. O individualismo também foi um dos valores renascentistas e refletiu a emergência da burguesia e de novas relações de trabalho.
A idéia de que cada um é responsável pela condução de sua vida, a possibilidade de fazer opções e de manifestar-se sobre diversos assuntos acentuaram gradualmente o individualismo. É importante percebermos que essa característica não implica o isolamento do homem, que continua a viver em sociedade, em relação direta com outros homens, mas na possibilidade que cada um tem de tomar decisões.
Foi acentuada a importância do estudo da natureza; o naturalismo aguçou o espírito de observação do homem. O hedonismo representou o culto ao prazer, ou seja, a idéia de que o homem pode produzir o belo, pode gerar uma obra apenas pelo prazer que isso possa lhe proporcionar, rompendo com o pragmatismo.
O Universalismo foi uma das principais características do Renascimento e considera que o homem deve desenvolver todas as áreas do saber; podemos dizer que Leonardo da Vinci é o principal modelo de homem universal, matemático, físico, pintor e escultor, estudou inclusive aspectos da biologia humana.
Itália: O Berço do Renascimento
Esse é uma expressão muito utilizada, apesar de a Itália ainda não existir como nação. A região italiana estava dividida e as cidades possuíam soberania. Na verdade o Renascimento desenvolveu-se em algumas cidades italianas, principalmente aquelas ligadas ao comércio.
Desde o século XIII, com a reabertura do Mediterrâneo, o comércio de várias cidades italianas com o oriente intensificou-se, possibilitando importantes transformações, como a formação de uma camada burguesa enriquecida e que necessitava de reconhecimento social.
O comércio comandado pela burguesia foi responsável pelo desenvolvimento urbano, e nesse sentido, responsável por um novo modelo de vida, com novas relações sociais onde os homens encontram-se mais próximos uns dos outros. Dessa forma podemos dizer que a nova mentalidade da população urbana representa a essência dessas mudanças e possibilitará a Produção Renascentista.
Podemos considerar ainda como fatores que promoveram o renascimento italiano, a existência de diversas obras clássicas na região, assim como a influência dos sábios bizantinos, homens oriundos principalmente de Constantinopla, conhecedores da língua grega e muitas vezes de obras clássicas.
A Produção Renascentista
É necessário fazer uma diferenciação entre a cultura renascentista; aquela caracterizada por um novo comportamento do homem da cidade, a partir de novas concepções de vida e de mundo, da Produção Renascentista, que representa as obras de artistas e intelectuais, que retrataram essa nova visão de mundo e são fundamentais para sua difusão e desenvolvimento.
Essa diferenciação é importante para que não julguemos o Renascimento como um movimento de alguns grandes homens, mas como um movimento que representa uma nova sociedade, urbana caracterizada pelos novos valores burguesas e ainda associada à valores cristãos.
O mecenato, prática comum na Roma antiga, foi fundamental para o desenvolvimento da produção intelectual e artística do renascimento. O Mecenas era considerado como protetor, homem rico, era na prática quem dava as condições materiais para a produção das novas obras e nesse sentido pode ser considerado como o patrocinador, o financiador.
O investimento do mecenas era recuperado com o prestígio social obtido, fato que contribuía com a divulgação das atividades de sua empresa ou instituição que representava. A maioria dos mecenas italianos eram elementos da burguesia, homens enriquecidos com o comércio e toda a produção vinculada à esse patrocínio foi considerada como Renascimento Civil.
Encontramos também o Papa e elementos da nobreza praticando o mecenato, sendo que o Papa Júlio II foi o principal exemplo do que denominou-se Renascimento Cortesão.
A Expansão do Renascimento
No decorrer do século XVI a cultura renascentista expandiu-se para outros países da Europa Ocidental e para que isso ocorresse contribuíram as guerras e invasões vividas pela Itália. As ocupações francesa e espanhola determinaram um conhecimento melhor sobre as obras renascentistas e a expansão em direção a outros países, cada um adaptando-o segundo suas peculiaridades, numa época de formação do absolutismo e de início do movimento de Reforma Religiosa.
O século XVI foi marcado pelas grandes navegações, num primeiro momento vinculadas ao comércio oriental e posteriormente à exploração da América. A navegação pelo Atlântico reforçaram o capitalismo de Portugal, Espanha e Holanda e em segundo plano da Inglaterra e França. Nesses países atlânticos desenvolveu-se então a burguesia e a mentalidade renascentista.
Esse movimento de difusão do Renascimento coincidiu com a decadência do Renascimento Italiano, motivado pela crise econômica das cidades, provocada pela perda do monopólio sobre o comércio de especiarias.
A mudança do eixo econômico do Mediterrâneo para o Atlântico determinou a decadência italiana e ao mesmo tempo impulsionou o desenvolvimento dos demais países, promovendo reflexos na produção cultural.
Outro fator fundamental para a crise do Renascimento italiano foi a Reforma Religiosa e principalmente a Contra Reforma. Toda a polêmica que desenvolveu-se pelo embate religioso fez com que a religião voltasse a ocupar o principal espaço da vida humana; além disso, a Igreja Católica desenvolveu um grande movimento de repressão, apoiado na publicação do INDEX e na retomada da Inquisição que atingiu todo indivíduo que de alguma forma de opusesse a Igreja. Como o movimento protestante não existiu na Itália, a repressão recaiu sobre os intelectuais e artistas do renascimento.
Contexto Histórico
As conquistas marítimas e o contato mercantil com a Ásia ampliaram o comércio e a diversificação dos produtos de consumo na Europa a partir do século XV. Com o aumento do comércio, principalmente com o Oriente, muitos comerciantes europeus fizeram riquezas e acumularam fortunas. Com isso, eles dispunham de condições financeiras para investir na produção artística de escultores, pintores, músicos, arquitetos, escritores, etc.
Os governantes europeus e o clero passaram a dar proteção e ajuda financeira aos artistas e intelectuais da época. Essa ajuda, conhecida como mecenato, tinha por objetivo fazer com que esses mecenas (governantes e burgueses) se tornassem mais populares entre as populações das regiões onde atuavam. Neste período, era muito comum as famílias nobres encomendarem pinturas (retratos) e esculturas junto aos artistas.
Foi na Península Itálica que o comércio mais se desenvolveu neste período, dando origem a uma grande quantidade de locais de produção artística. Cidades como, por exemplo, Veneza, Florença e Gênova tiveram um expressivo movimento artístico e intelectual. Por este motivo, a Itália passou a ser conhecida como o berço do Renascimento.
Leonardo da Vinci (1452-1519)
Leonardo da Vinci nasceu em Vinci, próximo a Florença, na Itália, em 15 de abril de 1452. Filho ilegítimo do notário florentino Ser Piero e de uma camponesa, foi criado pelo pai. Ao revelar vocação para a pintura e o desenho, empregou-se como aprendiz do escultor e pintor Andrea del Verrocchio, por volta de 1467.
Trabalhou com Verrocchio até 1477 e, nos quatro anos seguintes, sozinho.
Por volta de 1480 começou a pintar “São Jerônimo”, que deixou inacabado. No ano seguinte mudou-se para Milão e trabalhou na “Adoração dos magos”, encomenda dos monges de San Donato, em Scopeto.
Também inacabada, essa é a primeira tela que pode ser atribuída com segurança a Leonardo. Nela se percebe o gênio do artista que, embora se considerasse continuador direto de Giotto e de Masaccio, já não apresentava em sua pintura semelhança alguma com a tendência plástico-formal própria da escola florentina do Renascimento.
A serviço de Ludovico Sforza, desenvolveu vários projetos de engenharia militar, realizou estudos hidráulicos sobre os canais da cidade e, como diretor das festas promovidas pela corte, organizou competições, representações e torneios, para muitos dos quais desenhou cenários e figurinos.
Dedicou-se também ao estudo da anatomia, física, botânica, geologia e matemática. Nesse período, pintou algumas de suas obras-primas – a primeira versão da “Virgem dos rochedos” (c. 1483) e a “Última ceia” (1495-1497) -, decorou a Sala delle Asse (c. 1498) e trabalhou numa estátua eqüestre de Francesco Sforza, jamais fundida em bronze.
Iniciou nessa fase a redação dos manuscritos do Trattato della pittura, cuja primeira edição impressa data de 1651.
Quando, em 1499, tropas francesas invadiram Milão, Leonardo voltou para Florença, já como artista consagrado. Em 1502 decidiu acompanhar Cesare Borgia na campanha de Romagna, como arquiteto e engenheiro militar.
No ano seguinte estava de volta a Florença, onde, durante o cerco de Pisa, desenvolveu um projeto para desviar o curso do rio Arno, de forma a cortar o acesso da cidade ao mar. No mesmo ano, começou a pintar “Mona Lisa”, uma de suas obras mais conhecidas e na qual a arte da pintura atinge um de seus grandes momentos.
Iniciou também o quadro “Leda”, conhecido apenas por intermédio de cópias, que parece ter sido o único nu de toda a sua obra, e, com Michelangelo, cujo prestígio já começava a superar o seu, decorou a sala do conselho do Palazzo Vecchio. Michelangelo pintou uma cena da batalha de Cascina, enquanto Leonardo pintava a “Batalha de Anghiari”. Nenhum dos dois trabalhos foi concluído.
Entre 1506 e 1513 Leonardo novamente residiu em Milão, onde tornou-se conselheiro artístico do governador francês, Charles d’Amboise, e projetou para ele um novo palácio. Com o restabelecimento da dinastia Sforza, Leonardo foi para Roma, em 1513, onde permaneceu sob a proteção de Giuliano de Medici, irmão do papa Leão X.
Nessa época, aprofundou suas pesquisas ópticas e matemáticas. Depois da morte de Giuliano, em 1516, Leonardo foi para Amboise, a convite de Francisco I, que o nomeou primeiro-pintor, engenheiro e arquiteto do rei. Continuou então os estudos de hidráulica, ao mesmo tempo em que organizou cadernos de apontamentos e preparou festas para a corte.
Leonardo voltou sua curiosidade para todos os campos do saber e da arte, e em cada um deles afirmou seu gênio. Apesar de não ter realizado as grandes obras com que sonhava na pesquisa científica, a vasta informação contida em seus apontamentos e desenhos é suficiente para demonstrar a universalidade de seu saber.
Ao estudo da estática e da dinâmica dedicou algumas de suas pesquisas mais valiosas. Baseou-se na leitura da obra de Aristóteles e de Arquimedes, às quais foi um dos primeiros a acrescentar contribuição original.
Da Vinci estudou ainda as condições de equilíbrio sobre um plano inclinado e enunciou o teorema do polígono de sustentação da balança. Realizou pesquisas originais sobre os centros de gravidade — no que antecipou-se a Galileu — e idealizou uma máquina destinada a testar a resistência dos fios metálicos à tração. Ainda no domínio da física, estudou os efeitos do atrito e enunciou definições para força, percussão e impulso.
A partir do vôo dos pássaros, Leonardo determinou os princípios da construção de um aparelho mais pesado do que o ar, capaz de voar com a ajuda da força do vento. Entre seus desenhos incluem-se esboços de um aparelho bastante parecido com o helicóptero moderno e o esquema de um pára-quedas.
De sua atividade como projetista militar destacam-se os vários desenhos de canhões, metralhadoras, carros de combate, pontes móveis e barcos, bem como estudos sobre a melhor maneira de abordagem de um barco grande por um pequeno, o esquema de um submarino e bombardas. Leonardo inventou também máquinas hidráulicas destinadas à limpeza e dragagem de canais, máquinas de fiar, trivelas, tornos e perfuratrizes. Também antecipou-se aos urbanistas com seus projetos de cidades.
Características
No Trattato della pittura, Leonardo da Vinci defendeu essa forma de arte como indispensável à realização da exploração científica da natureza e aconselhou os pintores a não se limitarem à expressão estática do ser humano.
Utilizava ao pintar todos os seus conhecimentos científicos: suas figuras humanas derivavam diretamente dos estudos de anatomia, enquanto as paisagens revelavam o conhecimento de botânica e geologia.
Muitas de suas obras se perderam, foram destruídas ou ficaram inacabadas. Conhecem-se apenas cerca de 12 telas de Leonardo de autenticidade indiscutível. Ao longo de sua obra, é visível a importância cada vez maior que o artista concede aos contrastes entre luz e sombra, e, principalmente, ao movimento. Com o sfumato, que dilui as figuras humanas na atmosfera, Leonardo realizou síntese admirável entre modelo e paisagem.
A “Última ceia”, um dos quadros mais famosos do mundo, foi muito danificada e sofreu diversas restaurações, motivo pelo qual pouco resta do original. É inigualável, no entanto, a solidão de Cristo, em contraste com a agitação dos apóstolos, dividos em grupos de três. Judas, o traidor, é a única figura em isolamento entre eles. Os vários estudos e desenhos de Leonardo revelam a preocupação do autor com os menores detalhes da cena.
Pouco antes de morrer, no castelo de Cloux, perto de Amboise, na França, em 2 de maio de 1519, nomeou seu discípulo predileto, Francisco Melzi, herdeiro de todos os valiosos estudos, desenhos e anotações que deixava. Melzi preservou cuidadosamente a herança, mas com sua morte, cerca de cinqüenta anos após a morte do mestre, os manuscritos se dispersaram. Conservaram-se cerca de 600 desenhos, que representam talvez a terça parte da vasta produção de Leonardo da Vinci.
Michelangelo Buonarroti (1475-1564)
Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni nasceu em 6 de março de 1475 em Caprese, localidade próxima à cidade toscana de Arezzo, Itália.
Quando ainda era criança, sua família mudou-se para Florença, onde, em 1488, entrou como aluno para o ateliê do pintor Domenico Ghirlandaio, com quem aprendeu as técnicas de afresco e painel. No ano seguinte, graças ao mecenato de Lourenço o Magnífico, passou a estudar escultura com Bertoldo di Giovanni no jardim onde a família senhorial de Florença conservava uma valiosa coleção de esculturas antigas.
Após a morte de Lourenço, em 1492, e pouco antes da expulsão da família Medici pelo pregador e reformador religioso Girolamo Savonarola, Michelangelo fugiu para Bolonha, onde, sob a influência de Jacopo della Quercia, esculpiu três estátuas para o túmulo de são Domingos.
De volta a Florença, esculpiu em madeira a “Crucificação” (autenticada somente em 1965), que doou a uma igreja em agradecimento por lhe terem permitido estudar os cadáveres ali conservados.
Em 1496 mudou-se para Roma, onde esculpiu “Baco”, antes de voltar-se para a temática de inspiração religiosa que dominaria sua arte a partir de 1498. Sua grande obra do período é a “Pietà” de mármore que se encontra na basílica de São Pedro, em Roma, na qual a cena trágica contrasta com a serenidade do juveníssimo rosto da Virgem.
Retornou a Florença e, em 1501, recebeu o encargo de realizar as 15 figuras da capela Piccolomini da catedral de Siena e o colossal “Davi” de mármore, concluído em 1504. Essa estátua, hoje na Academia de Belas-Artes de Florença, veio a converter-se na encarnação do espírito e da força da cidade.
No mesmo ano, o artista começou a pintar o afresco “Batalha de Cascina” para a sala do conselho do Palazzo Vecchio florentino. Essa grande pintura, posteriormente destruída, suscitou certa rivalidade entre Michelangelo e Leonardo da Vinci, que estava pintando “A batalha de Anghiari” na parede oposta.
O papa Júlio II chamou o já célebre gênio toscano a Roma, em 1505, para encarregá-lo de um grande mausoléu com mais de quarenta figuras em tamanho natural. O projeto, que não chegou a ser concluído, acarretou muitos problemas para Michelangelo, desde assistência inadequada na execução do projeto a falta de pagamento. O escultor desentendeu-se então com o papa e fugiu de Roma.
Em Florença, Piero Solderini convenceu-o a desculpar-se. Júlio II lhe encomendou então uma estátua em bronze para a igreja de São Petrônio, concluída em 1508. Nesse mesmo ano, Michelangelo recebeu o primeiro pagamento do papa para iniciar a ampliação da capela Sistina, cujos afrescos pintou até 1512.
Embora tenha trabalhado como pintor a contragosto, pois preferia a escultura, realizou na capela Sistina afrescos tidos como a expressão máxima da arte pictórica do Renascimento.
Em 1513 o artista finalmente conseguiu renegociar o contrato do mausoléu com os herdeiros de Júlio II. O projeto foi reduzido e Michelangelo idealizou para o sepulcro sua célebre estátua “Moisés”, de mármore, e duas figuras torturadas de escravos.
Os Medici haviam retomado o poder em Florença em 1512, e os papas Leão X e Clemente VII, membros dessa família, encarregaram Michelangelo de vários projetos a serem realizados em Florença, onde o artista residiu ocasionalmente entre 1514 e 1534.
Em 1520, Michelangelo comprometeu-se a projetar uma capela mortuária na igreja de São Lourenço, que deveria abrigar os sepulcros da família Medici e, em 1524, Clemente VII encarregou-o do projeto da Biblioteca Laurenziana.
No mausoléu dos Medici, as estátuas de Juliano e Lourenço o Magnífico, dispostas em nichos sobre as tumbas, representaram um novo ponto de partida no campo da escultura funerária.
Sob elas, Michelangelo acrescentou quatro figuras em mármore que representam o mundo terreno em gradações do dia: “Aurora”, “Dia”, “Crepúsculo” e “Noite”. Também construiu o recinto solene da capela que, apesar da extrema simplicidade das linhas arquitetônicas, é para muitos a maior obra do artista.
No período republicano que se seguiu à queda dos Medici, Michelangelo colaborou ativamente na vida pública florentina e projetou a fortificação da cidade contra os ataques dos exércitos papal e imperial.
Derrotada Florença, e com os Medici de novo no poder, o artista concluiu a obra do sepulcro. Em 1534, nomeado pelo papa Paulo III escultor, pintor e arquiteto oficial do Vaticano, fixou residência definitiva em Roma.
Entre 1536 e 1541, realizou no altar da capela Sistina o grande afresco “Juízo final”. A gigantesca composição aparece dominada pela vigorosa figura de Cristo que, como juiz universal, ordena a salvação dos bem-aventurados e o castigo dos pecadores. A obra reflete de forma dramática as inquietudes espirituais do já idoso Michelangelo.
Em seus últimos anos de vida, os encargos e projetos do artista foram principalmente obras de arquitetura. A partir de 1546, criou as janelas do segundo andar e a grande ante-sala do Palazzo Farnese, em Roma.
Em 1538, já tinha transferido a estátua antiga do imperador Marco Aurélio para o centro da praça do Capitólio, que ele reurbanizou. Entre 1561 e 1564 construiu, dentro das ruínas das termas de Diocleciano, a grande igreja Santa Maria degli Angeli.
A partir de 1547, dirigiu os trabalhos da basílica de São Pedro; a grande cúpula da basílica é de sua autoria. Entre as esculturas de seus últimos anos, destaca-se a “Pietà Rondanini”.
Alternou o trabalho em outras áreas com a criação de uma obra poética de grande sensibilidade, escrita a partir de 1530. O conjunto de seus textos, com justiça caracterizados como uma “biografia espiritual”, reúne mais de 300 sonetos, madrigais e outros tipos de poemas, inclusive fragmentos inacabados.
Celebrado como grande personalidade artística de seu tempo, Michelangelo morreu em Roma, em 18 de fevereiro de 1564, aos 88 anos de idade.
Rafael (Rafaello Sanzio) – 1483-1520
Raffaello Sanzio, conhecido em português como Rafael, nasceu em Urbino, então capital do ducado do mesmo nome, na Itália, em 6 de abril de 1483. Seu pai, Giovanni Santi, era pintor de poucos méritos mas homem culto e bem relacionado na corte do duque Federico de Montefeltro.
Transmitiu ao filho, de precoce talento, o amor pela pintura e as primeiras lições do ofício. O duque, personificação do ideal renascentista do príncipe culto, encorajara todas as formas artísticas e transformara Urbino em centro cultural, a que foram atraídos homens como Donato Bramante, Piero della Francesca e Leone Battista Alberti.
Após a morte do pai, em 1494, Rafael foi para Perugia, onde aprendeu com Pietro Perugino a técnica do afresco ou pintura mural. Em sua primeira obra de realce, “O casamento da Virgem” (1504), a influência de Perugino evidencia-se na perspectiva e na relação proporcional entre as figuras, de um doce lirismo, e a arquitetura. A disposição das figuras é, no entanto, mais informal e animada que a do mestre.
Florença. No outono de 1504, Rafael foi a Florença, atraído pelos trabalhos que estavam sendo realizados, no Palazzo della Signoria, por Leonardo da Vinci e Michelangelo. Sob a influência sobretudo da obra de Da Vinci, absorveu a estética renascentista e executou diversas madonas, entre as quais a “Madona Esterházy” e “A bela jardineira”.
Fez uso das grandes inovações introduzidas na pintura por Da Vinci a partir de 1480: o claro-escuro, contraste de luz e sombra que empregou com moderação, e o esfumado, sombreado levemente esbatido, ao invés de traços, para delinear as formas. A influência de Michelangelo, patente na “Pietà” e na “Madona do baldaquino”, consistiu sobretudo na exploração das possibilidades expressivas da anatomia humana.
Roma
Por sugestão de Bramante, seu amigo e arquiteto do Vaticano, Rafael foi chamado a Roma pelo papa Júlio II em 1508. Nos 12 anos em que permaneceu nessa cidade incumbiu-se de numerosos projetos de envergadura, nos quais deu mostras de uma imaginação variada e fértil. Dos afrescos do Vaticano, os mais importantes são a “Disputa” (ou “Discussão do Santíssimo Sacramento”) e a “Escola de Atenas”, ambos pintados na Stanza della Segnatura.
O primeiro, que mostra uma visão celestial de Deus, seus profetas e apóstolos a encimar um conjunto de representantes da igreja, equipara a vitória do catolicismo à afirmação da verdade. Já a “Escola de Atenas” é uma alegoria complexa do conhecimento filosófico profano. Mostra um grupo de filósofos de várias épocas históricas ao redor de Aristóteles e Platão, ilustrando a continuidade histórica do pensamento platônico.
Após a morte de Júlio II, em 1513, a decoração dos aposentos pontifícios prosseguiu sob o novo papa, Leão X, até 1517.
Apesar da grandiosidade do empreendimento, cujas últimas partes foram deixadas principalmente por conta de seus discípulos, Rafael, que então se tornara o pintor da moda, assumiu ao mesmo tempo numerosas outras tarefas: criou retratos, altares, cartões para tapeçarias, cenários teatrais e projetos arquitetônicos de construções profanas e igrejas como a de Sant’Eligio degli Orefici. Tamanho era seu prestígio que, segundo o biógrafo Giorgio Vasari, Leão X chegou a pensar em fazê-lo cardeal.
Em 1514, com a morte de Bramante, Rafael foi nomeado para suceder-lhe como arquiteto do Vaticano e assumiu as obras em curso na basílica de São Pedro, onde substituiu a planta em cruz grega, ou radial, por outra mais simples, em cruz latina, ou longitudinal. Sucedeu também a Bramante na decoração das loggias (galerias) do Vaticano, aí realizando composições de lírica simplicidade que pareciam contrabalançar a aterradora grandeza da capela Sistina pintada por Michelangelo.
Competente pesquisador interessado na antiguidade clássica, Rafael foi designado, em 1515, para supervisionar a preservação de preciosas inscrições latinas em mármore. Dois anos depois, foi nomeado encarregado geral de todas as antiguidades romanas, para o que executou um mapa arqueológico da cidade. Sua última obra, a “Transfiguração”, encomendada em 1517, desvia-se da serenidade típica de seu estilo para prefigurar coordenadas de um novo mundo turbulento — o da expressão barroca.
Em conseqüência da profundidade filosófica de muitos de seus trabalhos, a reputação de humanista e pensador neoplatônico de Rafael implantou-se em Roma. Entre seus amigos havia respeitados homens de letras, como Castiglione e Pietro Aretino, além de muitos artistas. Em 1519 ele projetou os cenários para a comédia I suppositi, de Ludovico Ariosto. Coberto de honrarias, Rafael morreu em Roma em 6 de abril de 1520.
Características
Leonardo Da Vinci introduziu o conceito do chiaroscuro (o claro-escuro). Michelangelo, por sua vez, recriou a concepção helênica da luta do homem contra o Universo. Rafael foi além e contrastou com o temperamento forte e impulsivo de seus contemporâneos. Empreendeu, com doçura, a busca de uma beleza racional e serena.
Sua pintura expressou o belo idealizado, muito mais próxima dos conceitos da Antiguidade Clássica, e as primeiras obras revelaram a intensa influência que teve com o trabalho de Perugino. Nessas telas, as tonalidades eram sempre claras e os exemplos dessa fase são Sonho de Cavaleiro, Madona do Livro e Três Graças.
A influência de Perugino aparece, ainda, na obra Núpcias da Virgem. Atento, ele também assimilou influências de Leonardo Da Vinci e Michelangelo. Inspirado neste último, e em Frei Bartolomeu, adotou a composição piramidal em A Bela Jardineira. Em Dama com Unicórnio é sensível a influência da Monalisa, de Da Vinci, Cuja predileção pelo chiaroscuro animou-o também na produção de São Jorge e o Dragão.
A ideologia renascentista está também nas madonas de Rafael. Uma das mais famosas é a Madona Sistina, descalça e sem auréola, o que suscitou muita discussão a respeito. A Madona da Poltrona trouxe figuras mais carnais do que místicas, e a placidez demonstrou uma beatitude sobrenatural.
Em sua maioria, os temas desenvolvidos por ele eram religiosos, como em a Libertação de São Pedro, um dos oito afrescos que decoram a Stanza di Eliodoro, no Vaticano. Nesse trabalho, a grande protagonista é a luz que emana do anjo e ilumina a cena. Esse jogo de luzes seria muito usado pelo artista holandês Rembrandt, no século seguinte.
Para decorar o local, Rafael pintou um grande afresco dividido em vários instantes, como a Discussão do Santíssimo Sacramento, que representa a ciência divina, a Escola de Atenas, simbolizando o conhecimento humano, e o Parnaso, em que a poesia faz a ponte entre Deus e os homens. Na Escola de Atenas, o artista revelou seu talento de retratista ao adequar personalidades do seu tempo aos trajes dos antigos filósofos.
Como pintor da moda, ele vivia tão atarefado que muitas telas foram transferidas para os seus assistentes. Foi o que ocorreu com a maior parte da decoração da Farnesina, residência de verão do poderoso banqueiro Chigi. É provável que Rafael tenha pintado apenas o afresco Galatea.
Uma de suas obras-primas irretocáveis é o Retrato de Cardeal, na qual, além de ter registrado perfeitamente a figura humana, o mestre renascentista captou as características emocionais do personagem. Nessa obra, ele conseguiu estabelecer, por meio de contraste cromético, um jogo de textura como se o espectador pudesse ter a sensação de sentir como se fossem reais as vestes do religioso. Oswaldo S. Neto
Renascimento – Início
Esse movimento começou na Itália no século 14 e do termo, que literalmente significa renascimento, descreve o renascimento do interesse nas realizações artísticas do mundo clássico.
Inicialmente em um renascimento literário Renaissance estava determinado a afastar-se da religião dominada pelos Idade Média e orientar a sua atenção para a situação do homem indivíduo na sociedade. Era uma época em que a expressão individual e experiência mundana se tornaram dois dos principais temas da arte renascentista.
O movimento devia muito à sofisticação crescente da sociedade, caracterizada pela estabilidade política, crescimento econômico e cosmopolitismo. Educação floresceu neste momento, com bibliotecas e academias que permitem uma pesquisa mais aprofundada para ser conduzida para a cultura do mundo antigo.
Além disso, as artes beneficiou do patrocínio de tais grupos influentes como a família Medici de Florença, a família Sforza de Milão e papas Júlio II e Leão X. Os trabalhos de Petrarca exibido pela primeira vez o novo interesse nos valores intelectuais do mundo clássico no início do século 14 eo romance desta época como redescoberto no período do Renascimento pode ser vista expresso por Boccaccio.
Leonardo da Vinci era o homem de renascimento arquétipo que representa os valores humanistas do período em sua arte, ciência e escrita. Michelangelo e Raphael também foram figuras vitais nesse movimento, produzindo trabalhos considerados por séculos como incorporando a noção clássica de perfeição. Arquitetos renascentistas incluído Alberti, Brunelleschi e Bramante.
Muitos desses artistas vieram de Florença e manteve-se um importante centro para o Renascimento até o século 16, eventualmente, a ser ultrapassado por Roma e Veneza. Algumas das idéias do Renascimento italiano se espalhou para outras partes da Europa, por exemplo, para o artista alemão Albrecht Dürer da ‘Renascença do Norte’. Mas nos anos 1500 Maneirismo tinha ultrapassado o Renascimento e foi esse estilo que pegou na Europa.
Características do Renascimento Cultural
O Renascimento significou uma nova arte, o advento do pensamento científico e uma nova literatura.
Nelas estão presentes as seguintes características:
a- antropocentrismo (o homem no centro): valorização do homem como ser racional. Para os renascentistas o homem era visto como a mais bela e perfeita obra da natureza. Tem capacidade criadora e pode explicar os fenômenos à sua volta.
b- otimismo: os renascentistas acreditavam no progresso e na capacidade do homem de resolver problemas. Por essa razão apreciavam a beleza do mundo e tentavam captá-la em suas obras de arte.
c- racionalismo: tentativa de descobrir pela observação e pela experiência as leis que governam o mundo. A razão humana é a base do conhecimento. Isto se contrapunha ao conhecimento baseado na autoridade, na tradição e na inspiração de origem divina que marcou a cultura medieval.
d- humanismo: o humanista era o indivíduo que traduzia e estudava os textos antigos, principalmente gregos e romanos. Foi dessa inspiração clássica que nasceu a valorização do ser humano. Uma das características desses humanistas era a não especialização. Seus conhecimentos eram abrangentes.
e- hedonismo: valorização dos prazeres sensoriais. Esta visão se opunha à idéia medieval de associar o pecado aos bens e prazeres materiais.
f- individualismo: a afirmação do artista como criador individual da obra de arte se deu no Renascimento. O artista renascentista assinava suas obras, tomandose famoso.
g- inspiração na antiguidade clássica: os artistas renascentistas procuraram imitar a estética dos antigos gregos e romanos. O próprio termo Renascimento foi cunhado pelos contemporâneos do movimento, que pretendiam estar fazendo renascer aquela cultura, desaparecida durante a Idade das Trevas (Média).
Grandes Nomes da Cultura Renascentista
Leonardo da Vinci
Artista e pensador italiano (Vinci, perto de Florença, 15-IV-1452 – Castelo de Cloux, perto de Amboise, França, 2-V-1519). Protótipo do ideal renascentista do homem universal e um dos maiores gênios que a humanidade terá produzido, foi pintor, escultor, arquiteto, engenheiro e cientista.
Filho ilegítimo, aos 15 anos iniciou sua aprendizagem artística com Verrochio, completado-a em 1472, embora permanecesse junto ao mestre até 1476. Seu primeiro trabalho datado, de 5 de agosto de 1473, é um desenho de paisagem, hoje na Galeria degli Uffizi, em Florença. Por esta época, além de se dedicar à pintura e à escultura (são duas, por exemplo, a cabeça do anjo e a paisagem do Batismo de Cristo, de Verrochio, também nos Uffizi), já dera início igualmente à sua carreira de inventor.
De 1477 a 1482, quando se transferiu a Milão, manteve em Florença seu próprio estúdio, do qual saíram obras como Ginevra de Benci (National Galery, Washington, D.C.). A serviço de Ludovico Sforza, o artista permaneceria em Milão até 1499, trabalhando principalmente como engenheiro militar e civil, mas também executando pinturas como A Virgem das rochas (Museu do Louvre) e o célebre afresco da Última Ceia, no refeitório de Santa Maria delle Grazie (1495 a 1497).
Dos numerosos projetos deixados inconclusos deve ser mencionada a estátua eqüestre de Francesco Sforza, obra monumental de que chegou a ser feito um modelo em argila, embora jamais fosse fundida em bronze.
Também os projetos de arquitetura concebidos em Milão não chegaram a se concretizar em edificações, deles restando apenas riscos e apontamentos, inclusive planos para várias igrejas. Como diretor dos festivais promovidos pela corte, coube-lhe, além do mais, organizar torneios, competições e representações, para muitos dos quais terá também desenhado cenários e trajes, como era costume na época.
Foi ainda em Milão que Leonardo deu início a seus estudos científicos sistemáticos, calcando toda a sua teoria na experiência pragmática. A anatomia, botânica, a matemática, a física e a mecânica interessavam-no de modo especial, lado a lado com a pintura, sobre o que escreveria, por esses anos, um importante tratado.
Desde 1496 entrara em contato com o pintor e matemático Lucas Pacioli, resultando de tal colaboração e das longas discussões científicas entre ambos o tratado De divina proportione, de Pacioli, com ilustrações, e não poucas idéias, de Leonardo.
Com a invasão da Lombardia por Luís XII da França, e a conseqüente conquista de Milão (1499) e deposição dos Sforza, Leonardo retorna a Florença, após passar por Mântua e Veneza; nesta última cidade chegou a elaborar um programa de defesa contra os turcos. Em 1500 iniciou A Virgem, o Menino e SantAna, uma de suas pinturas mais famosas, terminada apenas em 1507 (Museu do Louvre).
Em 1502, passa ao serviço de César Bórgia, como arquiteto e engenheiro-chefe, acompanhando-o na campanha da Romagna. Os mapas e planos militares que então elabora acerca de cidades e regiões como Pesaro, Rimini, Faenza e Forli constituem o fundamento de toda a moderna cartografia.
Em 1503, novamente em Florença, começa a elaborar sua obra mais conhecida, o retrato da Mona Lisa, conhecido também como Gioconda. Outra composição iniciada no mesmo ano, Leda, é apenas conhecida através de cópias. Em fins de julho, em função de engenheiro militar, Leonardo assistirá ao cerco de Pisa, concebendo um plano de desviamento do rio Arno, de modo a cortar o acesso fluvial à cidade inimiga.
Logo a seguir recebe uma encomenda para a feitura de um mural na sala nobre do Palazzo della Signoria, A Batalha de Anghiari, tema possivelmente fornecido por Niccolò Machiavelli. Nesse afresco iria trabalhar até 1506 (quando deixou Florença), sem todavia concluí-lo. Embora o cartão da parte central da composição seja conhecido em mais de uma cópia (inclusive a belíssima de Rubens), o mural propriamente dito arruinou-se, devido às experiências com secantes postas em prática pelo artista.
Contudo, suas preocupações maiores iam em tal momento para as ciências: Leonardo realiza dissecações, escreve um tratado sobre o vôo dos pássaros e começa a organizar seus apontamentos com vistas à elaboração de um grande tratado sobre forças mecânicas da natureza.
Entre junho de 1506 e setembro de 1517, Leonardo novamente reside em Milão, com permanências ocasionais em Florença e em outras cidades. Conselheiro artístico do governador francês, Charles dAmboise, traça para ele o projeto de novo palácio. Também projeta um túmulo, em forma de estátua eqüestre, para o príncipe Trivulzio.
Um e outro projeto não serão desenvolvidos. Ao mesmo tempo, continuam as pesquisas no campo da geologia, da anatomia, da geofísica e da hidrologia. A atividade em Roma, entre 1513 e 1517, é pouco conhecida. Sob a proteção de Giuliano de Médici, Leonardo entrega-se aos estudos da anatomia, matemática e mecânica. Sua última pintura, o São João Batista (Museu do Louvre), data igualmente dessa fase romana.
Em maio de 1517, aceitando a hospitalidade de Francisco I da França, dirige-se para o castelo de Cloux, próximo a Amboise. É então o premier peintre, architecte et méchanicien da corte, executando provavelmente décors para o batismo do delfim e para o casamento de Lourenço o Magnífico, com uma neta do rei (1518). Um de seus últimos projetos é um plano de irrigação para Tours, Blois e Saône. em seu testamento (23-IV-1519) externa a vontade de ser sepultado na igreja de Saint-Florentin, em Amboise. Suas cinzas foram dispersas por ocasião dos distúrbios huguenotes.
Michelangelo
[MICHELANGELO DI LODOVICO BUONARROTTI SIMONI]
Escultor, pintor, arquiteto e poeta italiano (Caprese, 6-III-1475 – Roma, 18-II-1564). Muito moço começou a estudar pintura com Domenico Ghirlandaio, em Florença. A partir de 1489 voltou-se para a escultura, que estudou com Bertoldo. Falecendo Lourenço o Magnífico, seu protetor, transladou-se para Veneza, onde trabalhou no sarcófago de são Domingos.
Pouco depois regressou a Florença, ali realizando um de seus mais famosos trabalhos no campo da escultura – o David. Com essa obra adquiriu grande nomeada, e graças a ela foi chamado em seguida a decorar (juntamente com Leonardo da Vinci) a sala do Grande Conselho, em Florença. De tal incumbência não se desobrigou jamais, embora executasse diversos desenhos preparatórios para afrescos.
Em 1505, foi chamado a Roma para executar na abside de São Pedro , o túmulo de Júlio II, projeto que logo abandonou. Entre 1508 e 1512 pintou, no teto da capela Sistina, os gigantescos afrescos hoje tidos como sua obra-prima em pintura – e dos quais o mais notável é A Criação de Adão. Júlio II faleceu em 1513, e Michelangelo novamente trabalhou em seu túmulo. Concluídas as estátuas de Moisés, da Vida Ativa e da Vida contemplativa – a primeira é uma de suas criações mais altas – abandonou definitivamente esse trabalho.
Deixando Roma em 1527, para se instalar em Florença, logo depois foi chamado a decorar a parede da retaguarda da capela Sistina, vinte e quatro anos após a execução dos afrescos do teto. Pintou, então, O Juízo Final, cuja elaboração durou cinco anos, e que se alinha entre as obras-primas da arte universal.
Em 1542, enceta a realização de dois afrescos na capela Paolina, no Vaticano, concluindo-os nove anos depois. Essa será a última obra de Michelangelo no campo da pintura, e no conjunto de suas criações ocupará lugar apenas discreto. A partir de 1550, Michelangelo – que aparentemente não tinha maiores predileções pela pintura, e sim pela arquitetura, e principalmente pela escultura – será somente escultor e arquiteto. Cultivará ainda a poesia, sendo autor de uma coletânea de Rimas.
Sobre a pintura de Michelangelo influíram a arte de Massacio e a de Luca Signorelli. Os afrescos executados pelo primeiro na capela Brancacci foram objeto de minuciosos estudos, de parte de autor do Juízo final. Mas à grandiosidade de Masaccio alia Michelangelo maior liberdade de gestos e atitudes, enquanto de seus personagens titânicos se irradia uma sensação de movimento virtualmente oposta à estática masacciana, graças à arrojada disposição espacial que lhes emprestou o artista, e que repercutiria intensamente sobre a arte dos séculos futuros.
Michelangelo foi, como seu grande rival, Leonardo da Vinci, um gênio criador e um talento universal, ocupando lugar de primeiríssimo plano entre os mais ilustres representantes da Renascença italiana. Espírito inquieto, temperamento irascível, num tempo que era costume identificar gênio e loucura. Michelangelo viveu intensamente o drama moral e religioso de sua época, tendo sido na mocidade adepto de Savonarola, e mais tarde do evangelismo anti-reformista do papa Paulo III.
Galileu
[GALILEO GALILEI]
Físico e astrônomo italiano (Pisa, 15-II-1564 – Arcetri, perto de Florença, 8-I-1642). Descendia de família nobre e seu pai, Vincenzio Galilei, era matemático competente e músico famoso. Iniciou sua educação no mosteiro de Vallombrosa, onde estudou Latim, grego e lógica. Desde cedo impressionou os mestres pela capacidade intelectual, habilidade manual e pela poderosa imaginação criadora, particularmente fértil para invenções mecânicas.
Em 1581 foi enviado para a universidade de Pisa para estudar medicina, curso que não concluiu. Depois de grande insistência e graças à intervenção de um amigo de seu pai, conseguiu permissão para estudar matemática e ciências. Voltou à universidade e doutorou-se em 1585. Durante algum tempo lecionou na Academia Florentina, em Florença, época em que publicou um artigo sobre a balança hidrostática, que havia inventado e que tornara seu nome conhecido em todos os círculos científicos.
Em 1588 publicou um trabalho sobre a gravidade que lhe valeu o convite para lecionar na universidade de Pisa. Nos anos que se seguiram levou a efeito importantíssimas experiências referentes ao movimento físico, e, em particular, aos movimentos à superfície da Terra. Esses experimentos foram decisivos para permitir-lhe estabelecer os princípios da dinâmica, talvez sua maior contribuição ao pensamento humano.
Uma dessas experiências tornou-se famosa e muito discutida: a que realizou atirando diversos objetos de pesos diferentes do alto da torre de Pisa. Para sua realização foram convidados os professores e estudantes da universidade, além de outras pessoas de cultura e autoridades. Os corpos caíram sempre juntos, ou seja, com a mesma aceleração, para espanto dos assistentes, presos aos preconceitos da física aristotélica.
O resultado mais significativo dessa prova, que abalou os alicerces de toda uma falsa concepção dos fenômenos naturais, foi cabal demonstração de que as ciências da natureza são, por excelência, experimentais.
Em 1581, observando o movimento oscilatório de um lustre que pendia no interior da catedral de Pisa, ao mesmo tempo que contava suas próprias pulsações, Galileu verificou que o movimento do pêndulo era periódico e que as pequenas oscilações eram isócronas, isto é, ocorriam em tempos iguais, mesmo quando amortecidas. Isto permitiu-lhe oferecer uma boa solução para o importante problema da medida do tempo. Verificou também que o período de um pêndulo era independente da natureza e da massa da substância, um dos pontos de partida para os seus estudos dinâmicos.
O aproveitamento de lentes de vidro para aumentar o tamanho das imagens levou o cientista a aperfeiçoar esse invento que, em suas mãos, logo se transformou em um telescópio capaz de produzir 32 aumentos. Conseguiu, assim realizar numerosas observações astronômicas e fez grandes descobertas que foram reunidas no livro Sidereus nuntius (1610; O Mensageiro celeste). Descobriu as montanhas da Lua, os satélites de Júpiter, as manchas solares, as fases de Vênus, os anéis de Saturno, além de numerosos fatos que serviram para mostrar o acerto de idéias de Copérnico, tão combatidas na época.
Galileu foi, desde a mocidade, um entusiástico defensor do sistema heliocêntrico, o que lhe valeria muitos dissabores. Em 1611 exibiu seu telescópio em Roma a eminentes personagens, recebendo calorosa acolhida. Incentivado pela receptividade de suas descobertas publicou Istoria i dimostrazione intorno alle macchie (1613; História e demonstração em torno das manchas solares), onde defende ostensivamente as idéias de Copérnico.
As brilhantes pesquisas de Galileu, sua exuberante argumentação, o fervor que devotava às suas idéias despertaram a atenção das autoridades para as discrepâncias entre a concepção do universo defendido pelo sábio e algumas passagens das Escrituras.
Outro perigo maior apresentavam seus escritos: ele escrevia para todos, de maneira rigorosa porém simples e na própria língua falada pelo povo, o que tornara bastante popular. Foi por isso processado e condenado pelos tribunais da Inquisição, tendo vivido até o fim de seus dias recolhido a um castelo de sua propriedade.
Deve-se a Galileu o mérito de haver fundado a ciência do movimento e estabelecido os fundamentos da dinâmica. Seus estudos sobre a queda dos corpos foram reunidos nos Discorsi e dimostrazioni intorno a due nuove scienze (1638; Discursos e demonstrações em torno de duas novas ciências). Nessa obra dá novo impulso à ciência do som, mostrando que a altura de um som deriva da freqüência de vibração da fonte e estuda as características das cordas vibrantes. Estudou também fenômenos de ressonância e ondas estacionárias, preparando o terreno para as descobertas de Mersenne.
Foi Galileu o primeiro a afirmar que nas proximidades da Terra os corpos eram submetidos a uma aceleração constante, vertical e dirigida para baixo, estabelecendo as leis da queda. No seu célebre livro Dialogo sopra i due massimi sistemi del mondo (1632; Diálogo sobre os dois sistemas principais do mundo) inclui numerosa e sólida argumentação para refutar as razões dinâmicas alegadas contra a possibilidade de movimento da Terra.
Galileu foi o mais fecundo investigador de seu tempo. Além do grande mérito de defender as idéias de Copérnico, teve a seu favor a demonstração de que as leis do movimento dos planetas deveriam ser relacionadas não a um sistema ligado à Terra, mas, a um sistema de referência ligado ao Sol. Nos seus trabalhos emprega, embora de maneira intuitiva, os princípios da conservação das quantidades de movimento e da conservação da energia que constituem as bases da mecânica moderna. Suas obras completas foram publicadas em Florença, constando 20 volumes que incluem cartas e outros documentos. Até hoje seu nome de cientista e o rumor trágico de sua luta com Roma prendem a imaginação dos homens. Uma das mais famosas peças de Bertolt Brecht tem Galileu como principal personagem.
Erasmo de Rotterdam
Humanista holandês (Rotterdam, provavelmente em 28-X-1469 – Basiléia, 12-VII-1536). Foi ordenado sacerdote em 492, mas logo abandonou o hábito.
Aprofundou seus estudos clássicos em Paris, e viajou pela Inglaterra, onde encontrou Thomas More, cuja amizade conservou. Residiu depois na Itália. Jamais se contentou com a boa formação obtida na mocidade e passou a vida inteira estudando e ensinando. Aperfeiçoou, sobretudo, o conhecimento do latim e dos escritores da Antigüidade, adquirindo ampla erudição de humanista e filólogo. Foi dispensado dos votos monásticos pelo papo Júlio II. Em 1521, fixou em Basiléia.
Em 1516, publicou uma edição grega do Novo Testamento, acompanhada de uma versão latina. Escreveu o Elogio da Loucura (1509), obra que teve êxito extraordinário, por seu caráter satírico sobre a necessidade da reforma da Igreja. Quando se fixou em Basiléia, mundialmente famoso, manteve intensa correspondência com os grandes da época.
Sempre se manifestando interessado pelos problemas religiosos, inclinava-se por uma reforma dos costumes, mas não da fé. Criticou os abusos dos eclesiásticos.
Apesar disso, a violência de Lutero colocou-o de sobreaviso, e negou-se a colaborar com os reformadores, criticando seus excessos e algumas de suas doutrinas, no livro De libero arbitrio. Sua virtude dominante era a moderação, o que levou a ser atacado igualmente por católicos e protestantes. Ficou eqüidistante das duas facções em luta mas sua posição foi interpretada como indecisão. O progresso da Reforma em Basiléia tornou-lhe a vida insuportável, obrigando-o a transferir-se provisoriamente para Friburgo. Humanista antes de tudo, exerceu e seu tempo influência profunda, inclusive literária, abrindo a Europa à erudição clássica, à propagação das línguas antigas. Por volta de 1520, todos os meios cultos europeus pareciam erasmianos, sobretudo a Espanha, antes de a Inquisição intervir contra suas teses.
William Shakespeare
Dramaturgo e poeta inglês (Stratford-on-Avon, IV-1564 [batizado a 26, mas com aniversário tradicionalmente celebrado a 23, dia de são Jorge, padroeiro da Inglaterra] – id., 23-IV-1616). Considerado, pela maioria dos historiadores da literatura, como o maior escritor de todos os tempos, sua biografia, apoiada em parcos documentos, não merece grande crédito. Sabe-se que foi ator e co-proprietário do Globe Theatre, de Londres, e que cedo retirou para sua cidade natal, onde morreu. Publicou dois poemas narrativos em estilo renascentista, Venus and Adonis (1593) e Lucrece (1594), e, em 1609, os Sonnets, obra das mais importantes da língua inglesa. De suas peças dramáticas, cerca da metade foi publicada em vida do autor, em edições in-quarto, nem sempre autorizadas e divergentes da edição definitiva, que aparece pela primeira vez in-folio somente em 1623, publicada por dois amigos aos quais se deve a preservação da maior parte da obra shakespeariana.
Desde o séc. XVIII, a crítica textual das obras muito se desenvolveu, publicando-se enfim as grandes edições Variorum, com todas as variantes e emendas conjecturais, além de muitas edições críticas (Globe, Temple, Arden, New Shakespeare). Por não terem sido preservados os originais manuscritos, haverá sempre margem de discussão sobre o estabelecimento do seu texto definitivo.
Da mesma forma ainda não se pode estabelecer com segurança absoluta a cronologia das peças, embora as datas disponíveis sejam suficientes para organizar uma lista cronológica aproximadamente exata, dividida em quatro fases:
1. peças da mocidade (até c. 1595)
2. peças da primeira maturidade (até c. 1601)
3. fase trágica (até c. 1610)
4. última fase, que se estende até cerca de 1613
Entre as primeiras peças estão as históricas: Henry VI (em três partes), de autenticidade duvidosa, mas já com algumas cenas importantes; Richard III, do texto ainda rude, conquanto dos mais representados, por causa da grandeza demoníaca do herói; e Titus Andronicus, de enredo mais bizantino que romana e cujos horrores cruentos o público moderno mal suporta. The Comedy of errors (A Comédia dos erros), versão de uma comédia de Plauto, e The Taming of the shrew (A Megera domada) não passam de farsas, embora se adaptem bem ao palco moderno, o que já não acontece com The Two Gentlemen of Verona (Os dois cavalheiros de Verona). Enfim, Loves labours lost (Trabalho de amor perdido) é uma comédia encantadora, bem ao gosto da Renascença italiana.
No pórtico da segunda fase está Romeo and Juliet, tragédia de amor e uma das peças mais populares de Shakespeare, embora não uma das obras-primas definitivas, pois ainda tem muito de gosto juvenil. Assim também o Midsummer nights dream (Sonho de uma noite de verão), cheio de poesia, com o engrassadíssimo intermezzo humorístico dos atores-amadores no final. Já The Merchant of Venice (O Mercador de Veneza) é uma comédia de conteúdo mais sério, com o personagem trágico do judeu Shylock no centro da ação. As peças históricas desta fase revelam ascensão ininterrupta. No desigual King John só interessam a figura patética do infeliz príncipe Arthur e os discursos patrióticos de Faulconbridge. Mas Richard II é a grande tragédia da legitimidade dinástica. Em Henry IV (em duas partes) estão perfeitamente equilibradas as cenas políticas, com o rei tragicamente arrependido e temperamental Hotspur colocado no centro, além das cenas de humor, dominadas pelo alegre príncipe Henry e, sobretudo, por Falstaff, a maior criação humorística de Shakespeare. Sua continuação, Henry V, é muito apreciada na Inglaterra como peça patriótica.
O personagem de Falstaff volta na exuberante farsa The Merry wives of Windsor (As Alegres comadres de Windsor). A bucólica As you like it (Como quiserdes) com a personagem encantadora de Rosalind, e Twelfth night (Noite de Reis), elogio da boa e vida e escárnio do puritano Malvolio, já são, porém, comédias perfeitas, ao passo que Much ado about nothing (Muito barulho por nada), com enredo sério e cenas cômicas organicamente mal ligadas pelos diálogos de Benedick e Beatrice, carece de força dramática. Dessa fase é também Julius Cesar, uma das obras mais conhecidas de Shakespeare, apesar da construção falha, em parte neutralizada pelos grandes personagens de Bruto e Pórcia, bem como pelo discurso fúnebre de Marco Antônio, de efeito irresistível.
A grande fase trágica de Shakespeare, iniciada com alguns textos problemáticos de pouco agrado do público e da crítica, encerra sua peça mais representada e estudada, Hamlet, a tragédia do intelectual que não sabe agir. Também não pertence ainda à categoria das obras definitivas, mas talvez por não ser inteiramente realizada desperte maior interesse do que nenhuma outra. Deste período, é Alls well that ends well (Tudo é bom se acaba bem), comédia de sabor amargo. Troilus and Cressida transfigura satiricamente as lendas homéricas de heroísmo e amor, enquanto Measure for measure (Medida por medida) é uma tragédia severa, com problemas de sexo, de morte e do papel moralista na administração pública, transformada em comédia por um artificial happy ending. Essa obra, outrora tida como insatisfatória e imoral, passou depois a ser aceita pelo público e pela crítica.
Tortuosa e obscura é Timon of Athens, a tragédia do idealista desiludido que se torna misantropo. Os discursos do Timão, amaldiçoando o gênero humano, são dos maiores trechos retóricos de Shakespeare.
Enfim, as três grandes tragédias, entre as quais não é possível estabelecer uma hierarquia qualitativa, são: Othello, a tragédia do ciúme, peça de construção perfeita, onde a psicologia do mouro ciumento e a da maldade diabólica de Iago, bem como a lógica dos acontecimentos – tradução de uma fatalidade inexorável – conduzem o espectador ao clima da tragédia grega; Macheth, a mais trágica de todas, uma espécie de Hamlet do crime, estudo de ambição feminina que acaba em histeria, enquanto a atmosfera nórdica, sinistra e noturna, exerce fascínio irresistível, acentuado pelas intervenções do sobrenatural; enfim, King Lear (O Rei Lear) é uma tragédia de dimensões cósmicas, onde os elementos desenfreados participam dos acontecimentos, determinando um desfecho apocalíptico. Entre as obras de Shakespeare, é a mais difícil representação e talvez a de mais alto vôo poético.
A essa fase pertencem também as duas últimas peças tiradas da história romana: Antony and Cleopatra, tragédia do amor derradeiro no crepúsculo de um império, e Coriolanus, uma das maiores e mais controvertidas de suas peças.
Em Stratford-on-Avon, para onde se retirou, Shakespeare escreveu suas últimas peças. Uma delas, Henry VII, escrita em colaboração com Fletcher, não é das melhores. As outras são tidas por calmas, após a agitação da grande fase trágica. Em todas, porém, ainda há muita matéria para duvidar de um otimismo final do dramaturgo, como os elementos de um assustador conto de fadas e de uma maliciosa novela italiana, encontrados em Cymbeline, obra de alta poesia. No fundo de The Winters tale (História de inverno) reside uma tragédia de ciúmes, enquanto uma história de traição e usurpação se insinua em The Tempest (A Tempestade), nobre despedida de Shakespeare e talvez a mais poética de todas as suas obras.
A poesia de Shakespeare jamais se desliga da ação dramática. Seu teatro, porém, não é poético. O realismo insubordinável do dramaturgo, que nunca recua quando necessário ante a grosseria, basta para demonstrá-lo. Teatro e poesia nele se fundem. A linguagem de Shakespeare, rica e criadora, contém todos os elementos anglo-saxônicos e latinos da língua inglesa, que o poeta enriqueceu com uma maior número de citações, locuções e frases proverbiais do que qualquer outro autor. A mudança de seu estilo e mentalidade, ocorrida durante a transição da primeira para a segunda fase, explica-se pelo amadurecimento do poeta. Para explicar as mudanças seguintes, recorreu-se a interpretações biográficas, como, entre outras, a do pessimismo oriundo de infelizes experiências na vida, das aventuras eróticas, da conspiração fracassada de Essex, todas, porém, sem base documentada dos fatos.
É possível, de resto, analisar as obras de Shakespeare estilisticamente, mas não ideologicamente, pois seus versos e frases só exprimem idéias e sentimentos dos personagens, não se podendo atribuí-los ao dramaturgo, que nunca fala na primeira pessoa. Shakespeare é a soma dos seus milhares de personagens (myriad-minded), entre os quais há representantes dos mais diversos temperamentos e adeptos de todas as filosofias e crenças. Ele próprio, porém, se oculta atrás do palco, não tem filosofia alguma. Como nenhum outro dramaturgo, criou inúmeros tipos, e os fechou num universo a que nem Deus tem acesso.
Ao contrário do que se pensava antigamente, Shakespeare não foi esquecido após sua morte e na segunda metade do séc. XVII. Somente no séc. XVIII, entretanto, graças às edições de Rowe, Pope e Samuel Johnson, bem como à atuação do grande ator Garrick, foi sua grandeza integralmente reconhecida. Ao mesmo tempo, Shakespeare, até então desconhecido no continente, conquistou toda a Europa, contribuindo para o declínio da hegemonia do teatro clássico francês. A Alemanha, sobretudo, graças a Wieland, Herder, Goethe e Schlegel, tornou-se sua segunda pátria. A imitação do estilo shakesperiano pelos dramaturgos românticos alemães não deu, porém, resultados satisfatórios. Sua influência já não é hoje tão viva na literatura dramática, embora continue a ser o dramaturgo mais representado na Alemanha e Inglaterra e muito aceito na França e Itália. O teatro de algumas nações, como Dinamarca, a Hungria e a Tchescoslováquia, deve a Shakespeare sua renascença moderna. As hipóteses que atribuem a verdadeira autoria de suas peças ao filósofo Bacon, bem como a este ou àquele aristocrata da época, são contraditórias e não possuem base histórica.
Renascimento Cultural
Proença (1998, p.12) afirma que:
O Renascimento teve início na Itália na primeira metade do século XIV, referindo-se apenas na literatura; no século XV alargou seus limites, atingindo a artes plásticas. Nos séculos seguintes, a valorização da cultura clássica já era percebida em todas as manifestações culturais de muitos países na Europa.
O Renascimento não significou somente uma volta pura e simples à cultura greco-romana. Muito mais que isso, significou o aproveitamento dos conhecimentos e concepções clássicas para adequá-los a um novo mundo mercantil e urbano, característico do início da Época Moderna.
Enquanto na Idade Média a vida do homem devia estar centrada em Deus (teocentrismo), nesta época o homem passa a ser o principal personagem (antropocentrismo). As qualidades mais valorizadas do ser humano passam a ser a inteligência, o conhecimento e o dom artístico.
O Renascimento pode ser considerado como um marco do início do início da Idade Moderna, uma vez que reflete o desenvolvimento de uma nova vida e de uma nova mentalidade, vinculadas à ascensão da cidade e da burguesia.
Esses financiadores de uma nova cultura, burguesia, príncipes e monarcas, eram chamados de mecenas, isto é, protetores das artes. Seu objetivo não era somente a autopromoção, ms também a propaganda e difusão de novos hábitos, valores e comportamentos. […] as atividades e os campos de reflexão que mais preocupavam os pensadores renascentistas aparecem condensados nas artes plásticas: a filosofia, a religião, a história, a arte, a técnica e a ciência (SEVCENKO, 1984, p.24).
A reabertura do mar Mediterrâneo ao comércio europeu, intensificaram as trocas comerciais entre o Ocidente e o Oriente, especialmente nas cidades de Veneza, Gênova, Florença e Milão. A rota das especiarias passou a ser monopólio italiano.
O desenvolvimento comercial trouxe a reboque a consolidação e a expansão da atividade bancária, em função da necessidade de câmbio e crédito. Com a expansão comercial, houve um acelerado desenvolvimento das cidades. As atividades comerciais ou artesanais que surgiam nos núcleos urbanos (burgos) atraíam grande número de servos que abandonavam os feudos, fugindo da exploração senhorial. A predominância das cidades sobre os campos, a superação das trocas naturais pela economia de base monetária e a dinâmica do comércio promoveram mudanças e uma ruptura nas corporações de ofício medievais e, principalmente, projetaram e fortaleceram uma nova camada, a burguesia, ávida pelo poder político e prestígio social, correspondente à sua opulência material.
Interessado em manter seu ritmo de desenvolvimento econômico, o segmento burguês da sociedade européia decidiu investir na centralização do poder nas mãos dos reis. Desse modo, contribuiu para a formação de um exército nacional mercenário que garantisse a autoridade do monarca. Tendo o monopólio da força, o rei poderia estender seu controle sobre a justiça e a riqueza nacional.
No século XIV eclode grave crise, acarretando drásticas transformações.
Dentre as causas apontadas pelos historiadores como sendo as principais responsáveis, encontramos: a peste negra, que dizimou entre um terço e metade da população européia; a Guerra dos Cem Anos (1346-1450) deflagrada entre os soberanos da França e da Inglaterra, que ampliou o funesto quadro.
Tudo ocorria para a dissolução do sistema feudal de produção.
Renascimento – Período
O Renascimento é o nome que se dá ao período que vai do século XV ao XVI. Fundamentado no conceito de que o homem é a medida de todas as coisas, significou um retorno às formas e proporções da antiguidade greco-romana. Este movimento artístico começou a se manifestar na Itália, mais precisamente em Florença, cidade que a essa altura já tinha se tornado um estado independente e um dos centros comerciais mais importantes do mundo.
Em poucos anos, o renascimento difundiu-se pelas demais cidades italianas (período conhecido como quattrocento), para se estender pouco a pouco, em fins do século XV, ao resto do continente europeu, no chamado cinquecento, ou renascimento clássico. As bases desse movimento eram proporcionadas por uma corrente filosófica reinante, o humanismo, que descartava a escolástica medieval, até então reinante, e propunha o retorno às virtudes da antiguidade.
Platão, Aristóteles, Virgílio, Sêneca e outros autores greco-romanos começam a ser traduzidos e rapidamente difundidos. Desse modo, o espírito da antiga filosofia clássica não leva muito tempo para inundar as cortes da nova aristocracia burguesa. O cavalheiro renascentista deve agora ser versado em todas as disciplinas artísticas e científicas, como recomenda um dos livros fundamentais da época, O Cortesão, de Baldassare Castiglione.
Imbuídas desse espírito, as famílias abastadas não hesitaram em atrair para seu mundo artistas de grande renome, aos quais deram seu apoio, tornando-se, afinal, seus mecenas. Músicos, poetas, filósofos, escultores, pintores, ourives e arquitetos saíram do anonimato imposto pelo período medieval e viram crescer seu nome e sua fama, juntamente com a de seus clientes. No norte da Europa, o pensamento humanista já tinha dado seus primeiros passos significativos.
Foi graças ao reformador Lutero e às universidades, por intermédio do estudo das ciências exatas e da filosofia, que se difundiram as idéias de seus pares italianos. Por volta do fim do século XV, chegava da Espanha a notícia do descobrimento de um novo continente, a América, fato que mudaria a fisionomia do mundo para sempre. O homem se distanciava assim, de modo definitivo, do período medieval para decididamente ingressar na modernidade.
A PINTURA RENASCENTISTA
Até o advento do renascimento, só era possível, na pintura, transpor para a tábua ou para a parede duas dimensões: comprimento e largura. Era impossível captar no plano a profundidade, a luz ou o volume. É por esse motivo que a perspectiva, tanto aqui quanto na arquitetura, passa a ser um elemento de fundamental importância.
Graças e ela os pintores renascentistas conseguem criar o que até então era inconcebível: espaços reais sobre uma superfície plana.
As figuras, dispostas numa composição estritamente simétrica, a variação de cores frias e quentes e o manejo da luz permitem criar distâncias e volumes que parecem ser copiados da realidade. A reprodução da figura humana, a expressão de suas emoções e o movimento ocupam lugar igualmente preponderante. Os temas a representar continuam sendo de caráter estritamente religioso, mesmo que, agora, com a inclusão de um novo elemento…
… a burguesia, que queria ser protagonista da história do cristianismo. Não é de admirar, portanto, que as pessoas se façam retratar junto com a família numa cena do nascimento de Cristo, ou ajoelhadas ao pé da cruz, ao lado de Maria Madalena e da Virgem Maria. Até mesmo os representantes da Igreja se rendem a esse curioso costume. Muito diferentes no espírito, embora nem por isso menos valiosos, são os resultados obtidos paralelamente nos países do norte.
Os mestres de Flandres, deixando de lado as medições e a geometria e recorrendo à câmara escura, também conseguem criar espaços reais no plano, embora sem a precisão dos italianos. A ênfase é colocada na tinta (são eles os primeiros a utilizar o óleo) e na reprodução do natural de rostos, paisagens, fauna e flora, com um cuidado e uma exatidão assombrosos, o que acabou resultando naquilo a que se deu o nome de Janela para a Realidade.
A ESCULTURA RENASCENTISTA
Na escultura renascentista, desempenham um papel decisivo o estudo das proporções antigas e a inclusão da perspectiva geométrica. As figuras, até então relegadas ao plano de meros elementos decorativos da arquitetura, vão adquirindo pouco a pouco total independência. Já desvinculadas da parede, são colocadas em um nicho, para finalmente mostrarem-se livres, apoiadas numa base que permite sua observação de todos os ângulos possíveis.
O estudo das posturas corporais traz como resultado esculturas que se sustentam sobre as próprias pernas, num equilíbrio perfeito, graças à posição do compasso (ambas abertas) ou do contrapposto (uma perna na frente e a outra, ligeiramente para trás). As vestes reduzem-se à expressão mínima, e suas pregas são utilizadas apenas para acentuar o dinamismo, revelando uma figura humana de músculos levemente torneados e de proporções perfeitas.
Outro gênero dentro da escultura que também acaba sendo beneficiado pela aplicação dos conhecimentos da perspectiva é o baixo-relevo (escultura sobre o plano). Empregando uma técnica denominada schiacciato, Donatello posiciona suas figuras a distâncias precisas, de tal maneira que elas parecem vir de um espaço interno para a superfície, proporcionando uma ilusão de distância, algo inédito até então.
Desse modo, ao mesmo tempo que se torna totalmente independente da arquitetura, a escultura adquire importância e tamanho. Reflexo disso são as primeiras estátuas eqüestres que dominam as praças italianas e os grandiosos monumentos funerários que coroam as igrejas. Pela primeira vez na história, sem necessidade de recorrer a desculpas que justificassem sua encomenda e execução, a arte adquire proporções sagradas.
A ARQUITETURA NO RENASCIMENTO
Os arquitetos do renascimento conseguiram, mediante a medição e o estudo de antigos templos e ruínas, assim como pela aplicação da perspectiva, chegar à conclusão de que uma obra arquitetônica completamente diferente da que se vira até então não era nada mais que pura geometria euclidiana. O módulo de construção utilizado era o quadrado, que aplicado ao plano e ao espaço deu às novas edificações proporções totalmente harmônicas.
As ordens gregas de colunas substituíram os intermináveis pilares medievais e se impuseram no levantamento das paredes e na sustentação das abóbadas e cúpulas.
São três as ordens mais utilizadas: a dórica, a jônica e a coríntia, originadas do classicismo grego. A aplicação dessas ordens não é arbitrária.
Elas representam as tão almejadas proporções humanas: a base é o pé, a coluna, o corpo, e o capitel, a cabeça.
As primeiras igrejas do renascimento mantêm a forma da cruz latina, o que resulta num espaço visivelmente mais longo do que largo. Entretanto, para os teóricos da época, a forma ideal é representada pelo plano centralizado, ou a cruz grega, mais freqüente nas igrejas do renascimento clássico. As obras da arquitetura profana, os palácios particulares ou comunais, também foram construídas com base no quadrado.
Vistos de fora, esses palácios se apresentam como cubos sólidos, de tendência horizontal e com não mais de três andares, articulados tanto externa quanto internamente por colunas e pilares. Um pátio central, quadrangular, tem a função de fazer chegar a luz às janelas internas. A parede externa costuma receber um tratamento rústico, sendo a almofadilha mais leve nos andares superiores
A ordem das colunas varia de um andar para outro e costuma ser a seguinte: no andar térreo, a ordem toscana, uma variante da arquitetura romana, no pavimento principal, a jônica, e no superior, a coríntia. A divisão entre um nível e outro é feita por diferentes molduras e uma cornija que se estende por todo o piso de cada andar, exatamente abaixo das janelas. Têm geralmente forma retangular e são coroadas por uma finalização em arco ou triângulo.
Renascimento – Movimento
O Renascimento, movimento artístico, científico e literário que floresceu na Europa entre o período corresponde à Baixa Idade Média e início da Idade Moderna (do século XIV ao XVI). Os humanistas valorizavam o antropocentrismo (o homem no centro do universo) a busca de conhecimentos e inspiração nas obras da antigüidade clássica.
Os humanistas consideravam a Idade Média um período de “Trevas Culturais”, por terem sido esquecidos os modelos da cultura greco-latina. O pensamento medieval, dominado pela religião, cede lugar a uma cultura voltada para os valores do indivíduo. Os artistas, inspirando-se uma vez mais no legado clássico grego, buscam as dimensões ideais da figura humana e a representação fiel da realidade. Embora grandes admiradores da cultura clássica, os artistas e intelectuais do Renascimento, adquirindo maior confiança na sua própria capacidade, não se limitaram a imitar os modelos antigos passaram a buscar inspiração na natureza que os cercava.
Esse movimento, cujo berço foi a Itália, teve em Florença e Roma seus dois centros mais importantes.
E pode ser dividido em Duocento (1200 a 1299), Trecento (1300 a 1399), Quattrocento (1400 a 1499) e Cinquecento (1500 a 1599).
Duocento e Trecento
No século XIII, o gótico começa a dar lugar para uma arte que resgata a escala humana. São as primeiras manifestações do que, mais tarde, se chamaria Renascimento. A principal característica dessa mudança é o surgimento da ilusão de profundidade nas obras. Em Siena, Duccio da Buoninsegna e, em Florença, Cimabue e sobretudo seu aluno Giotto são os pioneiros desse novo mundo.
Nos afrescos de Giotto, na igreja de Santa Croce, em Florença, por exemplo, pode-se ver figuras mais sólidas do que as góticas, situadas em ambientes arquitetonicamente precisos, dando impressão de existência concreta: é o nascimento do naturalismo. No século XIV, escultores como Donatello (o “Michelangelo” do Trecento) aprimoram a técnica.
Giotto da Bondone (1266?-1337?), pintor e arquiteto italiano. Nasce em Florença, estuda com o pintor Cimabue, com quem trabalha também em Roma, e se torna um dos principais artistas de sua época. Os afrescos de Santa Croce e a torre do Duomo são suas principais obras em sua cidade natal. Revoluciona a arte ao conseguir dar expressão e profundidade às figuras humanas.
Quattrocento
No século XV, Piero della Francesca (afrescos na catedral de Arezzo) desenvolve uma pintura impessoal e solene, misturando figuras geométricas e cores intensas. O arquiteto e escultor Filippo Brunelleschi, criador da cúpula do Duomo de Florença, concebe a perspectiva, artifício geométrico que cria a ilusão de tridimensionalidade numa superfície plana. Defende a técnica e seus princípios matemáticos em tratados. A ela aderem artistas como Paolo Uccello (Batalha de São Romano), Sandro Botticelli (Nascimento de Vênus), Leonardo da Vinci (Mona Lisa), Michelangelo (Davi, Moisés e Pietá; teto e parede da Capela Sistina, no Vaticano; cúpula da Basílica de São Pedro). Michelangelo chega a um grau de sofisticação representativa que prenuncia o barroco em suas figuras. Na Bélgica e Holanda, nesse período, surgem os representantes do renascimento flamengo como Jan van Eyck, Hans Memling e Rogier van der Weyden, que desenvolvem a pintura a óleo.
Rafael Sanzio (1483 – 1520), que se destacou por suas Madonas, série de quadros da Santíssima Virgem, diversos painéis nas paredes do Vaticano e várias cenas da História Sagrada, conhecidas com Bíblias de Rafael.
Donatello (1386?-1466), escultor italiano. Donatto di Bardi nasce em Florença, começa como ourives e aos 17 anos aprende a esculpir em mármore. Inicia-se, como assistente, nas portas do batistério de Florença e realiza uma obra imensa. Esculturas como Davi, Madalena e São Jorge estão entre as mais marcantes, por seu poder de produzir tensão emocional.
Leonardo da Vinci (1452-1519), artista, arquiteto, inventor e escritor italiano. Nasce em Florença, se torna aprendiz de Andrea Verrocchio e recebe a proteção de Lorenzo de Medici. Entre 1482 e 1499 vive em Milão, onde pinta o afresco da Última ceia. Em Florença, entre 1503 e 1506, pinta a Mona Lisa. Vive em Roma, entre 1513 e 1517, onde se envolve em intrigas do Vaticano, e decide ir se juntar à corte do rei francês Francisco I. Nos estudos científicos, prenuncia a invenção de peças modernas como o escafandro, o helicóptero e o pára-quedas. Seu Tratado sobre a pintura é um dos livros mais influentes da história da arte.
O maior representante do Renascimento, Da Vinci inaugura o antropomorfismo em sua arte e pensamento: “O homem é a medida de todas as coisas”.
Michelangelo Buonarroti (1475-1564) escultor, pintor, poeta e arquiteto italiano. Nasce em Caprese, estuda em Florença e ganha a proteção de Lorenzo Medici.
Em Roma, aos 23 anos, inicia a Pietá. De volta a Florença, esculpe Davi e pinta A Sagrada Família. Em 1508 começa a pintar sozinho os afrescos do teto da Capela Sistina, trabalho que dura quatro anos. Em 1538 pinta a parede do Juízo Final, na mesma capela. Oito anos depois, projeta a cúpula da Basílica de São Pedro. Ao mesmo tempo, retoma a Pietá e esculpe também a Pietá Palestrina e a Pietá Rondanini.
Cinquecento
Em Veneza, no século XVI, com pintores como Tintoretto, com sua grandiosidade, Ticiano, com seu uso de cores, Veronèse, com seu senso espacial, e Giorgione, com sua expressividade, começa a última fase do Renascimento. Abandonam a primazia da forma sobre a cor e a perspectiva rigorosa. Na Espanha, influenciado por Tintoretto, El Greco (pseudônimo de Domenico Theotokopoulos) alonga as figuras, usa cores mais expressivas e contrastes dramáticos de luz e sombra (O enterro do conde de Orgaz). Na França, além do maneirismo (o naturalismo levado ao máximo de detalhes e efeitos) da Escola de Fontainebleau, destacam-se os retratos alegóricos de François Clouet (Diana). Na Holanda, Pieter Bruegel cria uma rica pintura narrativa, documentando costumes de época (Caçadores na neve), e Hieronymus Bosch pinta figuras oníricas, em cenários fantásticos, repletos de simbolismo (O jardim das delícias terrenas). Na Alemanha, surge uma pintura mais clássica, próxima do renascimento romano-florentino.
O grande mestre é Albrecht Dürer, que influencia Lucas Cranach, Albrecht Altdorfer, Matthias Grünewald e os dois Hans Holbein, pai e filho.
Jacopo Robusti Tintoretto (1518-1594), pintor italiano. Nasce em Veneza. Pouco se sabe de sua vida. Em 1564, pinta cenas do Velho Testamento no teto da irmandade de San Rocco, da qual é membro. Influenciado por Michelangelo e Ticiano, experimenta composições grandiosas e efeitos de luz que influenciam a arte posterior. Revoluciona a forma narrativa, modificando a hierarquia clássica das histórias religiosas.
PRÉ-RENASCIMENTO
Desde o século XIII, surgem manifestações precursoras do espírito humanista que marcará o Renascimento.
O processo de depuração da teologia se deve a Santo Tomás de Aquino, cuja filosofia incorpora conceitos de Aristóteles; Francesco Petrarca, no Cancioneiro, glorifica o amor na sua poesia lírica e fixa a forma do soneto; Dante Alighieri faz a síntese da alma medieval com o espírito novo; Giovanni Boccaccio, no Decamerão, faz impiedosa radiografia da sociedade de seu tempo.
Outros nomes importantes nessa fase de transição: os poetas franceses Guilherme de Orleãs, de delicado lirismo, e François Villon, cujo Grande testamento é um amargo testemunho sobre a condição humana nessa época; e Geoffrey Chaucer, cujos Contos de Canterbury, em versos, sintetizam os costumes e a cultura ingleses do século XV.
Dante Alighieri (1265-1321) nasce em Florença e por questões políticas é obrigado a se exilar, morrendo em Ravena. Em Sobre a língua do povo, escrita em latim para os eruditos da época, Dante defende o uso do italiano nas obras poéticas. E é nessa língua que ele escreve a Divina Comédia, considerada a primeira obra da literatura italiana. Esse relato, de uma viagem imaginária pelo inferno, purgatório e paraíso, é uma alegoria do percurso do homem em busca de si mesmo.
Giovanni Boccaccio (1313-1375) é filho de um mercador da região da Toscana, Itália. Seu pai o faz estudar em Nápoles e Florença. Boccaccio lê os clássicos latinos e escreve poesias. Decamerão, escrito em prosa, traz cem histórias curtas contadas por três moças e sete rapazes que se refugiam no campo para fugir da peste negra. Nas histórias se chocam os valores cristãos e o espírito libertino, sinais da transição para o renascimento.
LITERATURA RENASCENTISTA
Marcada pela consolidação do capitalismo mercantilista (século XV a meados do século XVI), é muito livre em relação às imposições morais, levando a uma atitude de epicurismo e busca de uma moral naturalista. Nasce uma atitude antropocentrista, semelhante à da Antiguidade clássica, em oposição ao teocentrismo medieval. A natureza é o modelo básico para o conhecimento humano.
A influência greco-romana está presente nos Lusíadas, de Luís de Camões; na poesia pastoral de Angelo Poliziano; nos escritos eróticos de Pietro Aretino; e na lírica do espanhol Jorge Manrique, dos franceses Joachim du Bellay e Pierre de Ronsard, ou dos portugueses Sá de Miranda e Cristóvão Falcão. Aumenta o interesse pela cultura, em seus termos mais abrangentes, no Elogio da loucura, do holandês Erasmo de Roterdã; em O príncipe, de Nicolau Maquiavel, pragmático manual da arte de governar; ou nos romances satíricos de François Rabelais, Gargantua e Pantagruel.
Luís de Camões (1525?-1580), freqüenta a nobreza e os círculos boêmios de Lisboa. Viaja muito, chegando até a Índia e a China, quase sempre a serviço do governo português. Sua obra mais importante, Os Lusíadas (1572), funde elementos épicos e líricos. Mescla fatos da história portuguesa às intrigas dos deuses do Olimpo, que buscam ajudar ou atrapalhar Portugal.
Sintetiza duas importantes vertentes do renascimento português: as expedições ultramarinas e o humanismo.
François Rabelais (1493-1553) viaja pelo interior da França como padre e entra em contato com dialetos, lendas e costumes que influenciam sua obra. Em 1530, abandona o hábito e estuda medicina. A epopéia de Pantagruel e seu pai Gargantua, gigantes de apetites imensos, critica a estagnação medieval, atacando a igreja, a cavalaria e as convenções e é considerada obscena, na época, devido à expressão dos instintos.
ARQUITETURA RENASCENTISTA
Caracterizou-se pelos grandes monumentos e pelas construções de grande porte, destacando-se a Catedral de São Pedro, em Roma, obra magestral do arquiteto italiano Bramante (1444 1514), da qual também participaram o pintor Rafael e o arquiteto Michelangelo, autor da grandiosa Cúpula dessa Igreja.
A ESCULTURA RENASCENTISTA
Teve em Michelangelo sua maior expressão.
Dentre suas óbras destacam-se: David, Moisés e Pietá. Neste campo também sobressaíram Donatello (1386 1466), autor da primeira estátua eqüestre de caráter monumental; Guiberti (1378 1455), que lavrou as portas de bronze do batistério de Florença; e Gian Lorenzo Bermini (1598 1680).
O RENASCIMENTO CIENTÍFICO
O Renascimento trouxe à ciência um notável desenvolvimento, sobretudo com a introdução dos métodos experimentais de pesquisa, em oposição aos estudos teóricos da Idade Média.
Nessa época, a teoria geocêntrica , sistematizada por Cláudio Ptolomeu , segundo a qual a Terra era considerada o centro do Universo, foi refutada por Nicolau Copérnico (1473 1543). Este astrônomo polonês provou ser o Sol, e não a Terra, o centro do sistema planetário, estabelecendo a teoria heliocêntrica.
Pouco mais tarde, outro astrônomo, o alemão Johann Kepler (1571 1630), aperfeiçoou a teoria de Copérnico, ao descobrir ,graças a minuciosos cálculos, que os planetas descreviam órbitas elípticas em torno do Sol, em não circulares, como afirmava o polonês.
O italiano Galileu Galilei (1564 1642), foi quem introduziu e difundiu a luneta na Itália. Galileu descobriu os satélites de Júpiter e os anéis de Saturno.
Na medicina também houve grandes progressos. O médico espanhol Miguel de Servet descobriu a pequena circulação entre o coração e os pulmões; o francês Ambroise Paré (1517 1590) combateu o uso do fogo e do azeite quente no tratamento das feridas ocasionadas por armas de fogo; e o alemão Paracelso estudou a aplicação de drogas medicinais.
RENASCIMENTO NA ALEMANHA
Na Alemanha, o apogeu renascentista esteve representado pelas obras de dois grandes pintores:
Alberto Dürer (1471 1528), autor dos quadros Adoração dos Magos, A trindade e outros.
Hans Holbein, o jovem (1497 1528), considerado o maior retratista alemão, autor de Henrique VIII, Erasmo etc.
RENASCIMENTO NA INGLATERRA
Na Inglaterra, os setores de maior destaque foram a Literatura e a Filosofia, com:
Thomas Morus (1478 1535), autor de Utopia (história de um país hipotético, onde a felicidade era total).
William Shakespeare (1564 1616), célebre dramaturgo inglês, considerado o maior gênio do teatro renascentista, autor das peças históricas Julio Cezar, Ricardo III e Henrique VIII e de peças de ficção das quais a mais conhecida é Romeu e Julieta.
RENASCIMENTO NA ESPANHA
Um dos maiores representantes do Renascimento na Espanha foi Lope de Vega, o fundador do teatro espanhol.
Na Literatura espanhola, o grande destaque cabe a Miguel de Cervantes (1547 1619), autor de D. Quixote de La Mancha, considerada até nossos dias a melhor novela escrita, onde o autor critica irônicamente os costumes medievais.
Dentre os pintores cabe destacar El Greco, que, apesar de grego de nascimento, se realizou como pintor na Espanha, mais propriamente na Cidade de Toledo .
RENASCIMENTO EM PORTUGAL
A maior figura do Renascimento em Portugal foi, sem dúvida, o poeta Luís Vaz de Camões (1524 1580), autor da epopéia Os Lusíadas, extensa narrativa em versos da história de seu país, desde sua formação até a descoberta do caminho para as Índias, por Vasco da Gama.
Na Arquitetura, surgiram grandes obras como o Mosteiro dos Jerônimos, construído no reinado de D. Manuel em comemoração à descoberta do caminho marítimo para as Índias, e a Torre de Belém, construída às margens do Rio Tejo.
Renascimento ou Renascença
Renascimento ou Renascença são os termos usados para identificar o período da História da Europa aproximadamente entre fins do século XIII e meados do século XVII, quando diversas transformações em uma multiplicidade de áreas da vida humana assinalam o final da Idade Média e o início da Idade Moderna.
Apesar destas transformações serem bem evidentes na cultura, sociedade, economia, política e religião, caracterizando a transição do feudalismo para o capitalismo e significando uma ruptura com as estruturas medievais, o termo é mais comumente empregado para descrever seus efeitos nas artes, na filosofia e nas ciências.
Chamou-se “Renascimento” em virtude da redescoberta e revalorização das referências culturais da antigüidade clássica, que nortearam as mudanças deste período em direção a um ideal humanista e naturalista.
O termo foi registrado pela primeira vez por Giorgio Vasari já no século XVI, mas a noção de Renascimento como hoje o entendemos surgiu a partir da publicação do livro de Jacob Burckhardt A cultura do Renascimento na Itália (1867), onde ele definia o período como uma época de “descoberta do mundo e do homem” . Apesar do grande prestígio que o Renascimento ainda guarda entre os críticos e o público, historiadores modernos têm começado a questionar se os tão divulgados avanços merecem ser tomados desta forma.
O Renascimento cultural manifestou-se primeiro na região italiana da Toscana, tendo como principais centros as cidades de Florença e Siena, de onde se difundiu para o resto da Itália e depois para praticamente todos os países da Europa Ocidental. A Itália permaneceu sempre como o local onde o movimento apresentou maior expressão, porém manifestações renascentistas de grande importância também ocorreram na Inglaterra, Alemanha, Países Baixos e, menos intensamente, em Portugal e Espanha, e em suas colônias americanas.
Ideias centrais
O Humanismo pode ser apontado como o principal valor cultivado no Renascimento.
Baseia-se em diversos conceitos associados: Neoplatonismo, Antropocentrismo, Hedonismo, Racionalismo, Otimismo e Individualismo.
O Humanismo, antes que um corpo filosófico, é um método de aprendizado que faz uso da razão individual e da evidência empírica para chegar às suas conclusões, paralelamente à consulta aos textos originais, ao contrário da escolástica medieval, que se limitava ao debate das diferenças entre os autores e comentaristas. O Humanismo afirma a dignidade do homem e o torna o investigador por excelência da natureza.
Na perspectiva do Renascimento, isso envolveu a revalorização da cultura clássica antiga e sua filosofia, com uma compreensão fortemente antropocentrista e racionalista do mundo, tendo o homem e seu raciocínio lógico e sua ciência como árbitros da vida manifesta. Seu precursor foi Petrarca, e o conceito se consolidou no século XV principalmente através dos escritos de Marsilio Ficino, Erasmo de Roterdão, Pico della Mirandola e Thomas More.
O brilhante florescimento cultural e científico renascentista deu origem a sentimentos de otimismo, abrindo positivamente o homem para o novo e incentivando seu espírito de pesquisa. O desenvolvimento de uma nova atitude perante a vida deixava para trás a espiritualidade excessiva do gótico e via o mundo material com suas belezas naturais e culturais como um local a ser desfrutado, com ênfase na experiência individual e nas possibilidades latentes do homem. Além disso, os experimentos democráticos italianos, o crescente prestígio do artista como um erudito e não como um simples artesão, e um novo conceito de educação que valorizava os talentos individuais de cada um e buscava desenvolver o homem num ser completo e integrado, com a plena expressão de suas faculdades espirituais, morais e físicas, nutriam sentimentos novos de liberdade social e individual.
Reunindo esse corpus eclético de idéias, os homens do Renascimento cunharam ou adaptaram à sua moda alguns outros conceitos, dos quais se destacam as teorias da perfectibilidade e do progresso, que na prática impulsionaram positivamente a ciência de modo a tornar o período em foco como o marco inicial da ciência moderna. Mas como que para contrapô-los surgiu uma percepção de que a história é cíclica e tem fases de declínio inevitável, e de que o homem natural é um ser sujeito a forças além de seu poder e não tem domínio completo sobre seus pensamentos, capacidades e paixões, nem sobre a duração de sua própria vida.
O resultado foi um grande e rico debate teórico entre os eruditos, recheado por fatos novos que apareciam a cada momento, que só teve uma resolução prática no século XVII, com a afirmação irresistível e definitiva da importância da ciência. Por um lado, alguns daqueles homens se viam como herdeiros de uma tradição que havia desaparecido por mil anos, crendo reviver de fato uma grande cultura antiga, e sentindo-se até um pouco como contemporâneos dos romanos.
Mas havia outros que viam sua própria época como distinta tanto da Idade Média como da Antiguidade, com um estilo de vida até então inédito sobre a face da Terra, sentimento que era baseado exatamente no óbvio progresso da ciência. A história confirma que nesse período foram inventados diversos instrumentos científicos, e foram descobertas diversas leis naturais e objetos físicos antes desconhecidos; a própria face do planeta se modificou nos mapas depois dos descobrimentos das grandes navegações, levando consigo a física, a matemática, a medicina, a astronomia, a filosofia, a engenharia, a filologia e vários outros ramos do saber a um nível de complexidade, eficiência e exatidão sem precedentes, cada qual contribuindo para um crescimento exponencial do conhecimento total, o que levou a se conceber a história da humanidade como uma expansão contínua e sempre para melhor . Talvez seja esse espírito de confiança na vida e no homem o que mais liga o Renascimento à antiguidade clássica e o que melhor define sua essência e seu legado.
O seguinte trecho de Pantagruel (1532), de François Rabelais, costuma ser citado para ilustrar o espírito do Renascimento:
Todas as disciplinas são agora ressuscitadas, as línguas estabelecidas: Grego, sem o conhecimento do qual é uma vergonha alguém chamar-se erudito, Hebraico, Caldeu, Latim (…) O mundo inteiro está cheio de acadêmicos, pedagogos altamente cultivados, bibliotecas muito ricas, de tal modo que me parece que nem nos tempos de Platão, de Cícero ou Papiniano, o estudo era tão confortável como o que se vê a nossa volta. (…) Eu vejo que os ladrões de rua, os carrascos, os empregados do estábulo hoje em dia são mais eruditos do que os doutores e pregadores do meu tempo.
O preparo que os humanistas preconizavam para a formação do homem ideal, são de corpo e espírito, ao mesmo tempo um filósofo, um cientista e um artista, se desenvolveu a partir da estrutura de ensino medieval do Trivium e do Quadrivium, que compunham a sistematização do conhecimento da época.
A novidade renascentista não foi tanto a ressurreição da sabedoria antiga, mas sua ampliação e aprofundamento com a criação de novas ciências e disciplinas, de uma nova visão de mundo e do homem e de um novo conceito de ensino e educação.
O resultado foi um grande e frutífero programa disciplinador e desenvolvedor do intelecto e das habilidades gerais do homem, que tinha origem na cultura greco-romana e que de fato em parte se perdera para o ocidente durante a Idade Média.
Mas é preciso lembrar que apesar da idéia que os renascentistas pudessem ter de si mesmos, o movimento jamais poderia ser uma imitação literal da cultura antiga, por acontecer todo sob o manto do Catolicismo, cujos valores e cosmogonia eram bem diversos.
Assim, a Renascença foi uma tentativa original e eclética de harmonização do Neoplatonismo pagão com a religião cristã, do eros com a charitas, junto com influências orientais, judaicas e árabes, e onde o estudo da magia, da astrologia e do oculto não estavam ausentes.
O pensamento medieval tendia a ver o homem como uma criatura vil, uma “massa de podridão, pó e cinza”, como se lê em De laude flagellorum de Pedro Damião, no século XI. Mas quando se eleva a voz de Pico della Mirandola no século XV o homem já representava o centro do universo, um ser mutante, essencialmente imortal, autônomo, livre, criativo e poderoso, o que ecoava as vozes mais antigas de Hermes Trismegisto (“Grande milagre é o homem”) e do árabe Abdala (“Não há nada mais maravilhoso do que o homem”).
Esse otimismo se perderia novamente no século XVI, com a reaparição do ceticismo, do pessimismo, da ironia e do pragmatismo em Erasmo, Maquiavel, Rabelais e Montaigne, que veneravam a beleza dos ideais do classicismo mas tristemente constatavam a imposssibilidade de sua aplicação prática universal e testemunhavam o deplorável jogo político, a pobreza e opressão das populações e outros problemas sociais e morais do homem real de seu tempo.
Fases do Renascimento e seu contexto
Costuma-se dividir o Renascimento em três grandes fases, Trecento, Quattrocento e Cinquecento, correspondentes aos séculos XIV, XV e XVI, com um breve interlúdio entre as duas últimas chamado de Alta Renascença.
Trecento
O Trecento representa a preparação para o Renascimento e é um fenômeno basicamente italiano, mais especificamente da cidade de Florença, pólo político, econômico e cultural da região, embora outros centros também tenham participado do processo, como Pisa e Siena, tornando-os a vanguarda da Europa em termos de economia, cultura e organização social, conduzindo a transfomação do modelo medieval para o moderno.
A economia era dinamizada pela fundação de grandes casas bancárias, pela noção de livre concorrência e pela forte ênfase no comércio, e cada vez mais se estruturava em moldes capitalistas e bastante materialistas, onde a tradição foi sacrificada diante do racionalismo, da especulação financeira e do utilitarismo.
O sistema de produção desenvolvia novos métodos, com uma nova divisão de trabalho organizada pelas guildas e uma progressiva mecanização, mas levando a uma despersonalização da atividade artesanal. A Itália nesta época era um mosaico de pequenos países e cidades independentes. O regime republicano com base no racionalismo fora adotado por vários daqueles Estados, e a sociedade via crescer uma classe média emancipada intelectual e financeiramente que se tornaria um dos principais pilares do poder e um dos sustentáculos de um novo mercado de arte e cultura.
O início do século vive intensas lutas de classes, com prejuízo para os trabalhadores não vinculados às guildas, e como conseqüência instala-se grave crise econômica, que tem um ponto culminante na bancarrota das famílias Bardi e Peruzzi em torno de 1328-38, gerando uma fase de estagnação que não obstante levaria a pequena burguesia pela primeira vez ao poder. Esta situação é comentada depreciativamente pelos poetas célebres da época – Boccaccio e Villani – mas constitui a primeira experiência democrática em Florença, durando um intervalo de cerca de quarenta anos.
Tumultos políticos e militares, além de duas devastadoras epidemias de peste bubônica, provocam períodos de fome e desalento, com revoltas populares que tentam modificar o equilíbrio político e social, mas só conseguem assegurar a permanência dos burgueses à testa do governo. Os Médici, banqueiros plebeus, assumem a liderança da classe mas logo se revestem da dignidade da nobreza e um sistema oligárquico volta a dominar a cena política, muitas vezes se valendo da corrupção para atingir seus fins, mas também iniciando um costume de mecenato das artes que seria fundamental para a evolução do classicismo no século seguinte.
Na religião a mudança foi assinalada pela busca, amparada pela ciência, de explicações racionais para os fenômenos da natureza; por uma nova forma de ver as relações entre Deus e o homem, e pela idéia de que o mundo não deveria ser renegado, mas vivenciado plenamente, e que a salvação poderia ser conquistada também através do serviço público e do embelezamento das cidades e igrejas com obras de arte, além da prática de outras ações virtuosas. Deve-se frisar que mesmo com a crescente influência clássica, que era toda pagã na origem, o Cristianismo jamais foi posto em xeque e permaneceu como um pano de fundo ao longo de todo o período, criando-se a síntese original que conhecemos hoje.
Quattrocento
O chamado Quattrocento (século XV) vê o Renascimento atingir sua era dourada. O Humanismo amadurece e se espalha pela Europa através de Ficino, Rodolphus Agricola, Erasmo, Mirandola e Thomas More. Leonardo Bruni inaugura a historiografia moderna e a ciência e a filosofia progridem com Luca Pacioli, János Vitéz, Nicolas Chuquet, Regiomontanus, Nicolau de Cusa e Georg von Peuerbach.
Ao mesmo tempo, um novo interesse pela história antiga levou humanistas como Niccolò de’ Niccoli e Poggio Bracciolini a vasculharem as bibliotecas da Europa em busca de livros perdidos de autores como Platão, Cícero, Plínio, o Velho, e Vitrúvio.
A reconquista da Península Ibérica aos mouros também disponibilizou para os eruditos europeus um grande acervo de textos de Aristóteles, Euclides, Ptolomeu e Plotino, preservados em traduções árabes e desconhecidos na Europa, e de obras muçulmanas de Avicena, Geber e Averróis, contribuindo de modo marcante para um novo florescimento na filosofia, matemática, medicina e outras especialidades científicas. Para acrescentar, o aperfeiçoamento da imprensa por Johannes Gutenberg em meados do século facilitou e barateou imenso a divulgação do conhecimento.
Um novo vigor nessa busca foi injetado após o fim do Império Bizantino e sua tomada pelos turcos, quando muitos intelectuais gregos, como Jorge de Trebizonda, Johannes Argyropoulos, Theodorus Gaza e Barlaam de Seminara, emigraram para a península Itálica e outras partes trazendo consigo e divulgando muitos textos clássicos e ensinando a ciência e língua gregas e a arte da exegese. Grande proporção do que hoje se conhece de literatura e legislação greco-romanas nos foi preservado por Bizâncio.
Esse afluxo de novas informações e conhecimentos e o concomitante progresso em todas as áreas da sociedade levaram os intelectuais a perceberem que se achavam em meio a uma fase de renovação da cultura comparável às fases brilhantes das civilizações antigas, em oposição à Idade Média anterior, que passou a ser considerada uma era de obscuridade e ignorância.
A progressiva aristocratização dos principais burgueses dá à arte um caráter palaciano e profano, e esta é uma tendência geral, que nasce a partir de um período de grande prosperidade econômica de Florença que, apesar de ameaçada por Milão e Nápoles, reconquista sua primazia regional. A opulência da oligarquia, que adquire grande cultura e se entrega à “bela vida”, gera na classe média uma resistência retrógrada que busca no gótico idealista um ponto de apoio contra o que vê como indolência da classe dominante.
Estas duas tendências opostas dão o tom para a primeira metade deste século, até que a pequena burguesia enfim abandona o idealismo antigo e passa a entrar na corrente geral racionalista. É o século de Lorenzo de’ Medici, o grande mecenas, e o interesse pela arte se difunde para círculos cada vez maiores.
Alta Renascença
A Alta Renascença cronologicamente engloba os anos finais do Quattrocento e as primeiras décadas do Cinquecento, sendo delimitada aproximadamente pelas obras de maturidade de Leonardo da Vinci (a partir de c. 1480) e o Saque de Roma em 1527.
É a fase de culminação do Renascimento, que se dissipa mal é atingida, mas seu reconhecimento é importante porque aqui se cristalizam ideais que caracterizam todo o movimento renascentista: o Humanismo, a noção de autonomia da arte, a emancipação do artista de sua condição de artesão e equiparação ao cientista e ao erudito, a busca pela fidelidade à natureza, e o conceito de gênio, tão perfeitamente encarnado em Da Vinci, Rafael e Michelangelo, e se a passagem da Idade Média para a Idade Moderna não estava ainda completa, pelo menos estava assegurada sem retorno possível.
Eventos como a descoberta da América e a Reforma Protestante, e técnicas como a imprensa de tipos móveis, transformam a cultura e a visão de mundo dos europeus, ao mesmo tempo em que a atenção de toda a Europa se volta para a Itália e seus progressos e as grandes potências da França, Espanha e Alemanha desejam sua partilha, fazendo dela um campo de batalhas e pilhagens, e com isso espalhando sua arte e influência por uma vasta região do continente.
É na Alta Renascença que a arte atinge a perfeição e o equilíbrio classicistas perseguidos durante todo o processo anterior, especialmente no que diz respeito à pintura e à escultura.
Porém esse classicismo, embora maduro e rico, conseguindo plasmar obras de grande pujança, comparáveis à arte antiga, tem forte carga formalista, espelhando o código de ética artificial, cosmopolita e abstrato que se impõe entre os círculos ilustrados e que prescreve a moderação, autocontrole, dignidade e polidez em tudo, e que tem na pintura de Rafael e na música de Palestrina seus mais perfeitos representantes artísticos, e no livro O Cortesão de Baldassare Castiglione sua súmula teórica.
O idealismo que foi intensamente cultivado na antigüidade clássica encontra uma atualização e, segundo Hauser:
De acordo com os pressupostos desta arte, pareceria inconcebível, por exemplo, que os apóstolos fossem representados como camponeses vulgares e artesãos comuns, como o eram tão freqüentemente e com tanto sabor, no século XV. Para esta arte nova, os profetas, apóstolos, mártires e santos são personalidades ideais, livres, grandes, poderosas e dignificadas, graves e solenes, uma raça heróica, em plena florescência de beleza madura e enternecedora.
Na obra de Leonardo encontramos ainda tipos da vida comum, ao lado destas nobres figuras, mas gradualmente nada que não seja grande e sublime parece digno de representação artística” .
Apesar daquele código de ética, é uma sociedade agitada por mudanças políticas, sociais e religiosas importantes em que a liberdade anterior desaparece, e o autoritarismo e a dissimulação se ocultam por trás das normas de boa educação e da disciplina, como se patenteia em O Príncipe, de Maquiavel, um manual de governo que dizia que “não existem boas leis sem boas armas”, não distinguindo poder de autoridade e legitimando o uso da força para controle do cidadão, livro que é uma referência fundamental do pensamento político renascentista e uma inspiração decisiva para a construção do Estado moderno.
Assim, a grande diferença de mentalidade entre o Quattrocento e o Cinquecento é que enquanto naquele a forma é um fim, neste é um começo; enquanto naquele a natureza fornecia os padrões que a arte imitava, neste a sociedade precisará da arte para provar que existem tais padrões. Rafael resume os opostos em seu famoso afresco A Escola de Atenas, uma das mais importantes pinturas da Alta Renascença, realizada na primeira década do Cinquecento, que ressuscita o diálogo filosófico entre Platão e Aristóteles, ou seja, entre o idealismo e o pragmatismo.
O Cinquecento e o Maneirismo italiano
O Cinquecento (século XVI) é a derradeira fase da Renascença, quando o movimento se transforma, se expande para outras partes da Europa e Roma sobrepuja Florença como centro cultural a partir do pontificado de Júlio II.
Roma até então não havia produzido grandes artistas renascentistas, e o classicismo havia sido plantado através da presença temporária de artistas de outras partes. Mas a partir da fixação na cidade de mestres do porte de Rafael, Michelangelo e Bramante formou-se uma escola local, tornando-a o mais rico repositório da arte da Alta Renascença e da sua continuação cinquecentesca, onde o patrocínio papal deu uma feição característica a toda esta fase.
Na seqüência do saque de Roma de 1527 e da contestação da autoridade papal pelos Protestantes o equilíbrio político do continente se altera e sua estrutura sócio-cultural é abalada, com conseqüências negativas principalmente para a Itália, que além de tudo deixa de ser o centro comercial da Europa quando novas rotas de comércio são abertas pelas grandes navegações.
Todo o panorama muda de figura, declinando a influência católica, perdendo-se a unidade cultural e artística recém conquistada na Alta Renascença e surgindo sentimentos de pessimismo, insegurança e alheamento que caracterizam a atmosfera do Maneirismo. Aparecem escolas regionais nitidamente diferenciadas em Roma, Florença, Ferrara, Nápoles, Milão, Veneza, e o Renascimento se espalha por toda a Europa, dando frutos especialmente na França, Espanha e Alemanha, tingidos pelos históricos locais específicos.
A arte de longevos como Michelangelo e Ticiano registra em grande estilo a transição de uma era de certezas e clareza para outra de dúvidas e drama que vê aparecer a Contra-Reforma e se dirige para o Barroco do século XVII.
Apesar disso, as aquisições intelectuais e artísticas da Alta Renascença que ainda estavam frescas e resplandeciam diante dos olhos não poderiam ser esquecidas de pronto, mesmo que seu substrato filosófico já não pudesse permanecer válido diante dos novos fatos políticos, religiosos e sociais.
A nova arte que se faz, ainda que inspirada na fonte do classicismo, o traduz em formas inquietas, ansiosas, distorcidas, agitadas, ambivalentes, apegadas a preciosismos intelectualistas, características que bem refletem as tormentas do século.
O Maneirismo, que cobre os dois terços finais do século XVI e depois se confunde com o Barroco, é um estilo que tem gerado muito debate entre os historiadores da arte.
Ele se manifesta em uma área geográfica tão vasta e é tão polimorfo que seu relacionamento com sua origem basicamente italiana e sua descrição genérica se tornam um problema, e suas características são tão distintas do Quattrocento e da Alta Renascença que alguns o separam da corrente renascentista tradicional e o estabelecem como um estilo independente, pois parece-lhes que em muitos sentidos ele constitui uma decadência e uma negação dos princípios clássicos de proporção equilibrada, unidade formal, clareza, lógica e naturalismo, tão prezados pelas fases anteriores.
Por outro lado, depois de um longo tempo de descrédito geral do Maneirismo entre os pensadores, ele já é visto modernamente de forma positiva e conciliadora, como um aprofundamento e um enriquecimento dos pressupostos clássicos e legítima conclusão do ciclo doRenascimento; não tanto uma negação ou desvirtuamento daqueles princípios como se pensara antes, mas uma reflexão sobre sua aplicabilidade prática naquele momento histórico e uma adaptação – às vezes dolorosa mas em geral criativa e bem sucedida – às circunstâncias da época, sendo sua marca especial e sua verdadeira força expressiva, e tendo sua importância realçada por fazerem dele a primeira escola moderna de arte.
As artes no Renascimento
Pintura
Sucintamente, a contribuição maior da pintura do Renascimento foi sua nova maneira de representar a natureza, através de domínio tal sobre a técnica pictórica e a perspectiva matemática, que foi capaz de criar uma eficiente ilusão de espaço tridimensional em uma superfície plana. Tal conquista significou um afastamento radical em relação ao sistema medieval de representação, com suas proporções irreais, sua estaticidade e seu espaço sem profundidade. A linguagem visual formulada pelos pintores renascentistas foi tão bem sucedida que permanece válida até hoje.
O cânone de proporções greco-romano volta a determinar a construção da figura humana, também volta o cultivo do Belo tipicamente clássico, e a perspectiva baseada no ponto de vista central e único define a construção dos cenários, no que se pode ver um reflexo da popularização dos princípios filosóficos do racionalismo, antropocentrismo e do humanismo. A pintura renascentista é em essência linear; o desenho era considerado o alicerce de todas as artes visuais e seu domínio, um pré-requisito para todo artista. Na construção da pintura, a linha convencionalmente constituía o elemento demonstrativo e lógico, e a cor indicava os estados afetivos ou qualidades específicas. Outro diferencial em relação à arte da Idade Média é a introdução de maior dinamismo nas cenas e gestos, e a descoberta do sombreado, ou claro-escuro, como recurso plástico e mimético.
Giotto, atuando entre os séculos século XIII e XVI, foi o maior pintor da primeira Renascença italiana e o pioneiro dos naturalistas em pintura. Sua obra revolucionária, em contraste com a produção de mestres do gótico tardio como Cimabue e Duccio, causou forte impressão em seus contemporâneos e dominaria toda a pintura italiana do Trecento, por sua lógica, simplicidade, precisão e fidelidade à natureza. Ambrogio Lorenzetti e Taddeo Gaddi continuam a linha de Giotto sem inovar, embora em outros características progressistas se mesclem com elementos do gótico ainda forte, como se vê na obra de Simone Martini e Orcagna. O estilo naturalista e expressivo de Giotto, contudo, representa a vanguarda na visualidade desta fase, e se difunde para Siena, que por um tempo passa à frente de Florença nos avanços artísticos, e dali se estende para o norte e oeste da Itália.
No Renascimento as representações da figura humana adquirem solidez, majestade e poder, refletindo o sentimento de autoconfiança de uma sociedade que se torna muito rica e complexa, com vários níveis sociais, de variada educação e referenciais, que dela participavam ativamente, formando um painel multifacetado de tendências e influências. Nesse sentido, depois de Giotto o próximo marco evolutivo é Masaccio, em cujas obras o homem tem um aspecto nitidamente enobrecido. Dele se disse que foi “o primeiro que soube pintar homens que realmente tocavam seus pés na terra” . Com Leonardo da Vinci a técnica do óleo se refina e penetra no terreno do sugestivo, e a arte se casa com a ciência. Com Rafael se revela a doçura, a grandeza e a perfeita harmonia, e Michelangelo leva a figura humana a uma nova dimensão, a do sobre-humano.
Fra Angelico, Paolo Uccello, Benozzo Gozzoli e Lorenzo Monaco expressam os últimos ecos do gótico, enquanto que a solenidade do alto classicismo é aparente na obra austera de Masaccio, Piero della Francesca e Ghirlandaio, que servem a patronos puritanos. Para um outro público trabalham Botticelli, Pollaiuolo, Filippo Lippi, cuja obra tem caráter mais mundano a despeito da temática muitas vezes sagrada.
Junto com Florença, Veneza, que teve uma evolução atípica e tinha artistas como Jacopo Bellini, Giovanni Bellini, Vittore Carpaccio, Mauro Codussi e Antonello da Messina, representam a vanguarda artística européia no Quattrocento, enquanto que Siena oscilava entre o gótico e o classicismo, e as cortes do vale do Pó e mais ao norte e a oeste continuam a se inspirar em modelos franceses – cuja influência sobre a Toscana é apenas pontual, trazida por artistas como Gentile da Fabriano e Domenico Veneziano.
Contudo, o classicismo começa a extravasar as fronteiras florentinas, chegando a outras cidades através de artistas importantes: Perugia com Perugino; Urbino com Francesco Laurana; Roma com Pinturicchio, Masaccio, Melozzo da Forli, e Giuliano da Sangallo; Pádua e Mântua com Mantegna.
Na Alta Renascença o sistema classicista de representação visual chega a um apogeu com a obra de Rafael Sanzio, de larga influência, mas essa fase de grande equilíbrio formal não dura muito, logo é transformada profundamente no Maneirismo. Toda a noção de espaço é alterada, a perspectiva se fragmenta em múltiplos pontos de vista, e as proporções da figura humana são distorcias com finalidades expressivas ou meramente estéticas, formulando-se uma linguagem visual mais dinâmica, vibrátil, subjetiva, dramática e sofisticada. Pontormo, Veronese, Romano, Tintoretto, Bronzino, e Michelangelo em sua fase madura são exemplos típicos do Maneirismo plenamente manifesto. Giorgio Vasari, um pintor e arquiteto maneirista de mérito secundário, também deve ser lembrado por sua importância maior como biógrafo e historiador da arte, um dos primeiros a reconhecer todo o ciclo renascentista como uma fase de renovação cultural e o primeiro a usar o termo “Renascimento” na bibliografia, em sua enciclopédica Le Vite de’ più Eccellenti Pittori, Scultori e Architettori, uma das fontes primárias para o estudo da vida e obra de muitos artistas do período.
Escultura
Na escultura os sinais de uma revalorização de uma estética classicista são mais antigos, datando do século XIII. Nicola Pisano em torno de 1260 produziu um púlpito para o Batistério de Pisa que é considerado a manifestação precursora da Renascença em escultura. Na passagem do século XIII para o século XIV seu filho Giovanni Pisano levaria seu estilo mais longe e dominaria a cena em Florença no primeiro terço do século, e seria um dos introdutores de um gênero novo, o dos cruxifixi dolorosi, de grande dramaticidade e larga influência, até então incomum na Toscana. Seu talento versátil daria origem a outras obras de suma elegância e austeridade, de linhas limpas e puras, como o retrato de Enrico Scrovegni.
Suas Madonnas, relevos e o púlpito da Catedral de Pisa são, por outro lado, muito mais movimentados e graciosos, com elementos góticos mesclados a um novo senso de proporção e espaço que infere seu estudo dos clássicos. Contemporâneos como Tino di Camaino seguem aproximadamente a mesma linha de trabalho, num cruzamento de correntes que seria típico de todo o Trecento.
Em meados do século Andrea Pisano se torna um dos escultores mais importantes da Itália, autor dos relevos da porta sul do Batistério de Florença e sendo nomeado arquiteto da Catedral de Orvieto. Foi mestre de Orcagna, cujo tabernáculo em Orsanmichele é uma das obras-primas do período, e de Giovanni di Balducci, autor de um requintado e complexo monumento funerário na Capela Portinari de Milão.
Apesar dos avanços dos mestres citados acima, sua obra ainda reflete o embate entre as tendências antigas e modernas, e elementos góticos ainda são nitidamente visíveis em todos eles. Para o fim do Trecento surge em Florença a figura de Lorenzo Ghiberti, autor de relevos no Batistério de São João, onde os modelos clássicos são recuperados por completo. Logo em seguida Donatello conduz os avanços em várias frentes. Nas suas obras principais figuram as estátuas de profetas do Antigo Testamento.
Deles talvez o Habacuc seja a mais impressionante, uma imagem cujo porte lembra fortemente um romano com sua toga, quase extraído diretamente da retratística da Roma republicana. Ousou ao modelar a primeira figura de nu de grandes dimensões em volume completo desde a antiguidade, o David de 1430.
Também inovou na estatuária equestre, criando o monumento a Gattamelata, a mais importante obra em seu gênero desde o Marco Aurélio romano do Capitólio.
Por fim, sua descarnada Madalena penitente, em madeira, de 1453, é uma imagem de dor, austeridade e transfiguração que não teve paralelos em sua época, reintroduzindo um pungente senso de drama e realidade na estatuária que só se viu no Helenismo.
Na geração seguinte Verrocchio se destaca pela teatralidade e dinamismo das composições. Seu Cristo e São Tomé tem grande realismo e poesia. Compôs um Jovem com um golfinho para a fonte de Netuno em Florença que é o protótipo da figura serpentinata, que seria o modelo formal mais prestigiado pelo Maneirismo e Barroco.
Sua obra maior, o monumento equestre a Bartolommeo Colleoni é uma expresão de poder e força mais impressionante que o Gattamelata. Desiderio da Settignano e Antonio Rosselino também merecem lembrança. Florença continuou o centro da evolução até o aparecimento de Michelangelo, que trabalhou em Roma para os papas – e também em Florença para os Medici – e foi o maior nome da escultura desde a Alta Renascença até meados do Cinquecento. Sua obra passou do classicismo puro do David, do Baco, e chegou ao Maneirismo, expresso em obras veementes como os Escravos, o Moisés, e os nus da Capela Medici em Florença.
Artistas como Baccio Bandinelli, Agostino di Duccio e Tullio Lombardo também deixaram obras de grande maestria, como o Adão deste último. Encerram o ciclo renascentista Giambologna, Francesco da Sangallo, Jacopo Sansovino e Benvenuto Cellini, com um estilo de grande dinamismo e expressividade, tipificado no Rapto das Sabinas, de Giambologna. Artistas importantes em outros países da Europa já iniciam a trabalhar em linhas claramente italianas, como Adriaen de Vries no norte e Germain Pilon na França, espalhando o gosto italiano por uma grande área geográfica e dando origem a várias formulações sincréticas com escolas regionais.
Música
Em linhas gerais a música do Renascimento não oferece um panorama de quebras abruptas de continuidade, e todo o longo período pode ser considerado o terreno da lenta transformação do universo modal para o tonal, e da polifonia horizontal para a harmonia vertical. O Renascimento foi também um período de grande renovação no tratamento da voz e na orquestração, no instrumental e na consolidação dos gêneros e formas puramente instrumentais com as suítes de danças para bailes, havendo grande demanda por animação musical em todo festejo ou cerimônia, público ou privado.
Os precursores desta transformação não foram italianos, mas franceses como Guillaume de Machaut, autor da maior realização musical do Trecento em toda Europa, a Missa de Notre Dame, e Philippe de Vitry, muito elogiado por Petrarca. Da música italiana dessa fase inicial muito pouco chegou a nós, embora se saiba que a atividade era intensa e quase toda no terreno profano, sendo as principais fontes de partituras o Codex Rossi, o Codex Squarcialupi e o Codex Panciatichi. Entre seus representantes estão Matteo da Perugia, Donato da Cascia, Johannes Ciconia e sobretudo Francesco Landini, que integram a fase conhecida como Ars Nova.
Na técnica compositiva a polifonia melismática dos organa, derivada diretamente do canto gregoriano, é abandonada em favor de uma escrita mais enxuta, com vozes tratadas de maneira cada vez mais equilibrada. O movimento paralelo é usado com moderação, acidentes são raros mas as dissonâncias duras são comuns. Em meados do século a escrita a três vozes começa a apresentar tríades, dando uma impressão de tonalidade. Tenta-se pela primeira vez escrever música descritiva ou programática, o moteto nascido no século anterior continua popular mas os rígidos modos rítmicos cedem lugar à isorritmia e a formas mais livres e dinâmicas como a balada, a chanson e o madrigal. A notação evolui para adoção de notas de menor valor, e mais para o final do período passa a ser aceito o intervalo de terça como consonância, quando antes apenas a quinta, a oitava e o uníssono o eram.
Exemplos musicais:
Anônimo italiano: Ypocrite – Velut stelle – Et gaudebit (ajuda·info)
Anônimo, Codex Rossi: Cum altre ucele (ajuda·info)
Solage: Fumeux fume par fumee (ajuda·info)
A música do Quattrocento italiano ainda é dominada pela influência francesa, mas o centro de irradiação agora se desloca de Paris para Flandres, onde em meados do século se forma a célebre Escola franco-flamenga, que desenvolve um estilo internacional de polifonia de grande complexidade, e incorpora a contribuição de compositores italianos como Landini.
Dufay, Des Prez, Binchois, Busnois e Ockeghem são os nomes principais, junto com Dunstable, um inglês que seria o introdutor do falso-bordão com o uso consistente de intervalos de terças e sextas, e do uso do cantus firmus como elo unificador da Missa musicada. A tendência profana do Trecento musical dá lugar a um florescimento de música sacra, com a consolidação do ciclo da Missa como a forma sacra por excelência. A Itália não produz nenhum compositor de vulto mas atrai artistas do norte para suas cortes, como Hugo de Lantins, um dos precursores do uso extensivo da imitação entre as vozes.
Exemplos musicais:
Hugo de Lantins: Jo sum tuo servo (ajuda·info)
Guillaume Dufay: Se La Face Ay Pale (ajuda·info)
Johannes Ockeghem: Ma bouche rit (ajuda·info)
Somente no Cinquecento a música italiana começa a desenvolver características genuinamente próprias, e nesse processo um significativo papel foi desempenhado por Isabella d’Este, cuja pequena mas brilhante corte em Mântua atraiu poetas que escreviam em italiano poemas simples para serem musicados, e lá a récita de poesia, assim como em outros centros italianos, era geralmente acompanhada de música.
O gênero preferido era a frottola, que já mostrava uma estrutura harmônica tonal bem definida e contribuiria para renovar o madrigal, com sua típica fidelidade ao texto e aos afetos. Outros gêneros polifônicos como a missa e o moteto fazem a esta altura pleno uso da imitação entre as vozes e todas são tratadas de um modo semelhante. Compositores flamengos importantes trabalham na Itália, como Adriaen Willaert e Jacob Arcadelt, mas as figuras mais célebres do século são Giovanni da Palestrina, italiano, e Orlande de Lassus, flamengo, que estabelecem um padrão de para a música coral que seria seguido em todo o continente, com uma escrita melodiosa e rica, de grande equilíbrio formal e nobre expressividade, preservando a inteligibilidade do texto, aspecto que no período anterior muitas vezes era secundário e se perdia na intrincada complexidade do contraponto.
A impressão de sua música se equipara à grandeza idealista da Alta Renascença, florescendo em uma fase em que o Maneirismo já se manifestava com força em outras artes como a pintura e escultura.
No final do século aparecem três grandes figuras, Carlo Gesualdo, Giovanni Gabrieli e Claudio Monteverdi, que introduziriam avanços na harmonia e um senso de cor e timbre que enriqueceriam a música dando-lhe uma expressividade e dramatismo maneiristas e a preparariam para o Barroco. Monteverdi em especial é importante por ser o primeiro grande operista da história, e suas óperas L’Orfeo (1607) e L’Arianna (1608, perdida, só resta uma famosa ária, o Lamento) representam o nobre ocaso da música renascentista e os primeiros grandes marcos do barroco musical.
Exemplos musicais:
Giulio Caccini: Amor che attendi (ajuda·info)
Giovanni Croce: Cantate Domino (ajuda·info)
Jacob Arcadelt: Io dico che fra noi (ajuda·info)
Monteverdi: Lamento de L’Arianna (versão coral do autor, 1614) (ajuda·info)
Arquitetura
A permanência de muitos vestígios da Roma antiga em solo italiano jamais deixou de influir na plástica edificatória local, seja na utilização de elementos estruturais ou materiais usados pelos romanos, seja mantendo viva a memória das formas clássicas.
Mesmo assim, no Trecento o gótico continua a linha dominante e o classicismo só viria a emergir com força no século seguinte, em meio a um novo interesse pelas grandes realizações do passado. Esse interesse foi estimulado pela redescoberta de bibliografia clássica dada como perdida, como o De Architectura de Vitrúvio, encontrado na biblioteca do mosteiro de Monte Cassino em 1414 ou 1415.
Nele o autor exaltava o círculo como forma perfeita, e elaborava sobre proporções ideais da edificação e da figura humana, e sobre simetria e relações da arquitetura com o homem. Suas idéias seriam então desenvolvidas por outros arquitetos, como o primeiro grande expoente do classicismo arquitetônico, Filippo Brunelleschi, que tira sua inspiração também das ruínas que estudara em Roma. Foi o primeiro a usar modernamente as ordens arquitetônicas de maneira coerente, instaurando um novo sistema de proporções baseado na escala humana.
Também se deve a ele o uso precursor da perspectiva para representação ilusionística do espaço tridimensional em um plano bidimensional, uma técnica que seria aprofundada enormemente nos séculos vindouros e definiria todo o estilo da arte futura, inaugurando uma fertilíssima associação entre a arte e a ciência. Leon Battista Alberti é outro arquiteto de grande importância, considerado um perfeito exemplo do “homem universal” renascentista, versátil em várias especialidades.
Foi o autor do tratado De re aedificatoria, que se tornaria canônico.
Outros arquitetos, artistas e filósofos acrescentaram à discussão, como Luca Pacioli em seu De Divina Proportione, Leonardo com seus desenhos de igrejas centradas e Francesco di Giorgio com o Trattato di architettura, ingegneria e arte militare.
Dentre as características mais notáveis da arquitetura renascentista está a retomada do modelo centralizado de templo, desenhado sobre uma cruz grega e coroado por uma cúpula, espelhando a popularização de conceitos da cosmologia neoplatônica e com a inspiração concomitante de edifícios-relíquias como o Panteão de Roma.
O primeiro desse gênero a ser edificado na Renascença foi talvez San Sebastiano, em Mântua, obra de Alberti de 1460, mas deixado inconcluso. Este modelo tinha como base uma escala mais humana, abandonando o intenso verticalismo das igrejas góticas e tendo na cúpula o coroamento de uma composição que primava pela inteligibilidade. Especialmente no que toca à estrutura e técnicas construtivas da cúpula, grandes conquistas foram feitas no Renascimento. Das mais importantes são a cúpula octogonal da Catedral de Florença, de Brunelleschi, que não usou andaimes apoiados no solo ou concreto na construção, e a da Basílica de São Pedro, em Roma, de Michelangelo, já do século XVI.
No lado profano aristocratas como os Medici, os Strozzi, os Pazzi, asseguram seu status ordenando a construção de palácios de grande imponência e originalidade, como o Palácio Pitti (Brunelleschi), o Palazzo Medici Riccardi (Michelozzo), o Palazzo Rucellai (Alberti) e o Palazzo Strozzi (Maiano), todos transformando o mesmo modelo dos palácios medievais italianos, de corpo mais ou menos cúbico, pavimentos de alto pé-direito, estruturado em torno de um pátio interno, de fachada rústica e coroado por grande cornija, o que lhes confere um aspecto de solidez e invencibilidade. Formas mais puramente clássicas são exemplificadas na Vila Medici, de Giuliano da Sangallo. Variações interessantes deste modelo são encontradas em Veneza, dadas as características alagadas do terreno.
Não se percebe uma descontinuidade marcante entre o século XV e o XVI na arquitetura. Depois da figura principal de Donato Bramante na Alta Renascença, trazendo o centro do interesse arquitetônico de Florença para Roma, e sendo o autor de um dos edifícios sacros mais modelares de sua geração, o Tempietto, encontramos o próprio Michelangelo, tido como o inventor da ordem colossal e por algum tempo arquiteto das obras da Basílica de São Pedro, e mais os nomes de Della Porta, Jacopo Sansovino, Domenico Fontana, Baldassare Peruzzi e Vignola, que gradualmente flexibilizam a estrutura do frontispício clássico e o emprego das ordens antigas, e introduzem organizações mais dinâmicas dos espaços internos e das fachadas. De todos os derradeiros renascentistas Palladio foi o mais influente, e seus princípios foram adotados em muitos países, com altos e baixos, até o século XX, tendo grandes seguidores em Inigo Jones, Richard Boyle, Edward Lovett Pearce, Giacomo Quarenghi e Giacomo Leoni, e até alcançaram a América fazendo disípulos em George Berkeley, James Hoban, Peter Harrison e mesmo no presidente dos EUA Thomas Jefferson, também arquiteto amador talentoso, dando origem ao chamado Estilo Federal .
A italianização da Europa
Com o crescente movimento de artistas, humanistas e professores entre as cidades ao norte dos Alpes e a península Itálica, e com a grande circulação de textos impressos e obras de arte através de reproduções em gravura, o classicismo iniciou em meados do século XV uma etapa de difusão por todo o continente.
Mas foram Francisco I da França e Carlos V, Sacro Imperador Romano, que logo reconheceram o potencial da Renascença italiana para promover suas imagens régias através de formas clássicas, os agentes decisivos para a divulgação intensiva da arte italiana além dos Alpes. Mas isso aconteceu apenas por volta do início do século XVI, quando o ciclo renascentista já tinha pelo menos duzentos anos de amadurecimento na Itália, já chegara a uma culminação e já estava se transformando em outra coisa.
Destarte, cabe advertir que não houve nada como um Quattrocento ou uma Alta Renascença no restante da Europa, pois nela não houve um lento e orgânico processo de classicização como o italiano, foi em muito um resultado de eventos políticos pontuais, mas de repercussão continental.
Como resultado, como se se abrissem de repente as comportas de uma represa, o vasto derrame de cultura italiana para o norte e o oeste depois das invasões na Itália gerou em cada região ou país uma original mescla de raízes locais tardo-góticas com o classicismo renascentista italiano em sua última encarnação, a que se deu o nome de Maneirismo.
França
A influência renascentista via Flandres e a Borgonha já existia desde o século XV, como se nota na produção de Jean Fouquet, mas a Guerra dos Cem Anos e as epidemias de peste atrasaram seu florescimento, que ocorre somente a partir da invasão francesa da Itália por Carlos VIII em 1494. O período se estende até cerca de 1610, mas seu final é tumultuado com as guerras de religião entre católicos e huguenotes, que devastaram e enfraqueceram o país.
Durante sua vigência a França inicia o desenvolvimento do absolutismo e se expande pelo mar explorando a América. O centro focal se estabelece em Fontainebleau, sede da corte, e ali se forma a Escola de Fontainebleau, integrada por franceses e italianos como Rosso, Primaticcio, Dell’Abbate e Toussaint Dubreuil, sendo uma referência para outros como François Clouet, Jean Clouet, Jean Goujon, Germain Pilon e Pierre Lescot. Leonardo também esteve presente ali.
Na música houve um enorme florescimento através da Escola da Borgonha, que dominou a cena musical européia durante o século XV e daria origem à Escola franco-flamenga, que produziria mestres como Josquin des Prez, Clément Janequin e Claude Le Jeune.
A chanson francesa do século XVI teria um papel na formação da canzona italiana, e sua Musique mesurée estabeleceria um padrão de escrita vocal declamatória na tentativa de recriação da música do teatro grego, e favoreceria a evolução para a plena tonalidade. Também apareceu um gênero de música sacra distinto de seus modelos italianos, conhecido como chanson spirituelle. Na arquitetura foram deixados monumentos ímpares como o Castelo de Chambord e o Château d’Amboise.
Na literatura se destacam Rabelais, um precursor do gênero fantástico, Montaigne, popularizador do gênero ensaio onde é até hoje um dos maiores nomes, e o grupo integrante da Plêiade, com Pierre de Ronsard, Joachim du Bellay e Jean-Antoine de Baïf, que buscavam um atualização vernácula da literatura greco-romana, a emulação de formas específicas e a criação de neologismos baseados no latim e no grego.
Exemplo musical:
Josquin Des Prez: Magnus est tu, Domine – Tu, pauperum refugium
Países Baixos e Alemanha
Os flamengos estavam em contato com a Itália desde o século XV, mas somente no século XVI o contexto se transforma e se caracteriza como renascentista, tendo uma vida relativamente curta. Nesta fase a região enriquece, a Reforma Protestante se torna uma força decisiva, oposta à dominação católica de Carlos V, levando a conflitos sérios que dividiriam a área.
As cidades comerciais de Bruxelas, Ghent e Bruges estreitam os contatos com o norte da Itália e encomendam obras ou atraem artistas italianos, como os arquitetos Tommaso Vincidor e Alessandro Pasqualini, que passaram a maior parte de suas vida ali.
O amor pela gravura trouxe para a região inúmeras reproduções de obras italianas, Dürer deixou uma marca indelével quando passou por lá, Erasmo mantinha aceso o Humanismo e Rafael mandava executar tapeçarias em Bruxelas. Vesálio faz avanços importantes na Anatomia, Mercator na Cartografia e a nova imprensa encontra em Antuérpia e Leuven condições para a fundação de editoras de larga influência.
Na música os Países Baixos, junto com o noroeste da França, se tornam o centro principal para toda a Europa através da Escola franco-flamenga. A pintura desenvolve uma escola original, que popularizou a pintura a óleo e dava enorme atenção ao detalhe e à linha, mantendo-se muito fiel à temática sacra e incorporando sua tradição gótica às inovações maneiristas italianas.
Teve em Jan van Eyck, Rogier van der Weyden e Hieronymus Bosch seus precursores no século XV, e logo a região daria sua contribuição própria à arte européia consolidando o paisagismo através de Joachim Patinir e a pintura de gênero com Pieter Brueghel o velho e Pieter Aertsen. Outros nomes notáveis são Mabuse, Maarten van Heemskerck, Quentin Matsys, Lucas van Leyden, Frans Floris, Adriaen Isenbrandt e Joos van Cleve.
A Alemanha impulsionou seu Renascimento fundindo seu rico passado gótico com os elementos italianos e flamengos. Um de seus primeiros mestres foi Konrad Witz, seguindo-se Albrecht Altdorfer e Dürer, que esteve em Veneza duas vezes e foi lá profundamente influenciado, lamentando ter de voltar para o norte. Junto com o erudito Johann Reuchlin, Dürer foi uma das maiores influências para disseminação do Renascimento no centro da Europa e também nos Países Baixos, onde suas célebres gravuras foram altamente elogiadas por Erasmo, que o chamou de “o Apeles das linhas negras”.
A escola romana foi um elemento importante para a formação do estilo de Hans Burgkmair e Hans Holbein, ambos de Augsburgo, visitada por Ticiano.
Na música basta a menção a Orlande de Lassus, um integrante da Escola franco-flamenga radicado em Munique que se tornaria o compositor mais célebre da Europa em sua geração, a ponto de ser nobilitado pelo imperador Maximiliano II e tornado cavaleiro pelo papa Gregório XIII, algo extremamente raro para um músico.
Portugal e Espanha
Portugal, no século XVI tornado uma das maiores potências navais, auferiu lucros imensos com as navegações para o oriente, com sua colônia americana e o com tráfico de escravos, fazendo crescer a burguesia comercial e enriquecedo a nobreza, que podiam agora se entregar a grandes luxos e cultivar o espírito. O contato comercial com a França, Espanha, Países Baixos, Itália e Inglaterra é assíduo, e o intercâmbio cultural se intensificou.
O gótico local se mescla a estas influências estrangeiras e dá origem ao estilo manuelino, queproduziria monumentos altamente originais como o Mosteiro dos Jerônimos, a Igreja Matriz da Golegã, o Mosteiro de Santa Cruz e a Torre de Belém, e a jóia exótica da janela do Capítulo do Convento de Cristo, em Tomar. Se destacam personalidades como a do humanista Francisco de Holanda e dos artistas Grão Vasco, Diogo Boitaca, Nuno Gonçalves, Francisco de Arruda e, Luís Vaz de Camões, um dos mais célebres poetas de todos os tempos.
Na Espanha, as circunstâncias foram em vários pontos semelhantes. A reconquista do território espanhol aos árabes e o fantástico afluxo de riquezas das colônias americanas, com o intenso intercâmbio comercial e cultural associado, sustentaram uma fase de expansão e enriquecimento sem precedentes da arte local.
Artistas como Alonso Berruguete, Diego de Siloé, Tomás Luis de Vitoria, El Greco, Pedro Machuca, Juan Bautista de Toledo, Cristóbal de Morales, Garcilaso de la Vega, Juan de Herrera, Miguel de Cervantes e muitos mais deixaram obra notável em estilo clássico ou maneirista, mais dramático do que seus modelos italianos, já que o espírito da Contra-Reforma ali tinha ali um baluarte e em escritores sacros como Teresa de Ávila, Inácio de Loyola e João da Cruz grandes representantes. Particularmente na arquitetura a ornamentação luxuriante se torna típica do estilo que se conhece como plateresco, uma síntese única de influências góticas, mouriscas e renascentistas.
A Universidade de Salamanca, cujo ensino tinha moldes humanistas, mais a fixação de italianos como Pellegrino Tibaldi, Leone Leoni e Pompeo Leoni injetaram uma força adicional no processo
O último Renascimento chega a cruzar o oceano e se enraizar na América e no oriente, onde ainda hoje sobrevivem muitos mosteiros e igrejas fundados pelos colonizadores espanhóis em centros do México e do Peru, e pelos portugueses no Brasil, em Macau e Goa, alguns deles hoje Patrimônio da Humanidade.
Inglaterra
Na Inglaterra, o Renascimento coincide com a chamada Era Elisabetana, de grande expansão marítima e de relativa estabilidade interna depois da devastação da longa Guerra das Rosas, quando se tornou possível pensar em cultura e arte. Como na maior parte dos outros países da Europa, a herança gótica ainda viva mesclou-se com referências da Renascença tardia, mas suas características distintivas são o predomínio da literatura e da música sobre as outras artes, e sua vigência até cerca de 1620.
Poetas como John Donne e Milton pesquisam novas formas de compreender a fé cristã, e dramaturgos como Shakespeare e Marlowe se movem com desenvoltura entre temas centrais da vida humana – a traição, a transcendência, a honra, o amor, a morte – em tragédias célebres como Romeu e Julieta, Macbeth, Otelo (Shakespeare), e Doutor Fausto (Marlowe), bem como sobre seus aspectos mais prosaicos e ligeiros em fábulas encantadoras como Sonho de uma noite de verão (Shakespeare).
Filósofos como Francis Bacon descortinam novos limites para o pensamento abstrato e refletem sobre uma sociedade ideal, e na música a escola madrigalesca italiana é assimilada por Thomas Morley, Thomas Weelkes, Orlando Gibbons e muitos outros, adquire um sabor inconfundivelmente local e cria uma tradição que permanece viva até hoje, ao lado de grandes polifonistas sacros como John Taverner, William Byrd e Thomas Tallis, este deixando o famoso moteto Spem in alium, para quarenta vozes divididas em oito coros, uma composição sem paralelos em sua época pela maestria no manejo de enormes massas vocais.
Críticas
Boa parte do debate moderno em torno do Renascimento tem procurado determinar se ele representou de fato uma melhoria em relação à Idade Média. Seus primeiros comentadores, como Michelet e Burckhardt não hesitaram em se posicionar favoravelmente e em considerá-lo uma fase decisiva em direção à modernidade, comparando-o à remoção de um véu dos olhos da humanidade, permitindo-lhe ver claramente.
Por outro lado, hoje muitos historiadores ressaltam que muitos dos fatores sociais negativos comumente associados à Idade Média – pobreza, perseguições religiosas e políticas – parecem ter piorado nesta era que viu nascerem Maquiavel, as guerras de religião, a corrupção do papado e a intensificação da caça às bruxas no século XVI. Muitas pessoas que viveram na Renascença não a tinham como a “Idade Dourada” que os intelectuais do século XIX imaginaram, mas estavam cientes dos graves problemas sociais e morais, como Savonarola, que desencadeou um dramático revivalismo religioso no fim do século XV que causou a destruição de inúmeras obras de arte e enfim o levou à morte na fogueira, e Filipe II da Espanha, que censurou obras de arte florentinas. Mesmo assim, os intelectuais, artistas e patronos da época que estavam envolvidos na movimentação cultural realmente acreditavam que estavam testemunhando uma nova era que constituía uma ruptura nítida com a idade anterior.
Alguns historiadores marxistas preferem descrever o Renascimento em termos materialistas, sustentando que as mudanças em arte, literatura e filosofia eram apenas uma parte da tendência geral de distanciamento da sociedade feudalista em direção ao capitalismo, que resultou no aparecimento de uma classe burguesa que dispunha de tempo para se devotar às artes.
O recurso aos referenciais clássicos foi muitas vezes um pretexto para a legitimação dos propósitos da elite, e a inspiração na Roma republicana e principalmente na Roma imperial também deu margem à formação de um espírito de competitividade e mercenarismo que os arrivistas usaram para sua escalada social tantas vezes inescrupulosa. Johan Huizinga reconheceu a existência da Renascença mas questionou se ela representou uma mudança positiva.
Em seu livro The Waning of the Middle Ages ele argumentou que o Renascimento foi um período de declínio em relação à Idade Média, destruindo muitas coisas que eram importantes. Por exemplo, o latim havia conseguido evoluir e manter-se bastante vivo até lá, mas a obsessão pela pureza clássica interrompeu este processo natural e o fez reverter à sua forma clássica. Robert Lopez declarou que a fase foi de grande recessão econômica, enquanto que George Sarton e Lynn Thorndike especulam que talvez o progresso científico realizado tenha sido na verdade bem menos original do que se supõe.
Desta forma, muitos historiadores têm começado a pensar que o termo Renascimento tem sido por demais sobrecarregado com uma apreciação positiva, automaticamente desvalorizando a Idade Média, e preferem agora usar no lugar o termo “Primeira Modernidade”, de caráter mais neutro e que o estabelece como uma passagem da Idade Média para Idade Moderna.
Legado
Mesmo com opiniões divergentes sobre aspectos particulares, hoje é um consenso que o Renascimento foi o arauto da era moderna. Foi um período em que muitas crenças arraigadas e tomadas como verdadeiras foram postas em discussão e testadas através de métodos científicos de investigação, inaugurando uma fase em que o predomínio da religião e seus dogmas deixou de ser absoluto e abriu caminho para o desenvolvimento da ciência e da tecnologia como hoje as conhecemos.
Os filósofos renascentistas foram buscar na antigüidade precedentes para defender o regime republicano e a liberdade humana, atualizando idéias que tiveram um impacto na jurisprudência e teoria constitucional atuais, e o pensamento político da época pode ter sido uma inspiração importante para a formação de Estados modernos como a Inglaterra e o Estados Unidos.
No campo das artes visuais foram desenvolvidos recursos que possibilitaram um salto imenso em relação à Idade Média em termos de capacidade de representação do espaço, da natureza e do corpo humano, ressuscitando técnicas que haviam sido perdidas desde a antigüidade e criando outras inéditas a partir dali.
A linguagem arquitetônica dos palácios, igrejas e grandes monumentos que foi estabelecida a partir da herança clássica ainda hoje permenece válida e é empregada quando se deseja emprestar dignidade e importância à edificação moderna. Na literatura as línguas vernáculas se tornaram dignas de veicular cultura e conhecimento, e o estudo dos textos dos filósofos greco-romanos disseminou máximas ainda hoje presentes na voz popular e que incentivam valores elevados como o heroísmo, o espírito público e o altruísmo, que são peças fundamentais para a construção de uma sociedade mais justa e livre para todos.
A reverência pelo passado clássico e pelos seus melhores valores criou uma nova visão sobre a história e fundou a historiografia moderna, e proveu as bases para a formação de um sistema de ensino que na época se estendeu para além das elites e ainda hoje estrutura o currículo escolar de grande parte do ocidente e sustenta sua ordem social e seus sistemas de governo. Por fim, a fantástica produção artística renascentista que sobrevive em tantos países da Europa continua a atrair multidões de todas as partes do mundo e constitui parte significativa da própria definição de cultura ocidental.
Fonte: mail.senacsp.edu.br/www.escolavesper.com.br/www.carlosc.hpg.ig.com.br/www.servi.adm.br/www.geocities.com
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